A BURRICE COTIDIANA NO RS
TEM GENTE QUE FICA brava quando falo que o povo gaúcho é uma merda. Alguns por gostarem do "tradicionalismo" (pura alucinação); outros, por considerarem o RS "marginal". Enfim, sei lá. Talvez ache o povo gaúcho uma merda apenas por estar com uma perspectiva mais próxima. É possível. Só que não posso deixar de comentar essa exibição da mediocridade gaúcha cotidiana que é a Zero Hora. Sem ter o toque afetado e propositalmente cínico dos cronistas da Veja, por exemplo (que já identificaram como filão editorial o neoconservadorismo), os gaúchos são sweet neocons by nature. "Natural born neocons". Não tem nenhuma afetação nos nossos jornalistas: eles são retrógrados, estúpidos, reprimidos e repressivos mesmo. Fazem o jornalzinho do Texas.
Vejam as mais recentes "campanhas". Primeira, o "X da educação". Fica-se debatendo artigos e mais artigos sobre os "limites" do adolescente, sobre a desobediência à "autoridade" do professor e a ausência de "disciplina" dos jovens modernos, mas nada se fala sobre: 1) o salário ridículo e pífio que desmotiva qualquer professor; 2) as condições precárias das escolas, incapazes de atrair os alunos para atividades; 3) as condições sociais precárias desses "alunos-problema"; 4) a grade curricular ridícula e cheia de conteúdos desnecessários, baseada na memorização burra e inútil; e 5) na insuficiência de uma educação baseada no castigo, tradição, disciplina e autoridade nos nossos tempos contemporâneos.
O mesmo com o "Crack, nem pensar". É a coisa mais burra que já li na vida. Crack é algo que devemos pensar, sim. E muito. Pois, se o crack é algo que retira completamente a dignidade do humano, devemos pensar como as pessoas chegam lá. O ser humano abaixo da linha da dignidade - a exemplo do "muçulmano" do campo de concentração - é produto de um experimento biopolítico que estamos construindo. Não é por acaso que são as fatias verdadeiramente a-bandonadas que sofrem do crack em maior intensidade. São, por exemplo, os moradores de rua, paupérrimos, miseráveis, famintos, com frio. Usam a droga para sobreviver como os zumbis dos campos.
Da forma como é construída, a campanha é tão imbecil que é capaz de ter efeito reverso. Adota um enfoque moralista e uma posição besta. Faz parecer que o crack pode ser usado pelo senhor de bigodes e gravata que lê a sua ZH todos os dias de manhã, enquanto passa a manteiga no pão e toma café preto. Relatos de crack na classe média ou na elite são puro pânico moral. Existem. Mas são bastante reduzidos. O crack - que é uma droga-lixo --, é algo bem mais típico da população marginal, da vida nua. O "senhor" lê: "Crack, nem pensar". Aí ele pensa: "ah, bom, fiz a minha parte, não uso crack". E pronto, não? Como é que temos tanta burrice entre nós? Que tal ele pensar sobre como a nossa biopolítica que "desperdiça vidas" (expressão ótima de Bauman) é capaz de produzir esse resultado final, esses zumbis ambulantes que vemos transitar pelas sinaleiras? E o quanto ele - cidadão de bem - contribui para tudo isso sublinhando o contraste que o separa da vida nua e o faz se arrastar na sua mediocridade pequeno-burguesa?
Um jornal infame para um povo infame. Pelo menos o Juremir Machado da Silva - não por acaso expurgado do jornaleco - nos salva todos os dias (uma pena a política pré-histórica do Correio de fechar sua edição na net).
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