Mox in the Sky with Diamonds

domingo, agosto 31, 2008



BRAZIL ("BRAZIL" / TERRY GILLIAM / 1985)
Terry Gilliam, um dos comediantes do genial Monty Python, dirigiu esse belo filme que combina Kafka e Orwell, desenhando uma sociedade estilo "Big Brother" ("1984") com ênfase totalmente burocrática. Absurdos atentados terroristas constratam com uma genial antecipação da explosão do consumo e especialmente da indústria da cirurgia plástica, fato plenamente constatável na contemporaneidade.




PRA FRENTE BRASIL (ROBERTO FARIAS / 1983)
Filme brasileiro que traz bem a realidade dos anos de chumbo: combinação da felicidade da Copa do Mundo e a repressão política. Um cidadão qualquer pega carona no carro de um guerrilheiro que, por acaso, estava sentado ao seu lado do avião. No trajeto, uma milícia finaciada pela elite para combate aos "subversivos" acaba assassinando o caroneiro e após tortura o personagem buscando a "verdade". Como não há "verdade" alguma, segue ele até sua morte. Belo filme para mostrar os porões da Ditadura Militar, a repressão financiada pela elite brasileira e a ineficiência absoluta da tortura.




OS PÁSSAROS ("THE BIRDS" / ALFRED HITCHCOCK / 1963)
Filme enigmático de Hitchcock que contraste com o fantástico "Psicose" por seguir uma linha completamente distinta: aqui, em meio ao romance entre Mitch e Lydia e os duelos psicológicos com a mãe daquele, pássaros começam, absurdamete, a atacar os humanos. Os planos são bastante antiquados hoje em dia, mas, segundo os críticos, eram vanguarda à época de Hitchcock. O filme se enquadra na linhagem do absurdo, sendo por isso extremamente interessante. Mais uma obra-prima de Hitchcock.




O QUARTO-PODER ("MAD CITY" / COSTA-GAVRAS / 1997)
Quais são os limites da atividade jornalística? O jornalista tem limites éticos ou pode cruzá-los a qualquer momento? O jornalista tem consciência que muitas vezes pode abrir a caixa de Pandora?
"O Quarto Poder" é, sobretudo, mais do que um filme crítico à mídia, um filme de ética jornalística, demonstrando que a objetivação e instrumentalização do Outro serve a fins espúrios que não se justificam jamais. Mais uma grande obra do mestre Costa-Gavras, seguramente um dos meus diretores favoritos, perdendo apenas para o genial Stanley Kubrick e estando no mesmo nível de outros como Lynch ou Lars von Trier.



A ESTRADA PERDIDA ("LOST HIGHWAY" / LYNCH / 1997)
Nesses tempos em que David Lynch vem a Porto Alegre para falar de porcarias new age é sempre bom ver seus grandes filmes, recheados de perfeição estética no delírio onírico, nas dúvidas imensas e nas tramas penetrantes.
No mais, a tentação de sempre: digitar no Google: "estrada perdida explicação".

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quinta-feira, agosto 28, 2008



É POSSÍVEL construir sem aderir ao clientelismo e à negociata? É POSSÍVEL fazer política sem corrupção e uso da máquina pública? É POSSÍVEL ser independente, coerente e honesto sem se fechar à negociação e ao diálogo?
Acredito que o SIM é a resposta a todas as perguntas. E faço porque só a ação política é capaz de vencer a desesperança. Não há outro caminho.
Amanhã (29/08) é dia de aderir a esse projeto. Disponho de convites pela módica contribuição de R$ 20,00. É a forma de colaborar para eleger esse candidato que confio plenamente.
Conto com tua presença.

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quarta-feira, agosto 27, 2008

PRAZER DO DESCONFORTO

MEU PRINCIPAL PRAZER na docência tem sido criar desconforto nos alunos. As categorias criminais são, sem dúvida, as mais rígidas no cenário contemporâneo. Criminoso é o "outro", bem distinto de mim, com sua personalidade distinta e sua etiologia.
O meu principal objetivo é, em primeiro lugar, desconstruir a idéia de "criminoso", uma vez que a maioria das pessoas comete vários crimes ao longo da vida; segundo, mostrar que a demonização do criminoso é uma espécie de projeção que o transforma em bode expiatório; terceiro, mostrar que o projeto moderno convive com dificuldade com a diferença, precisando etiquetar ou exterminar a ambivalência; quarto, mostrar como se forma nosso "lixo" social e jogá-lo na cara das pessoas, com seu odor desagradável e toda alteridade que comporta, mostrando nossa intimidade com os carrascos medíocres do nazismo.
Preciso jogar isso na cara das pessoas. Não hesito um instante em fazê-lo. Devo ser indigesto. Não importa. A realidade é isso aí mesmo. Para além de alienadas utopias liberais ou constitucionais, existe a violência inerente à civilização - essa que queremos ignorar. Minha tarefa, hoje em dia, reside exclusivamente em lançar essa violência na cara de todos.

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terça-feira, agosto 26, 2008

EU E AS COISAS

HEIDEGGER rompeu com a filosofia tradicional quando contestou o intelectualismo que colocava a relação de cognição como fundamento da existência. Nossa relação com o mundo, dizia o alemão, excede a cognição: estamos embarcados por completo no mundo, nos relacionamos com ele de forma muito mais intrínseca e envolvida do que pressupunham os intelectualistas pós-cartesianos, dividindo o sujeito do objeto. Heidegger fala então da "manualidaade" ("prestabilidade", "estar à mão", zuhanden), relação que é primeira em relação a de sujeito e objeto. A cadeira que sento não é prego, madeira e ferro, mas primeiramente uma cadeira, um instrumento no mundo que construo. Essa relação -- muito mais ampla que a de cognição -- é que estrutura as demais e da qual o pensar apenas faz parte (pensar o ser já é ser).
Toda essa introdução para dizer que me relaciono muito mal com as coisas. Meus instrumentos estão permanentemente em revolta contra mim. Carro, celular, computador, violão, chave, chaveiro, caneta, tapetes, plugues, enfim, toda essa parafernália que cada vez mais aumenta se degrada quando entra em contato comigo. Não sei o que se passa. Aliás, tenho algumas hipóteses, dentre as quais uma combinação embaraçosa entre preguiça, distração e tendência ao desastre. No entanto, fato é que parece haver alguma coisa especial contra mim.
A quantidade de vezes que eu deixo cair as coisas é inacreditável. Meus celulares, coitados, só podem ser resistentes, sob pena de não durarem mais que um mês. A quantidade de vezes que derrubo café, chimarrão, coca-cola e cerveja (bêbado, então, nem se fala) é absurda. As coisas parecem escapar das minhas mãos como se quisessem fugir do mau dono. Se desprendem de mim e estão nos lugares mais inapropriados sempre. Está colocando a tomada atrás da cama, que dá um trabalho arredar, pode ter certeza que quando se ajoelhar irá amassar alguma coisa, quem sabe quebrar.
Eu e as coisas não estamos muito bem. Nossa relação de "estar à mão" anda da pior forma. Sou mais meus vestígios que minhas intenções.

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segunda-feira, agosto 25, 2008

DISCOS PELA METADE

SE AINDA OUVÍSSEMOS VINIL, seria interessante fazer um levantamento dos melhores discos de um lado só no rock pós-2000. Me lembro pelo menos de alguns nos últimos anos: 2003 teve o Killers com "Hot Fuss", com uma esplêndida entrada de cinco poderosos singles ("Jenny was a friend of mine", "Mr. Brightside", "Smile like you mean it", "Somebody told me" e "All these thing that I've done") seguida de momentos menos memoráveis (embora não exatamente ruins, p. ex., "Believe me Natalie" ou "Everything's gonna be alright").
2004 foi o ano de "Silent Alarm", que inicia transbordando energia em riffs crus de guitarras e melodias dançantes do Bloc Party, mas termina na maior brochada da década, com modorrentos temas que parecem apenas um Interpol ruim. O Lado A, com canções poderosas como "Like eating glass", "Helicopter", "She's hearing voices" e "Banquet" é pra matar. O Lado B, ruim de doer, para esquecer.
Em 2005 quem chegou mais perto disso foram os Editors com a estréia "The Back Room". Chupando Echo and the Bunnyman mais explicitamente que o Interpol, tem bons singles ("Lights", "Munique"), mas o lado B despenca. "Open your arms" é exceção. Na real, esse disco é meio fraquinho, embora tenha sido o melhor britânico neo-pós-punk.
Em 2006 foram os Strokes: "First impressions of the Earth" tem um Lado A com 5 rocks que poderiam ser os 5 melhores da década: "Razorblade", "Heart in a cage", "On the other side", "Juicebox" e "You only live once". O Lado B, no entanto, não tem a mínima inspiração. É completamente passável.
Do ano passado, 2007, temos "Wincing the night away", o disco do The Shins: com pelo menos três canções pops das melhores da década, "Sleeping sessions", "Australia" e "Phanton Limb" eram primores. Desabava, no entanto, na sua segunda parte, cansando o ouvinte de tanta enrolação.
Qual será o disco mono-lado desse ano?

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domingo, agosto 24, 2008

UMA TEORIA A SER CONSTRUÍDA

OS ROMANOS chamavam de 'capitis diminutio' a capacidade diminuída para os atos da vida civil, podendo perder os "atributos" que lhe são garantidos. Algo ligeiramente difícil de nós, modernos, compreendermos, pois nossa cidadania não é (normativamente) cindida, sendo na realidade "unitária" em torno daquilo que os iluministas chamavam de "homem".
Não resta dúvida que a principal deficiência da democracia é, atualmente, a corrupção - entendida no sentido mais amplo possível - do setor público. Corrupção que não abrange apenas atos criminais propriamente ditos, mas também atos lícitos e até culturalmente legítimos, como o nepotismo e o lobismo. Digo que isso é "corrupção" porque afasta o sentido da república, ou seja, daquilo que não pertence a ninguém, é impessoal, é apenas zelado conjuntamente por todos.
O grande abismo que mergulhamos no entre-guerras com os totalitarismos tornou a democracia indiscutível. Autores como Habermas, Apel, Rorty, Laclau e Mouffe são estrelas da filosofia política com teorias que levam à radicalidade o ideal democrático. Rorty tem até um paper com título "Democracia antes da Filosofia". Indiscutivelmente, é tortuoso criticar a estrutura liberal-democrática que prezamos tanto e cujos remédios foram venenos poderosos. Direitos e garantias são invioláveis. A esfera pública foi contaminada pela idéia democrática: pensamos a partir do estrutura jurídico-política liberal a questão pública.
Agamben nos avisa que "profanar" consiste em retirar uma coisa do âmbito sagrado (a religião, segundo ele, é "separação") e restituir ao livre uso, sem apagar, contudo, o uso anterior. Será possível profanarmos a democracia contemporânea?
Clientelismo, roubalheira, negociata, nepotismo, afiliação, assistencialismo, ausência de transparência, caixa 2 e outras mazelas inundam os periódicos de notícias. Por todos os lados sentimos que precisamos de uma esfera pública mais digna, inclusive por razões políticas estritas: verbas desviadas deveriam alimentar barrigas pobres, assistencialismo normalmente acomoda a corrupção, ineficiência de trocas de cargos recai nos serviços públicos dirigidos aos mais carentes, ausência de transparência em contas eleitorais desequilibra o pleito e causa os problemas subseqüentes.
Creio que "profanar" a democracia significa, hoje, restituir sentido à idéia de "república" e exigir uma "capitis diminutio" ao inverso do candidato ao cargo eletivo. Pensar a questão do exercício do cargo público em termos de uma exigência "extra" em relação ao cidadão comum, que congrega transparência e honestidade. Se continuarmos pensando nossa esfera pública da mesma forma que pensamos a estrutura jurídico-liberal destinada a todo e qualquer cidadão, ela continuará invariavelmente poluída por interesses plutocráticos, coronelistas, burocráticos e financeiro-partidários. Qualquer exigência "extra" ao detentor do cargo público tem sido interpretada como vulneração de garantia. Qualquer restrição estabelecida especialmente em razão do cargo é tida como "capitis diminutio".
Antes de tudo, é preciso ver que - de acordo com o paradigma dominante - os reclamantes estão corretos. O detentor de cargo público que vê seus filhos impedidos de exercerem outro cargo por nomeação realmente vê recaída sobre eles restrição que, em princípio, parece trazer uma diminuição da respectiva capacidade civil. E tem toda razão. Sob o ângulo jurídico, parece estar correto.
O erro é interpretarmos que esse cidadão está em situação de equivalência com o cidadão "comum" que está fora da esfera pública. O cargo público traz consigo ônus e bônus. É preciso distinguir aquele que está na esfera pública para preservar a idéia republicana. Essas restrições - que podem ir de restrições políticas impostas como sanções aos representantes populares (recall, demissão de ministro, etc.) até restrições jurídicas (desde que estabelecidas em lei) que prevejam exigências do ocupante do cargo público. O fundamento jurídico é o princípio constitucional da moralidade e a idéia republicana.
Nada disso mudaria o enfrentamento jurídico-penal da questão. Um parlamentar processado criminalmente, por exemplo, faria jus aos mesmos direitos e garantias de qualquer outro. Mas a responsabilidade política, ou seja, aquela contingente que implica um acréscimo da capacidade deveria ser mais flexível. Venho desenvolvendo essa idéia, que aparentemente colide com o garantismo clássico (aparentemente, pois é diferente Lula despachar José Dirceu - caso que estou falando - de José Dirceu ser condenado criminalmente no STF - caso que permanece hígido o garantismo), há algum tempo (e mais aqui). No entanto, provavelmente jamais terei tempo de desenvolver. Há outras coisas na frente.

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quinta-feira, agosto 21, 2008

CULTURA

De um repórter do jogo, comentando a saída de Airton, meia do Flamengo:
- Os jogadores do Flamengo estão saindo extasiados de campo.
Não sabia que futebol tinha virado espécie de orgia coletiva. Achava que os jogadores saiam extenuados.


Moral da história: o Fla teve que dar a vida para ganhar do Grêmio. Ou seja: o tricolor vende caro as derrotas. Vão ter que correr muito para nos tirarem o caneco.

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terça-feira, agosto 19, 2008

REALIDADE NAUSEANTE

Nenhuma metáfora conseguiu se apropriar da noção de "realidade" mais expressivamente do que a "náusea", de Jean-Paul Sartre. No seu belíssimo romance (um dos meus livros favoritos), Roquentin subidamente sente a presença sufocante do mundo ao seu redor, extirpando qualquer resíduo de dúvida cartesiana em detrimento de uma tonalidade emocional que induz o "absurdo" do mundo: a náusea. Ao perceber que as árvores estavam ali para além da sua vontade, Roquentin sente de repente a realidade arrebentar quaisquer esquemas intelectuais que tentem a prender, vomitando sua presença independente do sensível olfato dos criaturas humanas.
Por vezes, essa realidade dói. Seu peso é terrível. Levinas problematizou ainda mais a questão ao colocar à frente disso a questão do Outro, traumático e enigmático, irrompendo e exigindo, na carne-e-osso do seu Rosto, a assunção da responsibilidade ética, que o lituano-judeu e Derrida não hesitam em caracterizar como "infinita".
É isso. É esse o peso da vida. É essa sua loucura, sua extravagância, seu excesso duro de lidar. A consciência desse excesso (que poderíamos chamar: consciência moral) é o que me torna mais sério e carrancudo do que gostaria; que me tira a leveza e a sutileza. Gostaria de ser mais tranqüilo, de levar as coisas menos a sério, mas não posso, na outra mão, compactuar com a hipocrisia e a violência. É esse desejo de justiça e de respeito à diferença que, desde muito jovem, me animava. Embora na forma bruta, essa intuição sempre esteve presente em mim e não era à-toa que me enojavam os personagens hipócritas, os moralistas, os inquisidores e os conservadores em geral.
No entanto, hoje me sinto um pouco chato, pesado demais, e luto para não me tornar ressentido ou cegamente revoltado. É preciso também hospedar a alteridade do medíocre para sobreviver, apesar da (demasiado) humana raiva que sinta dessas pessoas. Um pouco de riso faz bem.

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segunda-feira, agosto 18, 2008

FALAR O QUÊ? - CUSPIR!!!
Já me detive sobre o assunto com uma abordagem mais técnica, procurando explicar o funcionamento antropológico e as conseqüências ético-políticas da abordagem da Zero Hora sobre o tema. Escrevi um artigo sobre o tema publicado no jornal.
O tempo acabou. Agora só me resta cuspir. Não tenho mais paciência para tolerar isso. Só posso insultar: NAZISTAS! NAZISTAS! NAZISTAS! O momento da justiça parece passar entre os nossos dedos: parece que precisamos usar da violência (verbal) para acordar essa nojeira coletiva que vem sendo escrita sobre o tema. Não há mais tempo para agüentar, vou vomitar: NAZISTAS! NAZISTAS! NAZISTAS! Escória da humanidade! Perversos! Higienistas facínoras! Tenho nojo de vocês e de todo lixo que sai dessas páginas. Cansei de ser compreensivo; minha paciência esgotou. Vocês são a mesma nojeira que fabricou os campos de concentração! O mesmo lixo anódico e medíocre que exterminou judeus, ciganos, comunistas e deficientes. Vocês estão junto com eles, na mesma pilha de merda da história. NAZISTAS!

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ABRINDO A SEMANA

Música leve, para acalmar os ânimos (meio exaltados por aqui): a doce Allison Goldfrapp, na faixa de abertura do seu novo álbum. Vale a pena dedicar 4 minutos e 10 segundos para deixar fluir essa linda voz e o violão dedilhado.



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quinta-feira, agosto 14, 2008

HISTÓRIA NARRATIVA

Que a história não é um "ente" com vontade própria, que Hegel se equivocou e que toda filosofia da história pode parir totalitarismos é algo que parece cada vez mais evidente. A filosofia (pós-)moderna tem sempre buscado enfatizar contingência, acaso, decisão, responsabilidade contra uma transcendência "vertical" ou um determinismo qualquer.
Temos, portanto, uma história "narrada", sempre espécie de narrativa que se alimenta de mitos e perspectivas. Foucault provou ad nauseam que a origem é "cinza", partindo de "emergências" ou "acontecimentos" para traçar suas genealogias. A linearidade é uma fantasia mítica.
Chama atenção, agora, os destinos da nossa narração da história. Estamos realmente acreditando que o comunismo decaiu e o liberalismo tornou-se vencedor porque estamos repletos de democratas e defensores das liberdades individuais. Esquecemos que o grande cerne da derrota do comunismo -- derrota cantada desde o primeiro momento -- é o egoísmo humano, a tosquice e a cretinice, a natureza "canina" (desculpem os cães) do homem, a incapacidade de partilhar e sentir a dor do Outro. Esses, sim, medíocres, é que provocaram a derrota do sonho comunista, "orgulhosos" da sua propriedade privada, da sua exploração econômica, da desigualdade e da hierarquia social. Foram esses canalhas que patrocinaram golpes à exaustão, torturaram dissidentes comunistas e alimentaram nazismo e fascismo. Os poucos liberais genuínos -- os poucos generosos que liam Dewey, Rawls ou Keynes -- são pura exceção. Não foi por ser regime totalitário que o comunismo perdeu; foi por ser um regime solidário.
São esses mesmos vermes canalhas que hoje imprimem o ritmo da nossa sociedade: gestão burocrática (ainda que uma burocracia disfarçada de discurso "modernete" da Administração), primazia do quantitativo e da técnica, disciplina dos corpos, biopolítica eugênica, indiferença social, despolitização, narcisismo e selva econômica.
Todo mundo sabe que compartilho poucas crenças com a esquerda tradicional. Sou anti-marxista. Vejo semelhanças entre comunismo e nazismo. Prezo as liberdades individuais. Mas não posso deixar de lamentar que as pessoas não enxerguem mais a diferença entre esquerda e direita, não percebam que existem os cínicos que gozam com a desigualdade e a injustiça e os rebeldes (às vezes ingênuos, às vezes burros) que estão preocupados em escovar a história a "contra-pêlo", em dar voz aos vencidos. Não é possível que as pessoas não percebam mais a distância que separa os que se preocupam com o Outro e aqueles que estão totalmente indiferentes, inertes, divertindo-se com a situação e destilando prosa cínica.
Preocupo-me com a minha geração e muito mais com as seguintes, porque a queda do comunismo fez muitos dos meus contemporâneos ingressar no discurso cínico, na razão opaca, escondidos atrás de ironias e, no fundo, gozando. A queda das "metanarrativas" abriu espaço para o niilismo total, para a indiferença, para a "festa da Totalidade". Estamos confundido os liberais democratas, os preocupados com os Gulags e a repressão política com os hipócritas e cretinos que se lavam com a indiferença, perpetuam a injustiça e destróem sem escrúpulos.
O discurso marxista morreu. Alguns ainda não acreditam na lápide, mas ele está lá, enterrado. Mas o desejo de justiça, a consciência moral e a indignação com o insuportável permanecem. Ele é que nos separa dos hipócritas e corvos que perpetuam a servidão.
É a loucura por justiça que nos alimenta e não nos deixa morrer.

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terça-feira, agosto 12, 2008

A ARTE SE MOVE, QUEIRAM OU NÃO

A coisa mais engraçada nos fundamentalistas e conservadores da arte é que eles estão destinados à frustração permanente. Tornam-se cínicos, irônicos, autistas, idiossincráticos ou revoltados. Não importa. Encontram alguma estratégia de evasão.
Se está correta a hipótese de que a filosofia sempre teve pretensão de ser uma Totalidade que representa o mundo como um espelho, arquivando nas respectivas pastas os "objetos" percebidos e deduzidos por esquemas lógicos, o certo é que, como tantas vezes afirmou o Professor Ricardo Timm (cujas lições vou absorvendo aos poucos, mesmo sem ouvi-lo há algum tempo) em aula, a estética jamais foi aprisionada. Por isso, sempre foi tida como superficial e desnecessária. É impossível aprisioná-la.
Muitos movimentos sectários tentaram reduzir a arte a si mesmos, eliminando todo resto como anacronismo ou lixo. Nenhum foi capaz. Nenhum será. A arte nasce dessa polifonia irredutível, da pluralidade incontrolável, da capacidade tipicamente humana de jamais deixar de exercitar o atrevimento, não importa o grau do terror. Todo totalitarismo tem suas obras de contestação, seu Outro subversivo, seus "versos satânicos". É inevitável. Nem mesmo a crueldade humana conseguiu impedir a arte de ser atre-vida. Não serão os conservadores ou os dogmáticos que conseguirão. Felizmente, vivemos numa democracia e há espaço para todos.
Fico pensando nisso quando ouço os tantos conservadores do rock falar. Não são só os que lêem porventura esse blog. São muitos, muitos mesmo. Formam praticamente uma tribo. Uma tribo que acha que o rock vai até o final dos anos 70 e, a partir de então, nada se salva. Acham que Beatles, Stones, Led, Pink Floyd, Neil Young, Bob Dylan e The Who esgotam o assunto.
"Data vênia", meus amigos, não concordo. Gosto da maioria dessas bandas (das citadas, todas, embora Led um pouco menos). Mas tem muita coisa que vale a pena depois. É bom ouvir a tosqueira underground norte-americana dos anos 80 e 90 (Pixies, Nirvana, Pavement, Flaming Lips), é bom ouvir os que ousaram combinações várias com eletrônica (de Nine Inch Nails a Massive Attack, de Prodigy a Garbage, de Primal Scream a Portishead), é bom ouvir os que criaram gigantescas paredes de guitarras encontrando formas novas (My Bloody Valentine, Slowdive), enfim, é bom variar. E, quando a própria banda é genial o suficiente para se reinventar (Radiohead, U2), nós reconhecemos e gostamos. Não adianta querer nos prender na gaiola de ferro do dogma do "rock". A gente gosta de coisas novas. Gostamos de Beatles e Pink Floyd, mas também gostamos de Bright Eyes, Guillemots, Mercury Rev, Jesus and Mary Chain, Deerhunter e M83. Assim como gostamos de Da Vinci, Dali, Goya, Velasquez, Zurbarán, Picasso e Andy Warhol. E de Baudelaire, Byron, Rimbaud, Poe e Rilke. Ninguém nos aprisiona.

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segunda-feira, agosto 11, 2008

SORRY, LIAM

LIAM GALLAGHER declarou que não tinha nada contra o "Coldplay ou o Radiohead", mas apenas achava que seu público era formado por "pessoas feias" e que "pareciam não estar se divertindo nos shows". Disse que não gostava de bandas novas e continuava ouvindo Neil Young, Beatles, Stones, Kinks, Pistols e no máximo Stone Roses.
Liam, a gente continua ouvindo Beatles, Stones, Kinks, Neil Young, Pink Floyd. Mas a gente também quer coisas novas. Gostamos pra caralho dessas bandas, admitimos que ninguém supera Beatles e Stones, mas gostamos de conhecer mais e mais variações. Assim como o cinema não é só "Laranja Mecânica" ou "Cidadão Kane", a música (o rock) não é só Neil Young ou Bob Dylan. Gostamos de guitarras, boas melodias, refrões suculentos e letras rebeldes. Mas também queremos "Filhos da Esperança", "Crash", "Dogville" e "21 Gramas". Queremos Deehunter, Coldplay, Silversun Pickups e Grizzly Bear. Liam, se tu é conservador, deixa as bandas novas em paz, porque pelo teu raciocínio o Oasis não teria vez à sua época. Dá um tempo.
Te aconselho, enquanto isso, a ir a um show do Radiohead e um do Coldplay. A primeira constatação - absolutamente óbvia -- é que o Coldplay é totalmente mainstream e provavelmente nem no show do Oasis tem tantas gatinhas ("Yellow", hoje em dia, é mais pop que "Wonderwall", pois as gatinhas de 1997 começaram a ficar gordinhas -- faz dez anos, velho!). Depois, vai a show do Radiohead. Provavelmente tá cheio de gente feia, mas tu vai ver que eles se divertem pra caralho! Tipo, não conheço uma pessoa que não tenha sentido ORGASMO depois de ver o inesquecível show dos caras.
Vai lá e quem sabe já aprende novos truques. Que os caras são bons, eu garanto.

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domingo, agosto 10, 2008

ESPETACULAR DECISÃO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Finalmente uma decisão que vale a pena. Reproduzo um bom editorial da Folha sobre o tema hoje (domingo):

Editoriais

Um par de algemas
Proteção aos direitos individuais dos acusados envolve problemas mais amplos que o risco de execração pública

FOI UNÂNIME a decisão do Supremo Tribunal Federal limitando a circunstâncias de
"evidente perigo de fuga ou agressão" o emprego de algemas pelas autoridades.Diferentemente do que possa parecer à primeira vista, o julgamento
não foi desencadeado pelas espetaculares detenções dos investigados na Operação
Satiagraha. Foi um pedreiro de Laranjal Paulista, condenado por homicídio em 2005, o autor da ação.Seus advogados argumentavam que o fato de estar algemado diante do júri reforçava a impressão de sua culpabilidade. Determinando a realização de novo julgamento nesse caso, os ministros do STF reafirmaram a idéia de que todo réu é inocente até prova em contrário.A menos que se queira viver sob um regime de permanente arbítrio e delação totalitária, o princípio não tem como ser contestado -embora, nos últimos tempos, mostre-se importante relembrá-lo.Se o tema ganhou repercussão, isso se deve menos ao caso específico examinado no STF do que à série de críticas suscitadas pelo espalhafato policial na repressão aos crimes do colarinho branco. Nesse contexto, os ministros decidiram editar uma súmula, ainda a ser votada em plenário, para que a orientação quanto ao uso de algemas seja seguida nas instâncias judiciais inferiores.Tratada com louvável sensatez no plano jurídico, a questão das algemas assumiu, entretanto, um destaque desproporcional nas atenções da opinião pública se levarmos em conta uma realidade muito mais vasta, e que cabe
classificar de hedionda, no que diz respeito aos direitos dos acusados e dos presos no país.Nem sequer é preciso mencionar o cotidiano de intimidações policiais vivido pelos habitantes das periferias, onde a barbárie do crime organizado é a maior, mas não a única, violência contra os direitos do cidadão.No plano mais circunscrito da Justiça formal, é certamente incalculável o número dos réus que, sem assistência jurídica adequada, esperam presos um julgamento a que teriam direito de aguardar em liberdade.Ainda mais grave é o caso daqueles que, com penas já cumpridas, permanecem encarcerados pela ineficiência e pela complicação do sistema judicial.Para corrigir este abuso -bem mais cruel e revoltante do que o uso das algemas- noticia-se, já não sem tempo, a iniciativa de criar mutirões organizados pelo Conselho Nacional de Justiça, com funcionamento previsto a partir de setembro.Não se trata, evidentemente, de confundir a defesa dos direitos individuais com qualquer tipo de benevolência com o crime. A impunidade dos delinqüentes e o abuso das autoridades são faces da mesma moeda.Qualquer que seja a classe a que pertençam, a ineficiência do sistema ajuda os culpados e prejudica os inocentes. Lentidão e desigualdade manietam as ações da Justiça no país; um par de algemas invisível, na verdade, do qual não há súmulas capazes de libertá-la a curto prazo.

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sexta-feira, agosto 08, 2008

OBAMA MESSIÂNICO?

A maioria dos entusiastas de Barack Obama tem repetido que o candidato à Presidência dos EUA não é um messias. Faz-se questão de retirar qualquer véu de especialidade, temendo uma reação desfavorável do eleitorado conservador.
As reticências aos messiânicos são plenamente compreensíveis. Depois que encaramos os totalitarismos do entre-guerras, a ordem liberal tornou-se espécie de dogma inatacável, sempre preferível às experiências revolucionárias da direita e da esquerda. O efeito no Direito, por exemplo, é uma super-inflação narcísica do discurso constitucionalista a ponto de querer reduzir a política ao cumprimento da metas constitucionais, como se o texto fosse "dirigente" e capaz de induzir o futuro. Na política, o candidato viável deve se adequar ao status quo e, no máximo, pregar um reformismo moderado. É o tédio, então, que tem sido propriamente a emoção democrática por excelência.
É evidente que isso não é ruim. No entanto, não podemos desprezar de todo a figura messiânica, essa que tanto interessou a Walter Benjamin e hoje é destaque na obra do seu seguidor Giorgio Agamben.
Obama tem se destacado exatamente pelo seu caráter "messiânico", e não pelo seu caráter reformista. Reformistas com propostas de reconciliação entre negros e brancos, trabalhadores e empresários, homens e mulheres, meio ambiente e produção, podem surgir a qualquer momento. Basta ler Richard Rorty para ver que ali está todo embrião da revitalização do "sonho americano" (do american dream, e não do american way of life) utilizado por Obama nessas eleições. O que empolga Obama é que ele desafia o modo atual de fazer política, ousando o tempo inteiro contestar aquilo que acredita equivocado sem dar um passo atrás. Seu lema, a "audácia da esperança", é o próprio rompimento com o tempo cronológico e ressurgimento do tempo da qualidade, do "agora", do instante que rompe com a história.
De tudo que Obama fala, o que mais fica e empolga as pessoas é o messianismo desse rompimento, do "Yes, we can", ou seja, podemos sim agarrar o momento e mudar, a história não nos governa, podemos romper com o que está aí, com o conservadorismo, com a hipocrisia, com o conformismo (para o qual colaboram blogs políticos cínicos). Seus discursos não são diplomáticos; são messiânicos. Obama substitui o tédio democrático por uma espécie de esperança de rompimento.
A esperança que Obama desperta não é a mesma que Lula despertou, anos atrás, embora seu lema fosse "esperança vence o medo". Lula já vinha de um recuo estratégico, aliando a setores conservadores e aderindo a um plano econômico relativamente conservador. O que elegeu Lula foi exatamente o seu pragmatismo. Com Obama, as coisas são inversas. O que tem causado furor e adoração é exatamente sua ousadia, sua coragem, sua capacidade de falar fora do vocabulário político tradicional.
Se isso o elegerá, não sei. Há outros blogs - vários linkados aqui - que podem analisar muito melhor. Mas, pelo que tenho acompanhado e visto em vídeos de Obama, é sua "audácia" que tem despertado sucessivas paixões e rompido com o quadro entendiante tradicional.
Vejam a ênfase no TEMPO do discurso a seguir:


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quinta-feira, agosto 07, 2008

LIXO MUSICAL

Se eu nunca concordo com o Torre de Marfim em termos de política e assuntos conexos, pelo menos essa coluna eu posso dizer que assino embaixo.

Grandes parcerias
Na Livraria da Vila, eu descubro que Simone e Zélia Duncan lançaram um disco juntas, chamado Amigo é casa. O troço é a gravação de um show ocorrido no Parque do Ibirapuera. Horrorizado, me dou conta de que há pessoas que vão assistir Simone e Zélia Duncan cantarem ao vivo e outras que compram o CD das duas. Imagino o sujeito em casa ou no carro, ouvindo o CD e pensando:

- Mas essa Simone canta bem mesmo, não? Eu gosto dela desde o tempo de Eu tô que tô.

- Não é que essa música ficou ótima na voz da Zélia Duncan?

- Ficou muito boa essa dupla. Acho que, para melhorar, só se elas convidarem a Ana Carolina para o próximo show.

Inspirado pelo disco de Simone e Zélia Duncan e pelo princípio estético de que o povo gosta de pão com merda, de preferência com pouco pão, idealizei um projeto musical que certamente fará sucesso no Brasil: promover shows e lançar uma coleção de discos com as piores duplas possíveis da história da música brasileira. Imagine o público que haveria para um encontro entre Oswaldo Montenegro e Guilherme Arantes? Terra Planeta Água e Condor já despontam como prováveis “músicas de trabalho” para tocar no rádio. Fagner e Elba Ramalho, se é que já não gravaram juntos, também seriam uma dupla de respeito, ao combinar a gralha do Nordeste com o sujeito da voz que parece o grito do porco no momento da castração. O problema é que talvez essa idéia já tenha sido adotada no Brasil. No sábado, no Multishow, eu vi um clipe em que NX Zero e Pitty cantam juntos. Aliás, o potencial do projeto Piores Parcerias talvez seja ainda maior no rock nacional do que na MPB. Embora seja difícil rivalizar com NX Zero e Pitty, acho que CPM 22 e Detonautas poderiam dar conta do recado, assim como Charlie Brown Jr. e Natiruts. Eu não sou saudosista e não levo rock nacional a sério, mas, perto dessas bandas de hoje, os grupos da época da minha adolescência pareciam formados por músicos sofisticados e poetas refinados. Como disse um amigo meu quando compáravamos a nova geração de debilóides com a geração dos anos 80, Renato Russo não era nenhum Rimbaud, mas pelo menos sabia quem foi Rimbaud

Só ressalto que Zélia Duncan e Ana Carolina (digo, Simone) não são artistas "populares", mas muito mais ouvidos na classe média e elite.

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ROTAR É PRECISO

Para o desespero dos puristas do "futebol da libertação", que acham o futebol sul-americano superior ao europeu apesar de 75% (para mais) dos seus jogadores de nível médio para cima estarem jogando do outro lado do Oceano Atlântico, aos poucos o campeonato de pontos corridos vai adaptando as equipes brasileiras a alguns padrões europeus.
Um deles, que deve surgir logo, é o hábito de rotar. É claro que ter onze titulares é excelente para qualquer equipe, pois demonstra consistência e entrosamento. No entanto, com a longa tabela de jogos, o desgaste físico dos jogadores é inevitável e, para evitar lesões, o melhor é rotar. Nesse caso, trocar até três jogadores por partida pode ter pelo menos quatro efeitos positivos: a) evita contusões; b) permite a recuperação física do jogador; c) dá moral aos reservas; e d) permite testar variações de jogo. Em 2006, por exemplo, a presença de Rafinha, Ramon e Herrera no banco dava boas opções ao técnico Mano Menezes, que usava seus recursos quando o jogo apertava.
Roth já admitiu que irá rotar. Ótimo. Está muito certo. Como o próprio treinador vem advertindo, o Grêmio vem jogando "no limite", ou seja, com os jogadores marcando o campo inteiro e batalhando cada bola (como, aliás, se deve jogar). Isso causa desgaste físico. A fraca atuação de Tcheco ontem não deve ter outra explicação. Utilizar bons reservas como Reinaldo, Souza, Orteman, Felipe, Makelele e Soares é bastante positivo. O importante é manter a espinha dorsal do time e calmamente ir dando o descanso necessário. O campeonato é longo e, se temos recursos, devemos usá-los.

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quarta-feira, agosto 06, 2008

SOBRE ESCREVER

Escrever, para mim, não é exibir nem convencer: é descarregar, como cuspir algo engasgado sob pena de asfixia.

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terça-feira, agosto 05, 2008

ANTI-SEMITISMO DE ESQUERDA

Pedro Dória escreve sobre o "novo" anti-semitismo, desta vez de esquerda e ligado à questão de Israel. Realmente, tenho notado que a horrenda política externa israelense tem gerado as mesmas reações que gera a igualmente horrenda política externa norte-americana: racismo. A quantidade de esquerdistas anti-americanos é caricata e patética: eles projetam os norte-americanos como bodes expiatórios da maldade humana, como se apenas os EUA fossem capazes de ser imperialistas e estúpidos. Essa corrente, que tem seus intelectuais de luxo com Noam Chomski no trono supremo, agora se projeta para Israel. O auge do ridículo chegou com o filme Fahrenheit 9/11, do também ídolo Michael Moore, quando o Iraque é retratado como um belo parque de diversões antes da chegada das tropas de George W. Bush.
O anti-americanismo é patético por ser auto-contraditório e xenófobo: a mesma generalização que ele censura (Bush considera todos os muçulmanos potenciais Bin Ladens) é repetida (todos os norte-americanos são imperialistas e estúpidos). É tão racista e xenófobo quanto o que ele critica. Os EUA fizeram a Guerra do Vietnã, do Iraque, são matriz de corporações corruptas e de um complexo industrial-militar -- é verdade. Mas também são o berço de fortes lutas pelos direitos civis, dos movimentos feministas, negros e homossexuais, souberam zelar pela sua democracia e cultivam a tradição liberal com maior tolerância que muitos outros países. De outro lado, quem enxerga nos norte-americanos egoísmo instititucionalizado deveria virar a esquina e olhar para o Brasil: nossa tradição congrega um capitalismo selvagem sem o igualitarismo liberal, combinando a cartorialismo e hierarquização com competição e cinismo. Basta ver a posição dos brasileiros em relação aos recentes perdões de dívida concedidos por Lula à Bolívia e alguns países africanos para se sentir bastante próximo aos habitantes da terra do Tio Sam.
Agora esses mesmos esquerdistas cegos e xenófobos atacam indiscriminadamente Israel, ressuscitando o fantasma do anti-semitismo que deveria assombrar a todos nós. Alega-se que os judeus criaram uma "indústria do holocausto". Ora, pensadores insuspeitos como Theodor Adorno e Jacques Derrida sempre enfatizaram que o holocausto foi a experiência decisiva da Modernidade. Toda nossa educação, todas nossas decisões políticas, nossa ética deve ser pautada por Auschwitz. Foi o momento em que o genocídio juntou-se a uma razão industrial e se produziram fábricas da morte. Isso é pouco?
A Shoah sempre deve ser pesada em todos os momentos que se fala da política de Israel, para compreender as decisões. É verdade que Israel vem mantendo uma política hedionda em relação aos palestinos. No entanto, o juízo que delimita um povo como "perverso" é tão perverso quanto essas decisões políticas, por ser racista e violento. Todo "anti" é violento; até o anti-violência.

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segunda-feira, agosto 04, 2008

PALAVRAS: PARA QUÊ?


Vamos fazer assim: tu pega a banda mais genial surgida nos últimos 38 anos (pelo menos) e põe quatro canções de um álbum acessível, mas absolutamente perfeito (mais ou menos como "Revolver" está para os Beatles). Daí tu ensina a patuléia o que é bom. E ainda deixa muita coisa para ser descoberta.



Radiohead, "High and Dry"


Radiohead, "Just"


Radiohead, "Black Star" (versão acústica).


Radiohead, "Street Spirit (Fade out)".

E, porque tu não é malvado, tu ainda põe uma bônus track desse mesmo lendário álbum.


Radiohead, "(nice dream)" (versão acústica).

Quer mais? Procura uma bolacha de nome "THE BENDS" (1995). Te GARANTO a ABSOLUTA impossibilidade de arrependimento.

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LÍDER - "INACREDITÁVEL" NOVAMENTE?

Nem o gremista mais otimista esperava que o Grêmio estivesse liderando o campeonato a essa altura do campeonato, se questionado antes de o torneio começar. O fato é que estamos, sim.
Ao que parece, Roth vai aprendendo com seus erros e evoluindo. Esse processo de evolução não começou no Grêmio, mas no Vasco, como já registrara há tempos. Chegou e conseguiu montar um espinha dorsal no time do Grêmio, mas resvalou feio quando o cinto apertou e a torcida começou a vaiar. Teve, contudo, bom poder de reação e parece não estar disposto a cometer os mesmos erros. Prova disso é que, apesar da chegada de Souza - que veio para ser titular e será, porque tem bola pra isso -- não desmanchou o esquema que fez engrenar e é capaz de fazer todos os atletas jogarem.
O princípio máximo do futebol moderno é esse: uma equipe bem estruturada é sempre uma equipe candidata a títulos. A bem estruturada significa: com defesa, meio campo e ataque. Parece óbvio? É, mas às vezes o óbvio é esquecido. O caso do Fluminense, por exemplo, é exemplar: tinha um excelente poderio ofensivo, mas, apesar de bons nomes, sua defesa era uma peneira. Para um torneio tiro-curto como a Libertadores, até pode funcionar, embora improvável. Para o Brasileiro, não. O mesmo ocorre com o Palmeiras. Boas equipes são equipes equilibradas, que atacam e defendem com muitos jogadores a partir de um meio campo congestionado, sem deixar a bola chegar à intermediária. Chelsea (recuando os pontas), Manchester (adiantando os zagueiros), Barça (idem) e Liverpool (adiantando os meias) foram equipes que venceram assim, encurtando o campo e esmagando o adversário. Os melhores Grêmios desse século, de 2001 e 2006, foram assim. E assim creio ser a melhor forma de jogar.
O Grêmio encurta o campo (como notou Wianey) adiantando Réver e Thiego e, logo em seguido, colocando na linha do meio campo Paulo Sérgio e Anderson Pico. Essa estratégia funciona muito bem fora de casa, surpreendendo o adversário. O risco é a bola nas costas da zaga, que tem sido amortecida com eficiência por Pereira (em ótima fase), mérito do sistema de três zagueiros. Com isso, Rafael Carioca e William Magrão podem avançar e não têm que carregar piano, jogando como volantes europeus (no meio de campo, e não na cabeça da área). O primeiro tem técnica admirável, controle de bola e visão de jogo. O segundo tem arranque, ultrapassagem e chute. O time caminha para uma compactação defensiva admirável, conseguindo, realmente, ter cinco jogadores no meio de campo, e não na defesa, como jogam os 3-5-2 improvisados no Brasil.
Na frente, Tcheco é verdadeiro maestro, preenchendo com consistência o meio-campo e armando. Marcel é o pivô, segurando a bola e sendo essencial na bola aérea. Se os juízes estão marcando menos faltas (para Aloísio eles marcavam todas, ano passado), Marcel tem que partir para o jogo mais agressivo. Recomendo que emprestem umas fitas de Drogba, Ronaldo e Adriano para ele ver como os brutos, como ele, se livram os defensores europeus, já que lá essas faltam também não são apitadas. Perea, por fim, deve crescer. É esforçado, mas muito inconstante e pode ser quem perca a posição no time para Souza, formando-se um 3-6-1 perigoso (o meio pode acabar distante do ataque, já que Marcel não tem velocidade). Tem ainda Reinaldo - de estrela fulgurante - cobiçando sua vaga, além do esquecido Soares (que, ao que parece, perdeu a vaga inclusive para André Luiz).
Agora é seguir humildemente a trajetória. Espero que Roth siga persistente e não invente, porque seguindo suas intuições básicas ele já transformou o Grêmio em equipe sólida ofensiva e defensivamente.
PS: Escalação no Gre-Nal sul-americano: Victor; Jean, Thiego e Everton; Felipe, Makelele, Orteman, Souza e Helder; Soares e Reinaldo.

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sexta-feira, agosto 01, 2008

O DILACERANTE LOW

O Low, dupla com larga estrada no mundo alternativo, lançou ano passado um álbum que não consegui caracterizar de outra forma senão como uma navalha, que vai te dilacerando até o último pedaço. Com arranjos minimalistas e cheio de efeitos microscópicos, letras poderosas e melancolia extrema no dueto vocal, até hoje não superei o poderio de "Drums and Guns".
Quando perguntados sobre se são pessoas tristes, os Low acharam a pergunta estranha. Em seguida, a entrevistadora disse que suas músicas são melancólicas. Eles responderam: "As músicas da Cher são animadas, mas ela não parece uma pessoa exatamente feliz".
Dragonfly, a canção que segue, é dessas de doer, mas fala muito sobre o sujeito da contemporaneidade, seu vazio existencial e a busca desesperada de prazer e sentido na química.
Abaixo a letra e, em seguida, o clipe. Assistam. É estranho (mas não é o mais pesado do disco - ouçam "Murderer"), triste pacas, mas vale a pena.
We took our pills
It changed the world
We had our fill
But when we realized
That we were dragonflies
We knew we had to try
To find a way to get more pills
Maybe you're right
Maybe you're right
Oh dragonfly
Your thousand eyes
What do they see?
The lights of history
Some things should never be
Why do we even try?
There's no such thing
As dragonfly pills
Maybe you're right
Maybe you're right
Oh dragonfly
Maybe you're right

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