Mox in the Sky with Diamonds

segunda-feira, outubro 06, 2008

SOBRE AS ELEIÇÕES (I) - RIO DE JANEIRO - OU "HABERMAS É INGÊNUO, MAS MELHOR QUE NADA"

ACREDITO QUE JÜRGEN HABERMAS seja um filósofo poderoso, já tendo lido alguns trabalhos do professor aposentado de Frankfurt e constatado o vigor da sua teoria da ação comunicativa. De fato, parece que a angústia de Habermas sempre foi dar respostas para a reconstrução da democracia (ou da Modernidade) após as catástrofes da II Guerra Mundial, pretendendo dar uma resposta "positiva", em contraponto à do seu antecessor Theodor Adorno.
Depois de um tempo, no entanto, a teoria de Habermas começou a me parecer demasiado ingênua, incapaz de navegar na faticidade do real. É verdade que ele fala da "colonização do mundo da vida" e assim por diante, mas seu apego à dimensão "quase-transcendental" da linguagem, na "sinceridade" do ato de fala, recortando esse aspecto para formar uma nova metanarrativa dá um embrulho no estômago de qualquer foucauldiano. Não há mais retorno: entramos de vez na era da faticidade e é impossível isolar as relações sociais das relações de poder que as constituem. Acreditar em uma "situação ideal" é retornar à metafísica, no que concordariam pensadores tão distintos como Rorty e Foucault.
Por que eu falo de Habermas se o título se refere ao Rio de Janeiro e às eleições? Justamente para mostrar o porquê do raciocínio que se seguirá.
Contra as tendências iniciais, Gabeira passou Crivella e irá ao segundo turno com Eduardo Paes. Crivella representava o voto popular e evangélico; Paes é uma espécie de repetição do governador Sérgio Cabral em nível municipal (como ele, PMDB e portanto vinculado a Lula); Gabeira, por sua vez, optou por fazer alianças com a oposição e trazer uma plataforma de moralização. Crivella ficou, inesperadamente, de fora, o que para mim é bom pelo receio que tenho de relações Igreja/Estado que são tão indesejáveis, especialmente em se tratando de algumas igrejas. Ficaram Paes e Gabeira.
Como uma pessoa ainda ligeiramente inclinada para o PT, minha tendência seria ir para Paes. Mas não é. Creio que a plataforma de Gabeira é a mais desejável atualmente, apesar de algumas restrições. Por exemplo, por que ele, defensor histórico da descriminalização das drogas, resolveu mudar de idéia, sob o pretexto de combater corrupção policial? Esse salto conservador de Gabeira é perigoso, mas suas idéias -- que pareciam altamente improváveis aos olhos da grande mídia no início da campanha -- se vingarem, são boas.
O que Gabeira quer mexer, e é justamente por isso que mencionei Habermas, é na chamada "esfera pública". Ele quer estabelecer um novo tipo de relação, menos viciado e mais institucional, nas relações políticas. Isso é que precisamos. Eu já escrevi por aqui sobre o fracasso de Lula nesse aspecto. Essa plataforma é tudo que precisamos atualmente, já que, de resto, as coisas vão caminhando relativamente bem (com a ressalva da segurança pública, último nó a ser destrinchado). Precisamos agora apostar em uma democracia mais sólida, menos poluída por interesses espúrios e em uma administração pública mais eficiente e profissional. É hora de acabar com os cabides de empregos partidários e consolidar uma política mais habermasiana, mais "limpa" de interesses.
Apesar de apoiado por partidos de centro-direita (PPS e PSDB) e até extrema direita (DEM), acredito que Gabeira é a melhor aposta a ser feita no Rio de Janeiro. Como já escrevo há muitos anos que PT e PSDB, que detêm os melhores quadros eleitorais do Brasil, deveriam se unir temporiamente para "limpar" a esfera pública dos partidos sanguessugas. Se bem que, de lá para cá, alguma coisa mudou (o DEM está mais ideológico e o PMDB parece querer formar aliança para criar dois blocos, PT/PMDB X PSDB/DEM. Em todo caso, o raciocínio continua válido se pensarmos menos nas siglas e mais em coronéis e oligarquias).
Enfim, ruim com Habermas, pior sem ele. No RJ, apesar de estar com a direita, votaria em Gabeira porque acho que está com ele a esperança de desembaçar um pouco a esfera pública carioca - e essa aposta na democracia, por si só, já vale.

Marcadores: ,