Mox in the Sky with Diamonds

quinta-feira, julho 31, 2008

RORTY E DAVIDSON: DOIS ASCETAS FILOSÓFICOS

No último dia de RJ, minha namorada queria dar uma olhada em roupas e lojas. Normal. A mulher (e especialmente ela) é linda mesmo, e deve aproveitar a sua posição estética privilegiada na natureza, desde que, claro, a estética não se torne uma espécie de totalidade fechada que a torne incapaz de pensar ou refletir. Como, além de linda, minha namorada é inteligente, não tem problema. Só que - convenhamos - acompanhar a mulher para fazer compras é, seguramente, A COISA MAIS CHATA do mundo. Não tem cena mais patética que os dois ou três magrões parados, olhando para o nada, com a mão no queixo ou sentados, enquanto aguardam, com certo constrangimento, sua mulher experimentar 750 blusas e vestidos. O pior é que, geralmente, homens não entendem nada de roupas e, por isso, são péssimos conselheiros. Eu, por exemplo, acho feias 90% das novas modas, simplesmente porque para mim não existem modas. As roupas femininas que eu gosto são as mesmas que gostava em 2000. (Saia plisada vale? Hehehe).
Tá, nada a ver essa digressão com o post de filosofia hard que segue. Vamos lá.
Enquanto ela passeava, comprei uma revista e fui ler, sozinho, na beira da praia. A revista é a ótima "Mente e Cérebro", publicação séria e nada superficial, embora cara (R$ 12,90). Tratava dos pragmatistas, ou melhor, da "redescrição pragmática do sujeito".
Me empolguei com Richard Rorty nos idos de 2005, quando devorei os dois volumes dos seus philosophical papers, os livretos "Para realizar a América" e "Pragmatismo e Política", além de alguns outros textos esparsos (não terminei de ler seu clássico "A Filosofia e o Espelho da Natureza"). Rorty é um pensador de luxo. Por ele e pelo seu divulgador Paulo Ghiraldelli Jr, conheci também Donald Davidson, de quem só li passagens e vários papers sobre suas teorias.
Se, àquela época, o pragmatismo me fascinou ao ponto de delinear-se como referencial, a influência durou apenas até conhecer a fenomenologia e Levinas, que, a meu ver, superam Rorty e Davidson.
Com a leitura da revista, composta de excelentes artigos sobre James, Dewey, Rorty e Davidson, reafirmei essa impressão. E creio que o que hoje em dia me afasta de Rorty e Davidson é seu excessivo "ascetismo" filosófico, especialmente no primeiro. Se é verdade que Rorty é o anti-metafísico radical, o anti-platonista do excelência, é também verdade que, para mim, o excessivo ascetismo na sua linguagem e o medo de soar metafísico acaba impedindo Rorty de ir mais longe nas suas reflexões. Essa linguagem demasiado higienizada acaba não conseguindo penetrar nas profundezas do humano, por se precaver contra toda metafísica, refugiando no naturalismo darwinista de Quine. Com isso, sem querer, Rorty acaba se aproximando daquilo que ele mais combateu: o positivismo.
Davidson, por sua vez, para mim exibe o limite de toda filosofia da mente. Com sua concepção de linguagem como "adaptação", por exemplo, ele permanece dentro do naturalismo e não revela nada sobre essa linguagem. O mesmo ascetismo de Rorty.
A fenomenologia, tal como Levinas e Heidegger a usam, a meu ver permite transpor esse abismo. Priorizando o sentido e dessubstancializando os conceitos, é possível penetrar na complexidade do humano sem cair na metafísica. Levinas não hesita, por exemplo, em usar linguagem bíblica, mas isso não muda nada e não comporta nenhuma idéia de metafísica no sentido tradicional.
Por outro lado, o próprio Rorty, quando precisa situar um ponto arquimediano na sua filosofia para não cair no relativismo, utiliza o parâmetro do liberalismo e, mais adiante, da democracia para, ao final, reduzir tudo ao denominador comum da evitação do sofrimento. Ora, não é precisamente isso uma demanda ética?
Minha tese é que Rorty está mais próximo de Levinas do que imaginou, e acabou sendo injusto nas suas críticas ao filósofo lituano.

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BATENDO RECORDES

A vitória de Yeda Crusius para Governadora do Estado foi um episódio tragicômico. Embalada por um erro de cálculo dos anti-petistas, que queriam tirar Olívio Dutra do segundo turno e acabaram deixando de fora Germano Rigotto, Yeda acabou escolhida como espécie de fatalidade. Não era muito difícil perceber nos seus traços personalidade arrogante, autoritária e até histriônica. Apelidei o episódio de "morte da política" no RS, pois a bandeira do "anti" engoliu toda política a ponto de neutralizar o próprio candidato favorito dos "anti", Rigotto. Mesmo sendo um candidato sem sal, era mais palatável do que a pedregosa Yeda.
Achei que jamais um Governo superaria a inabilidade política do PT na era Olívio. Apesar de alguns pontos positivos, aquele Governo foi um absoluto desastre nas relações políticos, tendo se enterrado sob diagnósticos xiitas e adotado uma estratégia ineficaz de democracia direta que não conseguiu tocar para frente nenhum projeto, deixando apenas bravatas de herança. Prova disso é que o próprio PT reconheceu e colocou Tarso para concorrer, já que Olívio e sua turma fizeram o anti-petismo inflar ao extremo.
Surpresa! Yeda, apesar da base favorável, é um absoluto desastre político. Não consegue sequer esconder seu temperamento insuportável e vai demitindo, um a um, seus secretários. Não tem base política. Com dois anos de Governo, já passou por pelo menos duas crises e vive na "transição". Não responde ao questionamentos que lhe são impostos, fala cifradamente e visivelmente não consegue conservar o mínimo ambiente de trabalho. É como se aquele teu vizinho insuportável e autoritário assumisse como síndico do prédio e, em dois meses, tivesse brigado com todos os condôminos. Yeda é totalmente incapaz do diálogo.
O último foi o reverendo Mallmann, nosso ex-representante dos quakers. Demissão descarada e vergonhosa, pois devida a ausência de aviso da operação da Polícia Federal que sugou metade do seu governo. Mallmann, nesse caso, teve a conduta eticamente desejável. No seu lugar, coloca um general Goularte e confirma sua postura autoritária em segurança pública, que lembra cada vez mais o regime de 64. Uma lástima.

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quarta-feira, julho 30, 2008

REFORÇOS?

Não posso comentar nada de novo sobre o Grêmio porque não acompanhei os jogos dessa semana. Pelas conversas, confirma-se pelo menos uma expectativa desse blog: Helder é realmente um guri que ainda não está pronto, precisa de mais compleição física e agressividade, e por isso deve perder a posição para Anderson Pico. Bruno Telles, que este blogueiro considera o mais pronto dos três, foi cedido por empréstimo à Portuguesa.
Falo do Madrid. No imbróglio Cristiano Ronaldo, parece que o Madrid perdeu. O jogador sempre foi fora-do-mercado e somente um esforço hercúleo próprio dele seria capaz de tirá-lo do ManUnt. Ao que parece, desistiu. Com isso, o Madrid fica estagnado e, com esse time, não vence a próxima Championsleague.
Robinho fica, mas está no limiar de cruzar a fronteira de craque-promessa para bom jogador. Conseguirá se afirmar? Parece que o desafio e a ausência de um suporte psicológico (além da lesão que interrompeu sua boa trajetória) são os principais entraves. Ele mostrou, no Brasil, numa segunda etapa com o Santos (depois da sua revelação, sofreu queda e se recuperou), que era jogador de classe mundial. Mas ainda não confirmou as expectativas, embora o Madrid caia de rendimento sem sua presença.
Cogita-se a alternativa Van der Vaart. Só para constar: pesquisei "Van der Vaart" nesse blog e encontrei a primeira entrada, o recomendando para o Madrid, em 05.12.2005, com Luxa caindo do comando. Se Mijatovic lesse somepills economizaria recursos... Van der Vaart, no entanto, terá a mesma função que Sneijder, Guti, Robben, Drenthe e outros: completar o grupo. Não é o jogador que o Madrid precisa. Precisa, isso sim, de um craque estelar. Alguém que resolve 50% dos jogos, como Ronaldinho fazia com o Barça há dois anos, Kaká fez ano passado e Cristiano Ronaldo esse ano. Times multi-campeões se formam a partir de um grande craque, que é capaz de resolver quando o negócio aperta. No grupo, não há esse jogador.
No contexto mundial, apenas Cristiano Ronaldo, Kaká e Lionel Messi estão nesse patamar. Os dois primeiros foram alvos fracassados. O último é do arqui-rival, que não vende. Uma aposta valeria, mas em quem? Acho que o único jogador que valeria apostar, no momento, seria Cesc Fabregas. É a única jovem promessa já razoavelmente confirmada que eu vejo possibilidades de o Madrid contratar. Outras como Rooney, Ibrahimovic e os outros citados estão fora do alcance do dinheiro. A outra opção, que me lembrei depois, é o inglês Gerrard.
Outro reforço necessário para o Madrid é de um grande centroavante. Nistelrooy é ótimo, mas está velho e se lesiona demais. Quando sai, o time sente muito sua falta. Um outro centroavante de alto nível (Adriano, alguém ouviu?) se faria necessário. Drogba está, por decisão do Felipão, fora. Shevchenko seria uma aposta interessante, pois deve estar desvalorizado.
O fato é que, para a próxima temporada, o Madrid desponta como favorito para a Liga. O Barcelona está em decadência e desestruturado; Villareal, Sevilha, Valencia e Atlético de Madrid não são rivais à altura. Tudo indica que o bom time do Madrid se encaixará mais, especialmente a defesa, que tem bons nomes e precisa de entrosamento. No entanto, para a Champions o furo é mais embaixo. No filão de frente, o Madrid terá que enfrentar o poderoso ManUnt, que manteve o sonhado Ronaldo, o Chelsea, que agora tem técnico copeiro, o Milan, que pode ter um trio sensacional de Kaká, Ronaldinho e Pato e, ainda, equipes que correm por fora como a Inter de Mourinho e o Liverpool, sempre candidato. Com essa equipe, o Madrid não os vence.

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segunda-feira, julho 28, 2008

LIVROS DAS FÉRIAS

As férias são um período em que dá para se reciclar nas leituras. Me dediquei a algumas nesse período. Destaco alguns:

CACO BARCELLOS, "ROTA 66"
Confesso que o fato de Caco ser repórter da Globo me gerava injusto preconceito. "Rota 66" é um intenso e seríssimo trabalho de pesquisa e investigação em torno da Polícia Militar de São Paulo, detalhando seus métodos de extermínio, as técnicas de encobrir os delitos e o amplo aplauso social à violência policial. Esse ignorância se perpetua até os dias de hoje, com boçais aplaudindo "Tropa de Elite" nas salas de cinema (e até de aula, acreditem) sem descobrir que um Estado com o mínimo de decência não pode tolerar violência policial em qualquer nível, quiçá no de verdadeira exterminadora de pobres e negros.
O relato é às vezes um pouco parcial e explora pouco as causas dessa violência, mas funciona muito bem como denúncia e investigação da situação da polícia. Ontem mesmo, lendo meu último "O Globo" comprado antes de vir embora, ali dizia que a polícia carioca prende sete vez menos em comparação com o aumento de "autos de resistência" (freqüentemente um eufemismo ofensivo), além de se utilizar do método de encobrir homicídios levando o "ferido" (na realidade, cadáver) ao hospital para destruir a cena do crime.
Infelizmente, o "cidadão de bem" (o conservador da classe média) aplaude o extermínio como, aliás, já fizera décadas atrás, no outro lado do Oceano. A mesma mediocridade de sempre, mas é mais fácil achar que os alemães é que eram um povo malvado.

MARQUÊS DE SADE, "FILOSOFIA NA ALCOVA" E "CRIMES DO AMOR" / OCTÁVIO PAZ, "UM MAIS ALÉM DO ERÓTICO: SADE"
Todos textos que, instigado pelo excepcional "Anti-manual de Criminologia" do Salo de Carvalho, me pus a ler. Tirei conclusões um pouco diferentes, no entanto.
Se a violência para Nietzsche e Freud é inerente ao humano, se temos nosso lado "dionisíaco", nosso "Id" ou nossa "sombra", é porque essa ambivalência nos constitui enquanto tais, como espécie de reverso do nosso lado consciente ou "apolíneo". Em Sade, as coisas me parecem diferentes. Especialmente na "Filosofia na Alcova", a violência é estruturada em demandas racionais, tornando-se inumana porque "fria", calculada e programada. O homem sadiano é, assim, não um libertino que explode de prazer e não contém seu narcisismo, mas alguém que goza sem gozar, parece querer anular-se e retornar a um estado "mineral", "bruto", escapando da doença civilizatória. Paradoxalmente, é por argumentos -- todos frágeis -- que Sade concebe a derrocada civilizatória.
É fundamental, nesse sentido, entender que o homem do Sade é díptico, e não se constitui senão pela vítima -- pela anulação do Outro -- que é destroçado e transformado em objeto de prazer e mutilação. Sozinho, esse homem nada significa. É pelo registro da alteridade destroçada que ele se constitui.
Sade, portanto, é um antecipador dos campos de concentração, como os frankfurtianos perceberam bem. A razão junta-se com a crueldade e torna a violência inumana, formando aquilo que transborda do lado "sombra" do homem e representa o mal: o terror.
O livro de Octávio Paz é genial em perceber a duplicidade do discurso sadiano, sua racionalidade, a frieza do libertino e uma espécie de retorno ao bruto, em forma de uma "Natureza" que desempenha um papel de teologia do mal. Por fim, "Crimes do Amor", contos que nada têm em comum com o Sade usual, é literatura menor, influenciada por "Vathek", de Beckford, e a literatura oriental em geral, resvalando em um romantismo às vezes cômico.

DALTON TREVISAN, "A GORDA DO TIKI BAR" E "O GRANDE DEFLORADOR"
Sou devedor da literatura brasileira da segunda metade do século XX, pouco conhecendo de autores importantes como Caio Fernando Abreu, Dalton Trevisan, Ruben Fonseca e até mesmo (essa conheço um pouco mais...) Clarice Lispector.
Por isso, comprei esses dois livrinhos de contos deliciosos -- embora trágicos -- de Dalton. Sua linguagem dura impõe nada mais que o real, como um tapa na cara por vezes tão forte que nos cega. Porque às vezes é simplesmente isso mesmo: a realidade é tão brutal que não se deixa representar; só a arte, nua e crua, é capaz de nos mostrar algo.

J.M. COETZEE, "À ESPERA DOS BÁRBAROS"
Livro FANTÁSTICO do escritor sul-africano J. M. Coetzee, que trabalha com uma ficção que muito diz de como compreendemos o "Outro" a partir da metáfora do império e os bárbaros. Livro de uma inquietação ética manifesta, capaz de confrontar a Totalidade com a Justiça, com aquilo que rompe a lógica e nega-se a reduzir ao "Império": o Outro.
Simplesmente imperdível.

CONTARDO CALLIGARIS, "A QUINTA COLUNA"
Volume que compila 101 crônicas de Contardo na Folha de São Paulo, apenas confirma o seu status de um dos mais importantes intelectuais do Brasil. Com seu texto leve, mas absolutamente profundo, sua inquietação pela diferença e comprometimento com o acolhimento, Contardo mostra-se um militante da compreensão e do diálogo, quebrando a casca narcísica que cobre o sujeito contemporâneo.
Apesar de ter lido grande parte das crônicas no jornal na época, a releitura foi deliciosa, esbanjando erudição, perspicácia, simplicidade e clareza.

JURANDIR FREIRE COSTA, "VIOLÊNCIA E PSICANÁLISE"
Forte coletânea de Jurandir Freire Costa, que é com certeza é outro dos mais importantes intelectuais nacionais. Jurandir, apesar de psicanalista, transita com facilidade entre os diversos referenciais filosóficos, com especial ênfase naquela que parece ser sua maior referência: Hannah Arendt.
No primeiro texto, em que pretende delimitar o conceito de violência, embora compreenda seu esforço pela desbanalização da palavra, acredito que tropeça um pouco ao restringir em demasia e acabar vinculando a violência a uma espécie de "má-fé", quando, a meu ver, a violência às vezes ocorre com a melhor das intenções (o caso de muitos padres e religiosos me parece exatamente esse; de outros, nem tanto...).
Ao ler um dos seus últimos textos, "Violência e Transcendência" (2007), posterior a esse volume, vejo que seu conceito se ampliou e provavelmente, pelo que noto no texto, Levinas deve ter sido um autor decisivo para essa mudança, embora seja Hannah Arendt, mais uma vez, o referencial preferido do autor para situar o problema.
Antes de terminar: o artigo que trata da violência racista deveria ser lido por todos os detratores das cotas RACIAIS, para entender exatamente o que está em jogo. É dilacerante.

JOSEF CONRAD, "CORAÇÃO DAS TREVAS"
Mais uma reflexão, no contexto do colonialismo europeu na África, da questão da alteridade e da totalidade. O suposto "projeto civilizatório" europeu levava consigo tremenda violência, representada nas últimas palavras de um personagem central da narrativa: "horror, horror".
Essas palavras são a síntese de todos os temas que estudei durante esse pequeno interlúdio entre o primeiro e segundo semestre, todas temáticas que mostram a violência como estrutura que muitas vezes se mescla e "acinzenta", passando-se por racional.
Quem subestima essa questão jamais toca o ponto central, a raiz, sendo por isso a insistência de autores que tanto me influenciam como Agamben, Timm, Levinas, Derrida, Benjamin, Adorno e outros de que todas as discussões que se passam na superfície do tema deixam o essencial de lado.

Como antídoto a tudo isso, fiquei com vontade de reler "Para além da crueldade", livro em que Derrida magistralmente faz a "ordem da crueldade" da psicanálise transbordar para a transcendência da hospitalidade, do perdão, do dom e - eu acrescentaria, com base no próprio Derrida - da justiça.
Termino, antes do retorno às aulas, "Venenos de Deus, Remédios do Diabo", de Mia Couto, e "O lado obscuro de nós mesmos", de Elisabeth Roudinesco.

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domingo, julho 27, 2008

BACK AGAIN

Dez dias de férias no Rio de Janeiro fazem bem à cabeça. Desculpem os leitores do blog pela ausência de aviso prévio. Amanhã escrevo algo que mereça consideração.
Por enquanto, só uma pequena bobagenzinha: visitando a página do last.fm, vi que o site passou por reformulação e agora parece bastante com um orkut (ou myspace) mais arejado. O last.fm organiza-se pelas preferências musicais do usuário e organiza o que ele vem ouvindo no seu cpu.
Quem não conhece o site pode visitar meu perfil e ter uma pitada. Clicando na rádio "Go with Lucy to the SD", que também está à disposição à direita deste blog, pode acessar um setlist de mais de 500 músicas que preparei. Rock, claro.

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quinta-feira, julho 17, 2008

A DIFÍCIL QUESTÃO DO CONFLITO ISRAEL/PALESTINA

Não sou grande conhecer das circunstâncias históricas do conflito entre Israel e os Palestinos, salvo o óbvio. No entanto, a troca de cadáveres hoje entre Israel e o Hizbollah é significativa.
Para mim, atualmente, a questão se coloca da seguinte forma: o poderio de Israel não tem justificativas. É muita hipocrisia da embaixadora de Israel escrever um artigo sentimental sobre os dois israelenses mortos quando o número de devolvidos ao mundo islâmico foi de 200 pessoas. É ultrajante.
Da mesma forma, a violação dos tratados internacionais, a política internacional e a postura militarista de Israel é tão grotesca quanto a dos EUA atualmente. Ambos países se caracterizam pela ambigüidade entre um discurso interno humanista e liberal e um externo terrorista. É uma lástima. Não ouvi até hoje qualquer argumento a favor dos israelenses que me convença.
Por outro lado, compreendo os israelenses. Os judeus foram um dos povos mais saqueados e massacrados ao longo da histórica, tendo sofrido a maior catástrofe do século XX em um extermínio em massa. Isso os põe na defensiva. No belo filme "Munique", um dos personagens diz em sua fala que "o sangue judeu não será mais derramado impunemente". Me parece ser esse o senso de compreensão que deve existir com as políticas israelenses. Os judeus estão ainda na defensiva; é compreensível.
Isso, no entanto, não desculpa nem justifica a adoção de dois pesos e duas medidas. Não é possível que permaneça a situação de terrorismo de Estado que perdura no conflito. Não é possível que, devolvendo 200 contra 2 mortos, a embaixadora de Israel tenha tanta cara-de-pau. Espero que os judeus possam ouvir dois dos seus tantos grandes gênios, Emmanuel Levinas e Jacques Derrida, e finalmente se desvencilhem dos seus ideais de guerra em nome do Estado justo e do futuro da esperança, traço da cultura judaica que jamais a razão fria greco-ocidental conseguiu erradicar.

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quarta-feira, julho 16, 2008



DEERHUNTER, "MICROCASTLE" (2008)
Depois de um disco elogiado pela crítica ("Cryptograms" - 2007), mas ligeiramente experimental e duro de penetração, o Deerhunter parece encontrar nesse seguimento o perfeito ponto médio entre as belas melodias e a psicodelia que remete a Flaming Lips, Blonde Redhead, Mercury Rev e outros baluartes do chamado "dream pop".
"Microcastle" é obra consistente do início ao fim, não contendo sequer uma música ruim e conseguindo formar um todo orgânico ligado de modo consistente. O disco atravessa diversos climas e ritmos, mas mantém estrutura de combinar melodias suaves e quase pops com um ambiente etéreo e experimental, navegando em viagens sinestésicas que não se perdem em devaneios, bem focadas que estão.
É preciso o atingimento desse ponto médio que faz o álbum chamar tanta atenção quanto, por exemplo, chamou "23", do Blonde Redhead, ano passado. Os vocais são profundas vozes angelicais mergulhados em ambiente onírico e colorido, passeando entre a paz, a velocidade, a embriguez e a fúria. Belíssimo trabalho.




JOAN AS POLICE WOMAN, "TO SURVIVE" (2008)
Ocupando o mesmo espaço de songwritters como Feist, Regina Spektor ou Cat Power, por exemplo, Joan conjuga os mesmos elementos que fazem elas boas e ruins. Ao mesmo tempo que consegue fazer canções dilacerantes, recheando da mais amarga melancolia alguns versos e soando como uma verdadeira navalha que corta o coração, Joan as Police Woman não consegue ultrapassar a monoritmia e banalidade que acabam recaindo muitos dos temas dos artistas integrantes do estilo. Sua semelhança com Feist, nesse sentido, é nítida. Enquanto PJ Harvey ("White Chalk" - 2008) ou Cat Power ("You are Free" - 2004) conseguiram transformar seus álbuns em obras consistentes, ousando ir até o fundo do poço, Joan as Police Woman parece ter o mesmo compromisso de Feist em fazer músicas pseudo-jazzísticas que "animam" o elevador, o consultório do dentista ou o aparelho de CD da moça que gosta de Ana Carolina e Seu Jorge. Quando sai do tom melancólico e parte para o ataque, Joan as Police Woman desliza feio e tropeça no banal, soando insossa como a sua companheira canadense.
Em compensação, "Start of my Heart" é, certamente, uma das músicas mais poderosas que ouvi nos últimos tempos. É doce, triste e profunda como apenas uma mulher pode expressar.
A música é tão boa, tão boa, que eu vou colocar aqui para vocês baixarem. É só clicar aqui.

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segunda-feira, julho 14, 2008

O MAL E AS BALEIAS

Desde 1998, quando comprei por acaso meu primeiro livro de Friedrich Nietzsche chamado "Crespúsculo dos Ídolos" (até hoje, um dos textos seminais da minha vida), me tornei um anti-metafísico compulsivo. Estudando Direito, não faltou irresignação filosófica com milhares de artigos, julgados e livros lidos. Depois, já no final da Faculdade, deixei o Direito de lado (quando vi que a coisa não avançava mesmo) e resolvi voltar à filosofia, conhecendo Deleuze, Guattari e autores do "pós-modernismo" como Maffesoli, Virilio e Baudrillard. Foi um caminho sem volta. Ao longo da Especialização e do Mestrado finalmente me voltei para autores em que me encontrei definitivamente, como Levinas, Derrida, Agamben, Rorty, Benjamin, Adorno, Lyotard, Timm, Foucault e Heidegger. Alguns já tinha lido (Derrida, Foucault e Lyotard), mas só constatei sua densidade a partir desse momento.
A leitura do texto de Nietzsche com 18 anos, cheio de indignação e revolta, foi uma verdadeira conversão. Nietzsche não apenas escrevia com sangue, como para mim é necessário, mas ia destruindo, um a um, meus preconceitos metafísicos, indo até o cerne da moral cristã, que tornou o homem ressentido. O mestre da Basiléia parecia estar escrevendo contra aqueles mesmos idiotas puritanos, severos e doentes que eu me indignava. Sua idéia de "além do bem e do mal" me seduziu ao extremo.
Até ler Hannah Arendt e o seu "Eichmann em Jerusalém". Esse livro -- outro texto seminal -- mudou várias das minhas concepções. Não há como ler Arendt e não se convencer que o mal radical estava presente ali, que a catástrofe da Shoah põe em xeque a "meta-moral" de Nietzsche.
Desde então, cerca de um ano para cá, a antropologia filosófica vem sendo um dos temas sobre o qual mais medito. Já ouvi e li pelo menos três autores fantásticos sobre o tema -- Ricardo Timm de Souza, Ernildo Stein e Pergentino Pivatto -- todos com suas diferenças, mas absolutamente fascinantes. O belíssimo livro de Giorgio Agamben, "O Aberto", é fantástico sobre o tema. O que é o humano? Algo violento, guerreiro, dionisíaco, como queria Nietzsche e alguns seguidores como Bataille e Deleuze levaram ao extremo? Ou é, ao contrário, a "transcendência", a capacidade de sair de si em direção à santidade, como Levinas ou Pivatto levam ao extremo? Devemos desativar a distinção entre o humano e o animal, a "máquina antropológica", como quer Agamben?
Não tenho elementos para decidir essa controvérsia. Não creio que um dia terei. Mas guardo cá os meus pensamentos.
Ontem na Folha de São Paulo há reportagem em que se narra que o Japão admitiu procurar justificativas "científicas" na caça às baleias. Para quem não conhece o caso, que se prolonga há alguns anos, desde 1986 foi decretada a proibição de caça às baleias, mas como o carne é parte da cultura japonesa, estes caçam um pequeno número (que aumenta) sob alegação de interesse científico. Isso tem causado revolta de ambientalistas e muitos protestos.
O que me faz pensar sobre o bem e o mal. O ser humano me parece um ambivalente incorrigível, capaz da violência e da santidade, todos nós com agressividade e transcendência no nosso "menu" de ações. Freud, Nietzsche ou Jung me parecem ter razão de que há uma "sombra" intangível que se alimenta dos nossos desejos terríveis, e que a melhor forma de lidar com eles é abertamente, conscientemente, olhando ao abismo. Mas Levinas e Rosenzweig, na outra mão, de me impede de cair no abismo e abraçar o niilismo -- mesmo um niilismo "trágico" --, porque a responsabilidade está aí e todo instante é uma decisão. Posso sair de mim mesmo e transcender. Posso. O ser humano parece uma rede tecida entre esses dois lados, de uma ambivalência desesperadora, perdido em algum local entre um e outro.
Mas o "inumano", o maquínico, a matança industrial que descreve Hannah Arendt não pode ser humana. Sade, como antecedente dos campos de concentração, é a prova disso. Em Sade não temos simplesmente o gozo "inocente" de que fala Nietzsche, pois o além-do-homem parece mais a criança que o camelo ou o leão, mas um gozo cruel, organizado, centrado e ideologizado. A violência não é exercida como impulso irresistível, como falha do super-ego, como gozo desejado. A violência ali é um padrão de conduta, organizada racionalmente na sua filosofia libertina. Filosofia que, na sua estrutura racional, precisa da "vítima", o Outro que é mutilado e destruído.
Me parece que o mal surge exatamente quando essa violência inerente ao ser humano, esse lado dionisíaco ou sombra, junta-se com a razão instrumental, e produz-se assim a tecnologia do campo. Quando a violência humana, típica do nosso lado sombra, conjuga-se com uma estrutura fria e opaca de razão, temos a possibilidade de vislumbrar o inumano -- o mal. É a única forma que consigo equacionar a transição do Japão que caça baleias enquanto cultura de pessoas que precisavam sobreviver e viviam junto ao oceano com o Japão que caça baleias sob o pretexto de "fazer ciência", tudo em proporções industriais. Um certo pessimismo com a técnica e o mal que ela pode produzir é o que me assusta.

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sábado, julho 12, 2008

NOVOS REFORÇOS: BOAS PERSPECTIVAS

A chegada de três ótimos reforços dá um alento à torcida gremista: Tcheco, Souza e agora Orteman pode confirmar a formação de um grande meio-campo. Celso Roth pode formar o time no 3-5-2 com Souza na ala (Victor; Léo, Pereira e Rever; Souza, Rafael Carioca, Orteman, Tcheco e Helder; Perea e Marcel) ou com um meio de campo composto por quatro jogadores de médio potencial de marcação, mas todos marcando (Victor; P. Sérgio, Pereira, Léo e Bruno Telles; Rafael Carioca (Makelele), Tcheco, Orteman e Souza; Perea e Marcel) ou até formar um 4-5-1 (Victor; P. Sérgio, Pereira, Léo e B. Telles; Makelele, Rafael Carioca, Tcheco, Orteman e Souza; Perea). Três ótimas opções de equipe.
É esperar que Roth tome o trem da história que sucede aquele que perdeu anos atrás. É ter coragem para vencer, não se entregar à depressão e não inventar diante da pressão. Com calma e talvez um atacante de reforço, Roth tem condições de montar uma grande equipe.

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sexta-feira, julho 11, 2008

PRISÕES ESPETACULARES

Uma vez, em palestra na PUCRS, afirmei que não há coisa mais ingênua do que o discurso constitucionalista do Direito. Não é possível que os penalistas que estudam a Constituição não percebam que, por exemplo, a questão das algemas é muito mais interessante do que uma mera ponderação de princípios jurídicos.
Diversos senadores e deputados, além da mídia conservadora, manifestam-se contra a "espetacularização da prisão" de Dantas e outros. É exatamente o mesmo fenômeno.
Jamais vi senadores do PSDB ou do DEM e jornalistas da Veja reclamarem quando um traficante ou um assaltante de bancos é preso com repercussão midiática. Jamais vi tanto clamor pelo "Estado Democrático de Direito" por setores que ajudaram a aprovar leis penais bizarras e draconianas. Nunca vi colunistas conservadores se queixarem que algemaram um traficante poderoso já completamente desarmado e incapaz de reação. Jamais vi deputados federais -- inclusive do PT -- afirmarem solenemente que a prisão processual deve ser usada com cautela, que qualquer um pode ser vítima de abuso policial, que estamos caminhando para um Estado Policial. Nunca.
É um espetáculo sim o que está acontecendo. Mas um espetáculo do ridículo.
Os mesmos patetas que bradam contra a "impunidade" e os excessivos benefícios do processo penal, esses cães com hidrofobia que jogaram na fogueira o casal Nardoni, por exemplo, são os que agora reclamam do avanço do "Estado Policial".
Pois bem, meus amigos: eis o Estado Policial que VOCÊS COLABORAM EM CRIAR. O que acontece com as algemas e prisões processuais é que esses dispositivos estavam presos ao estado de exceção que ocorre na realidade e suspende as regras jurídicas, como no caso de Suzane Richtofen e do casal Nardoni, além das centenas de pobres e negros que não sabemos o nome porque não viram notícia, que estão apodrecendo cumprindo uma pena antecipada antes da condenação e foram algemadas para saciar as pulsões destrutivas dos "cidadãos de bem".
Não há um entendimento jurídico consolidado sobre o uso de algemas porque esse uso jamais foi questionado, estava preso no estado de exceção que suspende as normas constitucionais. À clientela do sistema penal, reduzida ao estado de vida nua, não adiantava recorrer, pois era o Estado de Polícia, na prática, que acontecia, enquanto o "dique" Estado de Direito não conseguia segurar a correnteza punitiva.
"Bem-vindos ao deserto do real", meus caros. Apavorem-se com o monstro que vocês criaram. Agora a clientela desse sistema não são apenas os traficantes negros da favela -- os bodes expiatórios da cultura punitiva tupiniquim -- mas também os de "colarinho branco", entre os quais vocês também se incluem, e agora estão cagados de medo.
Até que o estado de exceção atingisse o colarinho branco, ninguém falava absolutamente nada. Era tudo leniência, laxismo, frouxidão. Combatíamos a impunidade e os defensores do direitos humanos eram ridicularizados. Agora todo mundo fala de garantias processuais.
É nossa vez de rir.

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quarta-feira, julho 09, 2008

A PRISÃO DE DANIEL DANTAS

Cuido para não cair no gozo fascista que todos nós carregamos, como já advertia em outro post (lendo, atualmente, "Filosofia na Alcova", do Marquês de Sade, fica clara a barbárie dentro dos mais comportados burgueses). Também para não desmerecer a presunção de inocência e vangloriar a prisão populista. Mas vamos a algumas considerações sobre a prisão de Dantas.
É sabido nos meios jornalísticos e políticos (quem lê jornal compulsivamente, como eu, sabe disso) que Dantas é um dos, senão "o", grande eixo da corrupção no Planalto Federal desde o Governo FHC. "Estrela" das privatizações e depois personagem do Mensalão, está na cara que constitui um dos principais agentes de desvio de dinheiro e especulação em cima de questões públicas, tendo beneficiado um espectro político que vai do DEM até o PT. Todo petista, aliás, sabe que a ala de Dirceu, Silvinho e Delúbio apropriou-se de um esquema começado pelo PSDB, haja vista, inclusive, a mesma fonte (Valerioduto, MG).
Imagino que essa prisão possa mostrar um nível de putrefação inacreditável no Congresso e Palácio do Planalto, atingindo desde alvos certeiros (senadores moralistas do PFL, congressistas do PSDB, PTB, PR, etc., e a banda sindicalista do PT) até outros menos (por exemplo, José Serra, que tem filha sócia da irmã de Dantas, fato que Paulo Henrique Amorim -- que deve ter tomado litros de champagne ontem -- noticia há horas). É bom. Da minha parte, espero que o Congresso arda em chamas e toda essa corja caia de vez, de preferência a partir de investigações consistentes da PF (espero que sejam...).
A prisão de Dantas, por isso, parece ter um incrível valor político: um ar para o republicanismo brasileiro. Ouso afirmar até que me parece, ao contrário de tantos outros casos (inclusive de Pitta) justificada a prisão preventiva: há acusação que Dantas tentou subordar o Delegado Federal encarregado da investigação, o que é suficiente para decretação da preventiva por ameaça ao processo. Sou contrário ao uso de algemas e ao tom especular da prisão. Mas a prisão, em princípio, me pareceu justificada.
Mais ridículo é o chapeuzinho da Veja desvairado em seu blog, louco de doer, escrevendo um milhão de posts sobre o assunto. Está cagado de medo. Há várias denúncias -- entre elas o blog do Nassif -- de relação Dantas/Veja. As afirmações do chapeuzinho são muito engraçadas, por revelarem a sua qualidade como jornalista. Quando é contra os "petralhas", prisão neles. Quando é casal Nardoni, preventiva já. Quando é "caso Alstom", "dossiê" ou Daniel Dantas, cuidado com o Estado Policial! Que o jornalista defenda o Estado de Direito é louvável. O problema é que seu Estado de Direito é seletivo: só para os amigos. Duvido que ele brade contra preventivas e algemas quando se trata de algum assaltante de banco ou traficante. Trata-se de jornalismo sem credibilidade; jornalismo a serviço.

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terça-feira, julho 08, 2008

TRÂNSITO É TUDO

Em São Paulo, o noticiário coloca o trânsito como a pauta central dos candidatos à Prefeitura. Em Porto Alegre também discute-se trânsito (especialmente o metrô), mas com menos intensidade.
Creio que o trânsito é o aspecto central das nossas sociedades contemporâneas. Um dia, quando tiver tempo e mais pesquisa, escreverei um livro que se chamará: "Trânsito".
O trânsito é a melhor metáfora da nossa era.
Primeiro, porque cada indivíduo está absolutamente isolado de seu entorno, protegido por um tanque de metal totalmente lacrado (no caso dos mais ricos, blindado) e muitas vezes invisível ao exterior (vidros com película). No trânsito não há contato humano. O motorista está protegido por uma capa de metal que inviabiliza o contato ou por um acelerador que pode disparar depois de uma ofensa. Essa capa de metal também é projeção do seu ego narcisista, cheia de incrementos e polida para brilhar, quando não presente caixas de som que explodem os tímpanos de todos os circundantes.
Segundo, porque o trânsito é o reflexo do individualismo sob o ângulo do egoísmo. Todo mundo tem razão, cada um tem suas prioridades. O individualismo é selvagem, eu corro o máximo que puder e ultrapasso todos os possíveis porque tenho muita pressa. Os demais que se fodam. Ultrapasso pela direita, vou pelo acostamento. Estamos em plena lei das selvas, em que dar lugar a alguém resulta em buzina do carro atrás, pedir para passar é sonhar em demasia, para ocupar um lugar tenho que invadir a pista do outro. No trânsito, a subjetividade autocentrada contemporânea, incapaz de estabelecer o contato humano e preocupada apenas consigo mesma, encontra o seu habitat natural.
É também sob a batuta da lei das selvas que cada um descarrega no outro toda sua raiva e frustração. A agressividade de buzina, de ofensas diretas e às vezes até manobras de revide mostra uma sociedade tremendamente ressentida. É no trânsito que perde todo o sentido a distinção "cidadão de bem" contra "bandido", pois todo mundo se torna um agressivo e violento, até as mulheres.
O trânsito é ainda reflexo da velocidade das sociedades pós-modernas. Ritmo frenético, pressa constante intercalada com engarrafamentos gigantescos e tensão para chegar ao lugar pretendido. Tudo contribui para o estresse. Esse indivíduo estressado não tem mais tempo para refletir e meditar, vive absorvido num fluxo constante que o impede de parar por um segundo e, paradoxalmente, impõe-lhe uma ausência completa de pensamento. É o "ativo estagnado" contemporâneo.
Derivado desse estado de nervos, o motorista, blindado no seu tanque de guerra que é o reflexo ambulante do condomínio fechado em que vive e da sua ostentação ofensiva, é incapaz de olhar o outro que está ali diante de si. Flanelinhas, pedintes, moradores de rua, carroceiros, ciclistas, pedestres e todos aqueles que atravancam o desenrolar narcísico da sua viagem são vistos como obstáculos que devem ser destruídos. Daí a intolerância dos nossos dias.
Por fim, o trânsito é também espelho do nosso desenvolvimento: fabricamos mais, consumimos mais e jogamos mais carros fora sem existir sustentabilidade para isso, causando a destruição da nossa casa (o Planeta Terra) e a incapacidade das cidades de agüentarem esse fluxo.
Quem, no entanto, ousa parar?

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segunda-feira, julho 07, 2008

FROM THE 90'S: IN A GOOD SHAPE

É impressionante como as melhores bandas dos anos 90 continuam lançando discos relevantes e, via de regra, bem superiores aos das bandas dos nossos dias. O Oasis lançou um discaço há três anos atrás ("Don't believe the truth"), com muito do vigor juvenil de "Definitely Maybe" (1994). O Portishead, dez anos depois do último lançamento, lançou o espetacular "Third" (2008), certamente o disco do ano até agora, consagrando o melhor da música experimental da década em uma bela viagem psicodélica. O Radiohead, ano passado, lançou seu terceiro melhor disco, perdendo apenas para os clássicos "Ok Computer" (1997) e "Kid A" (2000), sem nenhuma música ruim, consistente e moderníssimo. Três bandas poderosas dos anos 90 deixaram para trás muita gente britânica com prestígio nesses anos 2000, como o Franz Ferdinand, Libertines ou Arctic Monkeys. Mesmo Damon Albarn, embora fora do Blur, lançou um ótimo trabalho com o The Good, The Bad & The Queen (2007), em desvairios psicodélicos mergulhados em spaghetti western.
Esse ano, da mesma safra do rock britânico anos 90, lançará seu álbum do The Verve. Espero que a bandaça de Richard Ashcroft, que esperava ansiosamente, mantenha o nível dos seus pares. O rock britânico, apesar de bombadão na sua terra e cheio de hype, está dependente das suas grandes bandas da década passada.
Para quem não se lembra do poderio da banda de Richard Ashcroft e Nick McCabe, recomendo assistir o vídeo abaixo. É orgasmo certo.


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sexta-feira, julho 04, 2008

FILOSOFIA SEMPRE, DENTRO DE TUDO

Uma das características da nossa cultura científica (paradigma, sabe?) contemporânea é a ojeriza pela filosofia. Biólogos, físicos, neurocientistas, sociólogos e psicólogos têm alergia ao raciocínio filosófico. Foi o Positivismo científico, depois o Positivismo lógico (pai da filosofia analítica) que empobreceu o horizonte filosófico nas ciências, inflacionando a idéia de "empirismo" e rechaçando todo o resto como "metafísica", pura especulação sem base verificável e, por isso, de valor nulo.
Infelizmente, a maioria dos nossos cientistas não teve o prazer de ler Husserl, Heidegger, Merlau-Ponty, Levinas ou mesmo Dewey e Rorty para descobrir que o "empirismo" não é um ponto de vista neutro, ausente de reflexão filosófica, mas a rigor consiste numa estratégia "ingênua" de descrição da realidade, que não percebe o tempo e a faticidade como elementos decisivos para a constituição da "objetividade". Não percebem que o "fato bruto", que pretendem absorver pelo empirismo, não vem desacompanhado de sentido e mundo, e que essas categorias determinam a nossa visão sobre os entes. Para eles, isso é relativismo. Para quem entendeu a perspectiva fenomenológica, o empirismo é ingênuo, tributário do antigo e ultrapassado realismo.
Acredito que o trabalho das neurociências é o grande exemplo dos problemas epistemológicos de base. Voltados para um olhar empirista, os neurocientistas acabam teorizando sobre dados empíricos brutos novos a partir de conceitos antigos. Tomemos dois exemplos.
O primeiro é que questão razão/emoção. É célebre o livro de Antonio Damasio chamado "O Erro de Descartes", no qual prova pela via empírica a inseparabilidade da razão e emoção, partindo de pesquisas com cérebros danificados. Damasio, no entanto, não percebe que toma dois conceitos filosóficos -- razão e emoção -- como se fossem dados brutos, partindo deles para sua análises. Desde Nietzsche e Heidegger sabe-se que toda ação humana é acompanhada de uma "tenacidade emocional", quer dizer, de um estado de espírito emotivo, daí a importância da angústia como elemento existencial decisivo para Heidegger (Agamben, por exemplo, tem belas páginas escritas em "Estâncias" sobre a melancolia). Os conceitos de razão e emoção de Damasio, portanto, não são naturais, mas na verdade premissas epistemológicas que se baseiam na própria filosofia cartesiana (afinal, a mais influente na ciência moderna). Quer dizer: seu livro só faz sentido como crítica interna ao cartesianismo, mas não acrescenta nada para quem leu "Ser e Tempo" ou as ácidas críticas de Nietzsche sobre a "psicologia" dos filósofos.
Da mesma forma, neuros como Daniel Goleman procuram falar de uma "inteligência emocional" e depois outras. Para Goleman utilizar esse conceito, ele já passou por um nível epistemológico cartesiano, partindo da idéia de "inteligência", tentando mostrar que a ela também acompanha a "emoção". Inteligência, portanto, é um conceito não-empírico, que formata a informações posteriormente recebidas como "fatos brutos". Provavelmente se acrescentarão 50 novos tipos de "inteligência", sem darmos conta de que o problema é propriamente filosófico, e não científico, sobre o que afinal é inteligência. Se tivermos lido Heidegger e Levinas, certamente saberemos que a experiência humana é mais rica do que a cognição, que o pensamento é parte da existência, e por isso teremos que ter um conceito mais elástico de inteligência. O conceito vem antes que a pesquisa empírica.
O mesmo se dá, por exemplo, nas inúmeros pesquisas neurológicas que, na ânsia do empirismo, acabam retornando a um dualismo cartesiano, separando "corpo" e "mente" como se fossem duas coisas distintas e, por isso, ignorando todo genial trabalho de Merleau-Ponty.
Na Criminologia, isso ainda é mais claro. A Escola de Chicago -- centro de inúmeras pesquisas durante os primeiros 50 anos do século passado -- tinha um enorme repertório de pesquisas de campo com estatísticas e cartografias do delito baseadas em pesquisas de campo. Bastou um criminólogo de nome Edwin Sutherland abrir o conceito de "crime" (alargando as pesquisas para o "crime de colarinho branco") para todos os determinismos ecológicos caírem por terra. O empirismo exagerado da Escola de Chicago a impediu de enxergar aspectos importantes que constituíam a recepção dos dados brutos que foram se acumulando.
A ciência, assim, não está desvinculada da filosofia; antes o contrário, sempre e sempre todas as pesquisas científicas estão vinculadas a algum paradigma filosófico, interpretando os fatos brutos por meio de conceitos que muitas vezes podem estar surpreendentemente ultrapassados.

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quinta-feira, julho 03, 2008

O DIFÍCIL EQUILÍBRIO ENTRE ATAQUE E DEFESA

A minha geração dá pra dizer que é bastante sui generis em matéria de futebol: entre os meus amigos, a quase totalidade é gremista, e todos viram o Grêmio levantar várias taças durante a década de 90 com o Felipão no comando, influenciando sua formação sobre como se deve jogar futebol.
Não é à-toa que a maioria detesta times "faceiros", aprovam a existência de dois volantes duros à frente da área, pregam um futebol cauteloso e vangloriam o técnico turrão e cabeça-dura. Todas as características daquele vitorioso Grêmio de Paulo Nunes, Dinho, Arce e Jardel. Equipe raçuda, defensiva, competitiva e treinada por um cabeçudo teimoso, persistente e adepto da segurança defensiva.
Eu também já pensei assim. Olhar mais futebol, ver as equipes européias jogando em várias Championsleague e acompanhar com maturidade pelo menos quatro Copas do Mundo me fez mudar o ângulo um pouco. A isso colabora também a minha tendência ao não-apego às idéias, a minha ojeriza a dogmas e respostas prontas. O futebol também tem seus dogmas e seus fundamentalismos.
Foi assistindo equipes como o Chelsea de José Mourinho, o Barcelona de Rikjaard, o ManUnt de Ferguson, o Arsenal de Wenger e a Holanda atual, a Espanha ou Portugal que ficou claro para mim que a dualidade ofensivismo versus defensivismo é um duelo entre maus treinadores. Essas equipes tinham como características atacar muito (afinal, o objetivo do futebol é o gol) sem perder a compactação defensiva, usando estratégias diversas como a velocidade dos contra-ataques, a marcação-pressão ou o toque de bola incessante e de primeira. Começo a perceber que técnicos que montam equipes que sabem atacar sem saber se defender são tão ruins quanto os que só sabem se defender. É verdade que, vez que outra, eles (ambos) costumam vencer torneios. Mas, se podemos ter os dois aspectos, por que razão precisamos só defender ou jogar expostos ao adversário?
O desafio do grande técnico é montar uma equipe compacta, que saiba defender e atacar, como os Grêmios de 2001 e 2006, sólido atrás, marcando desde o ataque e pressionando o adversário por todos os lados. Mourinho nos ensinou que até com pontas é possível jogar, hoje em dia, sem perder qualidade defensiva. Basta que a marcação seja implacável e no campo todo.
Aos gremistas apolegetas de Felipão, presos nos anos 90, dogmáticos e fechados, convido a analisarem a própria conduta do seu professor. Felipão escalou apenas Petit para a cabeça de área, seguido de João Moutinho e Deco na armação, Simão e Ronaldo abertos nas pontas e Nuno Gomes como finalizador. Felipão escalou Juninho Paulista de segundo jogador de meio durante a Copa de 2002. E já comprou Deco e planeja trazer Ronaldinho para o Chelsea.
Felipão é o exemplo da evolução do próprio futebol nos últimos anos. As seleções e equipes da década de 90 e início de 2000 que jogavam fechadas, com dois marcadores pesados aos poucos vão substituindo por jogadores mais leves, velozes ou capazes de enfrentamento físico com agressividade no ataque (como Essien, Ballack, Lampard, Gerrard). Os próprios volantes estão trocando o perfil, ficando mais parecidos com Pirlo do que com Gattuso. É o futebol que começa a sair da sua era mais defensiva para reestabelecer o ofensivo, mas transposto um estágio dialético que permitiu incorporar a compactação como elemento fundamental da equipe.
Esse nesse tênue fio que transita o grande técnico. É isso que diferencia Mourinho, Felipão ou Luxemburgo de técnicos excessivamente defensivistas, como Muricy (seus times só alçam bola na área) e Roth (espero que evolua), ou excessivamente ofensivistas, que não conseguem o equilíbrio (como Renato ou Cuca). Ambos podem evoluir e encontro o ponto ótimo da equipe, como Tite e Mano imprimiram nos seus grandes anos no Grêmio (2001 e 2006). Esse é o futuro do futebol. Quem não está vendo isso está cego nos seus dogmas. Só que o tempo não perdoa os dogmáticos.

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SELEÇÃO DA EUROCOPA

Já vou avisando que a seleção tem grave defeito: não acompanhei bem os times da Rússia e da Turquia, que acabaram nas semi-finais. Mas, apesar disso, vamos lá:

GOLEIRO:

IKER CASSILAS (ESPANHA/REAL MADRID) -
O goleiro do Real Madrid mostrou, com performances seguras e regulares ao longo de toda competição, que está no clube dos grandes goleiros mundiais.

LATERAL-DIREITO:

BOSINGWA (PORTUGAL) - Nessa posição carente de grandes valores mundiais (e considerando que Ramos, salvo a final, não fez boas partidas), o português arisco foi quem mais apoiou e marcou, compensando seu nível técnico mediano com muita fibra e esforço.

ZAGUEIROS:

MARCHENA (ESPANHA/VALENCIA) - O zagueiro do Valencia, inicialmente objeto de dúvidas sobre sua escalação, foi uma muralha ao longo de toda Eurocopa, indo bem no jogo aéreo e por baixo.

? - A UEFA colocou Pepe entre os melhores. Jamais. O português foi uma barata tonta na grande área de Portugal. Ricardo Carvalho também não fez grandes partidas. Os italianos, por incrível que pareça, jogaram mal. Os franceses idem. Rússia e Turquia não consegui ver bem, e os alemães também não têm zaga segura, é excessivamente lenta. Puyol é limitado. Moral da história: nenhum outro grande zagueiro foi visto na competição.

LATERAL-ESQUERDO:

GIOVANNI VAN BRONCKHORST (HOLANDA/PSV) - O lateral ex-Barcelona decidiu praticamente todos os jogos da primeira fase, surpreendendo em avanços que redundaram contra-ataques mortíferos, com muita velocidade, toques rápidos e precisos e boas assistências.

MEIO-CAMPO:

MARCUS SENNA (ESPANHA/VILLAREAL) - Contestado até por mim, que preferia Xabi Alonso, Senna foi a peça-chave do time de Aragonés, marcando feito um leão e preenchendo todos os espaços à frente da área, como um verdadeiro leão-de-chácara que deixava seus companheiros avançarem livremente. A seu favor contou também um bom passe de saída de bola.
XAVI (ESPANHA/BARCELONA) - Eleito o melhor jogador da Eurocopa, apesar de não ser um craque, Xavi é um jogador que se destaca pela sua completude: marca, passa, chuta e até cabeceia, apesar de baixo. Foi o grande armador do time espanhol, lembrando aqueles antigos camisa 8 que dosavam a velocidade do ataque, faziam a bola girar e deixavam os companheiros na cara do gol.
SNEIJDER (HOLANDA/REAL MADRID) - Representante da sensação holandesa na primeira fase, Sneijder jogou com segurança, abusando do seu chute preciso de longa distância, distribuindo bem o jogo e servindo de "atalho" a muitos contra-ataques velozes imprimidos pela Laranja Mecânica.
BALLACK (ALEMANHA/CHELSEA) - Esteve, palmo-a-palmo com Schweinsteger, na linha de frente do meio-campo alemão. Alto, forte e de largas passadas, Ballack agrega muita raça com um bom chute de fora da área, cabeceia bem e sabe de livrar do marcador com o corpo. Um jogador ocupador de espaços e muito útil no meio campo, que certamente gera dor-de-cabeça dos técnicos adversários na marcação.

ATACANTES:

PODOLSKI (ALEMANHA/BAYERN DE MUNIQUE) - Impressionou a subida de rendimento do alemão ao longo da competição, utilizando seu recurso de chutes fortes e boa colocação no rebote da área para decidir as partidas. Jogou o que não vem jogando no Bayern há duas temporadas.

FERNANDO TORRES (ESPANHA/LIVERPOOL) - Disputa palmo-a-palmo com seu parceiro Villa essa posição, mas o elegi por ter sido um verdadeiro leão durante a partida final, congregando todas as suas características: arranque, ultrapassagem, chute, cabeceio, insistência e raça.

TÉCNICO: GUUS HIDDINK (RÚSSIA) - Impressionante sua capacidade de fazer boas campanhas até mesmo com equipes improváveis, sempre caracterizadas pelo bom futebol, toque de bola, ofensividade e superação dos seus limites. Depois da Coréia do Sul, Hiddink quase fez um milagre pela Rússia.

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quarta-feira, julho 02, 2008

COMPLEXO DE VIRA-LATA

Nelson Rodrigues, um grande leitor da psicologia tupiniquim, definiu o brasileiro como portador de "complexo de vira-lata". Lendo o artigo de Gerdau Johanpeter na ZH de domingo, não posso deixar de concordar violentamente com o mestre torcedor do Fluminense.
Gerdau afirma que a lei de tolerância zero no trânsito marca um novo momento, em que a tolerância deixará de ser vista como virtude e pararemos de tolerar condutas como jogar lixo na rua e relaciona isso com condutas como a dos "sanguessugas", do "mensalão" ou do DETRAN. A tolerância afetaria a "credibilidade das instituições" e daí por diante.
Gerdau, em um certo momento, cita seu grande referencial: Rudolf Giuliani, Prefeito de Nova York que implementou o "Programa de Tolerância Zero".
É aqui que, precisamente, entra nosso "complexo de vira-lata". É impressionante como agora se repete a experiência de NY como se fosse um mantra em solo gaúcho, vangloriando o "milagre" da redução da criminalidade. Nada de fala das ácidas críticas criminológicas ao programa -- basta ler, por exemplo, um Jock Young ou um Loïc Wacquant --, que não encontra unanimidade nem na academia norte-americana, tampouco da redução idêntica do nível de delitos em outras cidades norte-americanas sem a adoção do slogan e baseada em outros modelos de segurança, a exemplo do policiamento comunitário. Aliás, o Tolerância Zero é reduzido ao seu aspecto mais cretino, que é exatamente a intolerância aos pequenos delitos, tese de James Wilson que NÃO foi implementada ao todo em NY, sem se falar, p. ex., da redução drástica da corrupção e o investimento na polícia. A Tolerância Zero teve público, e certamente os executivos de Wall Street não estavam muito preocupados com os esquadrões de Giuliani, apesar dos seus white-collar crimes.
O que me leva ao segundo ponto do complexo de vira-lata: por que raios achamos que nossos políticos que cometem fraudes de mensalão e DETRAN são corruptos e os EUA são exemplo, quando Bush "inventou" uma guerra para pagar seus lobbies armamentista e imobiliário e entope o Iraque de empresas de segurança vinculadas aos seus assessores? Isso não é corrupção? Não é corrupção gastar bilhões em um conflito que visa a encher os bolsos das petrolíferas dos EUA? Quem de nós não enxerga a tremenda corrupção que existe nos EUA, locupletando um complexo-industrial militar que tenta transformar a democracia norte-americana em plutocracia?
Terceiro ponto do "complexo de vira-lata": Gerdau não refletiu sobre nada disso. Nosso autoritarismo, como diz Eugenio Raúl Zaffaroni, é um "autoritarismo cool", baseado em slogans publicitários ("tolerância zero", "janelas quebradas") e consiste num mimetismo patético das elites latino-americanas do comportamento dos vizinhos do Norte, sem se atentar para as peculiaridades presentes no contexto do Sul. Não é mais o autoritarismo fundamentado, o aparato científico-racista-nacionalista do Nazismo, mas um autoritarismo raso, publicitário, cosmético, superficial e cheio de slogans que encerram discussões. O "Tolerância Zero" de Giuliani, por exemplo, é um mantra repetido ad nauseam, sem que percebamos que Giuliani sequer conseguiu ser eleito candidato republicano esse ano, e que Jock Young afirma que temos tanto para aprender com o TZ quanto com os Gulags soviéticos, os Lager nazistas e assim por diante.
É difícil discutir o papel da tolerância com esses autoritários "cools". Mas talvez seja útil recomendar uma releitura em Voltaire e Beccaria para convencê-los que ela é um dos pilares da nossa civilização moderna.

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