Mox in the Sky with Diamonds

terça-feira, janeiro 24, 2006

E da podridão só coisa podre pode vir
Pra quem já perdeu esperanças no Governo Lula, resta lembrar que José Serra, o tucano que quer a Presidência, deixa na Prefeitura de São Paulo Gilberto Kassab, político fisiologista do PFL com envolvimento na gestão Pitta e suspeita de enriquecimento ilícito.
Para lembrar realmente qual é a pior das corjas nacionais.

Equívoco esquerdista
Aqueles que desenham alternativas macroeconômicas para o Brasil com desenvolvimento produtivo, trabalhismo, etc., como Mangabeira Unger, estão se negando a enxergar um palmo a sua frente. O capitalismo industrial morreu há algum tempo: vivemos o capitalismo financeiro e é com ele que temos que lidar. Não enxergar os efeitos da globalização irá levar todos os governos de esquerda a fracassarem.
Por isso, mais do que crescimento com empregos, o que precisamos é educação, integração comercial e transferência de renda. Nesse ponto, o Governo vem acertando, embora a área da educação ainda seja precária.

América vs. Brasil
Acho engraçado esses comunistas que falam mal dos EUA como se fossem a própria imagem do Satã.
Comparando a cultura liberal, democrática, plural e integracionista dos EUA com a clientelista, burocrática, neofascista, paternalista, corporativa e autoritária do Brasil, eles poderiam ver que estamos bem atrás dos caras da América do Norte. É verdade que existem conservadores terríveis, puritanismo ridículo, governantes sangüinários e corporações ladras nos EUA: no entanto, não cometeríamos o erro de dizer que todo brasileiro é como Severino Cavalcanti, Mão Santa, Paulo Maluf, o carinha da ENCOL ou Carlos Sperotto.

Porto Alegre é um Ovo
Porto Alegre é uma província. E, no entanto, os gaúchos acham que é a melhor coisa do mundo. Normal. Quando falamos com alguém do interiorzão, essa pessoa normalmente manifesta vontade de voltar para a "tranqüilidade" da sua cidade natal. É a mesma coisa.
Por outro lado, acho lamentável o estado atual da cultura gaúcha: um rancho neoconservador, repressivo, podre, egoísta e moralista-de-calça-curta. Quem lê o mínimo de Zero Hora, nossa principal jornal, conhece os médicos, jornalistas, juristas e outros que alimentam esse senso comum classe média lastimável, que nos fez ter a vergonha de ostentar a maior votação contra o desarmamento no país. E com orgulho. Argh.

Emergência fabricada
É lastimável que Lula esteja apelando para esquemas eleitoreiros de quinta categoria, como essa tal "operação tapa-buraco". É evidente que a "emergência" para tapar os buracos nas estradas é apenas "emergência fabricada", pois eles estão aí há horas e nada se fez. Desse saldo de burla à Lei de Licitações devem sair novos Marcos Valérios e Dudas Mendonças.

Ninguém tem o olho de Deus
Não me considero mais um defensor unilateral do PT, embora minha tendência seja votar em todos os seus candidatos, ressalvada alguma figura espetacular que possa surgir, o que, no quadro atual, é bastante improvável. O que eu não aceito é se colocar em uma posição quase-anarquista, alheia à política como se ela não fosse necessária para se construir esse país. É preciso se posicionar em algum lugar, porque ninguém tem o olho de Deus para enxergar acima das perspectivas. O que existe é, tão-somente, um choque de perspectivas. Até porque nem o anarquismo é uma boa alternativa.
Da minha parte, tenho sustentado que, apesar dos pesares, a melhor alternativa para a política brasileira seria uma aliança estilo "Concertação" do PT com PSDB, construindo um programa de centro-esquerda liberal que, inevitavelmente, iria cooptar o PMDB e, com isso, seriam isolados os partidos de extrema direita (PP, PFL) e fisiológicos (PTB, PL) - vulgo "atraso". As próprias bandeiras defendidas por esses governos, como austeridade fiscal, equilíbrio econômico, políticas sociais compensatórias e de transferência de renda, com um reforço nas áreas de educação e saúde, combinadas com a política internacional agressiva que vem sendo feita, poderiam desenhar um quadro político mais alentador no nosso país.
No entanto, estamos submetidos aos humores das "damas" de São Paulo.

Quando as máscaras caem
Delúbio, Marcos Valério, Duda Mendonça e Silvinho Pereira trouxeram uma boa lição a nós, petistas. Devemos parar de encarar a política como se fosse futebol e a defender nosso "time" de tudo e todos. Existem certas condutas que são injustificáveis e defendê-las não irá contribuir em nada para o PT crescer, mas exatamente o oposto. Fundos de pensão, fraude em licitações, superfaturamento de contas, uso de verbas públicas do BB, "mensalão" - tudo isso é indefensável e os petistas fazem bem em fazer mea culpa. Quando a questão desborda para o fanatismo, o que temos não é democracia, mas fascismo.
A filósofa política Chantal Mouffe, belga, definiu que a essência da democracia é a relação institucionalizada de conflito com o "adversário", transformando a noção de "inimigo" do nazista Carl Schmitt. A democracia é um constante embate, mas é preciso que estejamos sempre cientes que não lidamos com "inimigos", mas com "adversários", sob pena de desemborcamos no fanatismo, onde tudo é justificável. Quando os fins justificam os meios, as piores tragédias da humanidade costumam aparecer.

By the way
A alternativa "PT-PSDB" não foi inventada por mim. O ministro Palocci e alguns outros defendiam essa alternativa, que foi imediatamente rechaçada pelo stalinista Dirceu, certamente na esperança de que o PT enterraria todos os seus adversários e governaria o país por muito tempo, nos moldes do PRI (México).

PT-Rolim, PT-Rolim
Se eu pudesse escolher um político para servir de modelo ao PT, escolheria Marcos Rolim. Ninguém está tão por dentro dos assuntos fundamentais para o país, entre eles o respeito aos direitos humanos, que, ao final, abrange tudo.
O idealismo de Rolim, as bandeiras corretas que defende, o seu desprendimento do Pensamento (coisa que Tarso Genro ainda não conseguiu se livrar, que o diga seu último texto sobre socialismo e democracia), sua honestidade, tudo isso faz com que ele me pareça o verdadeiro e bom PT. Mais Rolims, menos Genoínos, Delúbios e Rossetos.

A primeira reforma
Se um dia essa aliança for concretizada, poderemos ter a primeira medida necessária para que o Brasil efetivamente saiba usar o dinheiro dos nossos impostos: reforma administrativa. Eu não quero dizer, com isso, que tenhamos que mudar a Constituição ou coisa do gênero: o Governo precisa, simplesmente, fazer a máquina funcionar. Demitir aspones, extinguir órgãos desnecessários, diminuir o seu tamanho e remunerar melhor quem ficar. Além de investir em fiscalização.
Sem uma máquina pública que funcione mais azeitada, sem tantos vagabundos-veteranos e figurinhas do partido empregados em cargos sem função alguma, poderíamos ver a cor do nosso dinheiro que paga impostos. O Ministério Público daqui do RS, por sinal, teve uma idéia interessante: fazer avaliações anuais da eficiência do servidor. Nada mais justo. Entretanto, é provável que o lobby corporativo prevaleça e a iniciativa seja afundada, em prol da uma estabilidade que mascara a proteção de vagabundos, ao contrário do seu verdadeiro teor, que é o de garantir ao servidor que não será demitido por pressão política ou redução de despesas.
Sem isso, nada vai funcionar.

Cotas
Existe um argumento muito relevante contra as cotas. Ele é de Paulo Ghiraldelli Jr. Diz Paulo que precisamos de mais liberalismo na nossa cultura, que o Brasil é formado por malhas corporativas neofascistas e somente uma liberalização nos tiraria dessa situação. As cotas, como tal, se apresentam como mais uma malha corporativa que só tende a recrudescer a situação atual do país. Concordo com quase tudo.
Mas devemos nos atentar - quando falei de Manderlay, escrevi sobre isso - que as cotas são uma forma de correção inventada pelo próprio liberalismo, ao perceber que tão-somente trabalho e liberdade não são suficientes para libertar o indivíduo das estruturas em que vive. Temos, então, Foucault contra Rorty e, aqui, fico com Foucault.

Inclusão dos gays
Faço várias piadas sobre viadagem e tal por aqui. No entanto, uma coisa tem que ficar clara: sou contra toda e qualquer restrição, jurídica ou moral, que se possa fazer contra um homossexual. Para mim, eles deveriam ter exatamente os mesmos direitos dos hetero, inclusive casar, adotar filhos e receber respaldo nos livros escolares como um união normal.
É com uma certa felicidade, por isso, que vejo o western gay de Ang Lee vencer o Globo de Ouro esse ano. Não sei se verei, reconheço minha limitação e meu preconceito. No entanto, fico feliz porque, aos poucos, vamos rompendo as barreiras dos nossos próprios preconceitos e ignorância, ampliando as fronteiras para os diferentes. Meu único princípio moral é evitar o sofrimento, de quem quer que seja. O acolhimento, a hospitalidade de que fala Jacques Derrida ou o Rosto de Lévinas, é o princípio fundamental da moral, muito além de regras específicas inventadas por paspalhos recalcados. O filme de Ang Lee é um tiro no pé dos machões americanos, visto que é do gênero mais conservador de todos, o western. Aos poucos, eles (gays) vão ganhando a batalha. Ainda bem.

E, claro, sobre música
Enquanto escrevo essas linhas, ouço os discos "The Software Slump", do magnífico Grandaddy, e "Out of Season", da linda-linda-linda Beth Gibbons. A beleza dela, é claro, emana de dentro, do seu estado de espírito, do seu talento, da sua espontaneidade.
O Grandaddy, até "Sumday" (2003), usava micro-efeitos robotizados que serviam de pano de fundo para baladões acústicos, parecendo, mesmo, uma espécie de encontro homem-máquina semelhante ao Radiohead. Beth Gibbons, a lendária vocalista do Portishead [entrem no site, bacana], deixou um grande disco solo em 2003, sem as pirotecnias jazz-triphop-clássico-rock-músicadecabaré da banda de origem, mas cheio da sua magia vocal, da sua emoção ao cantar, da sua voz incrível, do seu ar depressivo e definitivo. "Funny time of year", por si só, já vale o disco. Até deu vontade de acender um cigarro.

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Quando o negócio se torna inexplicável
Como é que eu vou explicar para as pessoas por que gosto das microfonias do Sonic Youth, das paredes de guitarras do My Bloody Valentine, das aventuras rítmicas do Mogwai ou dos riffs estridentes do Raveonettes, se o negócio exige uma "adaptação" do ouvido? Só muito treino permite apreciar essas belezas quase "proibidas". Como um ilha deserta escondida, acessível para poucos.
Nos últimos tempos, as duas bandas mais esquisitas que escutei foram o Wolf Eyes, uma espécie de mostruosidade barulhística, muito mais pesada que Trash Metal sem usar qualquer um dos seus recursos (guitarras pesadas, uivos, solos, bateria alta); e o Liars, uma versão mais suja, livre e pesada do The Rapture, mezzo dançante, mezzo pauleira-suja-garageira.
Trilha sonora do post: Flaming Lips, "Placebo headwound".