Mox in the Sky with Diamonds

segunda-feira, janeiro 11, 2010

EXAGERO?

Acho interessante as pessoas "equilibradas" e "conciliadoras" que acusam um exagero nas afirmações -- minhas e de outros -- de que o estado de exceção é a regra. Para eles, isso significa desacreditar uma democracia recém conquistada, o sufrágio popular, as garantias da Constituição de 88 e, em essência, a própria possibilidade do discurso jurídico. Ora, pois, é isso mesmo. Poderia dar mil exemplos.
O Prof. Jacinto Coutinho -- que me deu a honra de estar na minha banca e a quem admiro -- recentemente concedeu entrevista dizendo assim: "Estamos reclamando de que se tem punido os pobres sem cumprir a Constituição. Vamos punir os ricos sem cumprir a Constituição? Não tem sentido". O que o Prof. Jacinto sabe e não disse, provavelmente por se considerar com a responsabilidade de não desacreditar o que considera um progresso (o novo CPP e a própria Constituição) é que toda polêmica que rondou os meios jurídico-penais nos últimos anos -- e mais especificamente desde o caso Dantas -- é que o que está em jogo na disputa esquerda punitiva (ou "garantistas integrais") X garantistas ("clássicos"?) é precisamente o estado de exceção em que vivemos.
Enquanto discutimos se existe uma obrigação constitucional de punir ou se as garantias são limitação do poder punitivo, este se exerce indiferente ao Direito. É mais antigo e sua raiz não vem do contrato social, mas do poder de vida e morte do soberano sobre a vida nua. A polícia -- e aqui toda polêmica em torno da polícia federal -- é precisamente o limiar em que se exerce concretamente. Toda discussão - prestem atenção! -- gira em torno do arbítrio do Estado que é a regra, e não a exceção. E se isso deve ser estendido aos ricos, ou ficar apenas restrito aos pobres.
Mas... espera aí. Não era o arbítrio um exceção casual de um sistema que funciona conforme o Direito? Se isso fosse verdade, não estaríamos discutindo se o estado de exceção deve cair ou não sobre os ricos. Porque ele é a única realidade. O próprio "Estado de Direito" não é senão um simulacro de relações de poder (para os ricos) e, em poucos casos, um grito desesperado que é "estado de exceção tornado real" (como dizia Benjamin) em casos de juízes que interrompem o poder punitivo para os marginais (por exemplo, no Direito Alternativo). Exagero?
Enquanto os garantistas discutem o assunto no nível jurídico, estão permanentemente perdendo a guerra que está em andamento, pois formalizam o que não é formalizável, antes legitima a forma. Por outro lado, quando a "esquerda punitiva" igualmente formaliza o tema, tratando-o com o discurso da igualdade, "proteção da insuficiência" ou levando para o nível dos direitos humanos (no caso da tortura), está sendo "ingênua" e destrutiva, pois invoca precisamente a máquina que faz funcionar a "Colônia Penal" desconhecendo que seu problema não é a má utilização, mas sua pura e simples existência. O problema do discurso jurídico é sempre tornar oblíquo - só afirmar pela via da negação - aquilo que é realmente o nervo do problema.
Em suma, o Direito presume alucinatoriamente que o não-Direito não existe, o que um simples olhar para a realidade desmente imediatamente.

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