Mox in the Sky with Diamonds

quarta-feira, fevereiro 04, 2009

ISRAEL É NAZISTA?

NÃO, é a resposta imediata e que já escancaro desde o início para não deixar dúvidas. Não creio que seja possível comparar os atos de Israel às atrocidades do nazismo, a menos que passemos a comparar tudo com o nazismo - aí tudo bem [inclusive, por exemplo, com a situação que passam os habitantes dos nossos morros brasileiros, que acabam vitimados pelo extermínio policial independente de estarem ligados a redes de delitos. Nesse caso, nós (classe média, elite), seríamos nazistas].
A acusação de que Israel deflagra campos de concentração, que pretende a erradicação dos palestinos, usa as mesmas técnicas nazistas e promove um genocídio me parece simplesmente falsa. Basta distanciar-se um pouco para verificar que os fatos não são exatamente assim.
O nazismo foi uma ideologia complexa que, entre outras perversidades, defendia o extermínio de uma "raça" (judia), ou melhor, das "raças inferiores" (incluídos, por exemplo, ciganos). Além disso, organizou uma "máquina administrativa", como bem descreve Hannah Arendt no clássico Eichmann em Jerusalém, para dar conta da "solução final". Acabou com cerca de 6 milhões de judeus. O ato, portanto, era gratuito, uma verdadeira "limpeza" que não representava qualquer acréscimo em termos de guerra.
A situação não me parece idêntica ao que ocorre em Israel. Acusar Israel de nazismo pode ser uma estratégia hiperbólica de sensibilização - perante a qual eu não nutro antipatia, ante o imperativo ético de suspender a violência aos palestinos - porém não pode ser levada a sério de ponto de vista racional. O que Israel pode ser acusado é de nacionalismo extremado, isso eu concordo - mas convenhamos que nem todo nacionalismo é nazismo, embora este seja o extremo do extremo do nacionalismo. Equiparar ambos pela raiz pode ser uma estratégia de argumentação ética hiperbólica - até um dever moral -, mas racionalmente insuficiente. Como o que mais falta no conflito Israel/Palestina é razão, ponderação e negociação, não creio que seja a melhor estratégia.
Minha preocupação com o antissemitismo ainda extremamente disseminado persiste. É como se os antissemitas gozassem da situação, afirmando: "viu, eu disse que os judeus não prestam!". Muito da solidariedade com o povo palestino é, na realidade, racismo com os judeus, pois o "solidário" não tem o mesmo olhar generoso para o favelado ou qualquer "Outro" [especialmente se leva o rótulo de "terrorista"].
Também me indigno pela guerra que, na realidade, é um massacre aos palestinos promovido por Israel. Bombas de fósforo branco são expedientes hediondos, grotescos, nojentos. Tão grotescos quanto atos de guerra promovidos pela França, Inglaterra ou EUA [os EUA eram nazistas por usar Napalm no Vietnã?]. Mas isso não tem conexão com o nazismo. O nazismo promoveu - sem qualquer finalidade de guerra - o extermínio de uma população com uma finalidade genocida. Israel promove atos de guerra covardes, desproporcionais, absolutamente injustos e que devem cessar imediatamente [para os que contestam a idéia de "proporcionalidade" na guerra, recomendo revisarem o conceito jurídico de legítima defesa e verificarem a exigência de "moderação", sob pena de o agente responder pelo excesso]. Os foguetes do Hamas soam como uma piada perante tal poderio militar, porém é de se convir que, à medida que o Hamas declara guerra à Israel e usa o armamento disponível, desencaixa a idéia de genocídio. Os judeus jamais declararam guerra à Alemanha ou aos "arianos".
Muito do conflito Israel/Palestina se explica pelo ressentimento de ambas as partes. De Israel em relação ao Ocidente e às Nações Unidas que, durante a II Guerra Mundial, deixou-os morrerem como "ovelhas". Para eles, Ocidente e Nações Unidas nunca se preocuparam com judeus, e continuam não se preocupando. Os palestinos, por sua vez, por uma ocupação forçada, massacres permanentes e uma história de sucessivos regimes de dominação promovidos pelo Ocidente, formando um eixo islâmico-fundamentalista que já bebe o sangue do ressentimento.
Nossa sorte dependerá do fato de que os fundamentalistas judeus [que não é a "democracia laica" que a imprensa conservadora apregoa] e fundamentalistas islâmicos não são a maioria. Detêm poder, no momento. Mas não são os únicos. Há forças que pensam de forma distinta em ambos os lados. O sucesso da negociação dependerá disso.
Não há dúvida que, nas circunstâncias, os palestinos têm quase toda razão. Quase toda porque a erradição de Israel, proposta do Hamas, não é mais legítima. Os isralenses já estão naquele território e agora a questão é partir para a negociação dos territórios. Nem sempre a justiça pode ser trazida para um seu ponto ideal. Às vezes é preciso juntar os cacos e pensar para o futuro, restaurando aquilo que é possível restaurar. Essa justiça é uma justiça que se opõe ao ressentimento e à vingança; a justiça restaurativa é uma justiça que se volta para a felicidade de todos, aceitada certa tragicidade inerente à história humana de violência.


PS: No mais, remeto ao artigo de Vladimir Safatle, certamente o melhor que já li sobre o tema. Leitura obrigatória.

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