Mox in the Sky with Diamonds

quarta-feira, maio 13, 2009

CORRUPÇÃO NÃO É A QUESTÃO CENTRAL

You look so tired-unhappy,
bring down the government,
they don't, they don't speak for us.
(Radiohead, "No Surprises").

A NUDEZ EXPOSTA da Dama de Ferro (graças a Deus, isso é só uma metáfora, ok?) e seus vínculos visivelmente imersos na lama da corrupção, a mesma que atingiu o PT há alguns anos atrás, mostra os limites do discurso moralista que inunda nossos periódicos de direita e esquerda e coloca gasolina na locomotiva que move o circo coletivo. Trocam-os os narizes de palhaço, as perucas, as fantasias, mas a piada é sempre a mesma e, enquanto a platéia mastiga milho e pipoca, a escória morre como vida exposta que é.
A imprensa marrom que faz a cobertura mais chapa-branca já vista antes era a própria fogueira da inquisição. Blogs de esquerda agora assumem essa posição. A disputa por quem é corrupto não tem vencedores. Todos chafurdam na mesma lama, sujos de merda até o último fio de cabelo, mas loucos para atirar no adversário como se o mundo tivesse começado ontem. A briga explícita pelo troféu do mais puro é, na sua concretude asfixiante, a briga pelo mais cínico. Argumentos se viram de cabeça para baixo e ricocheteiam. O palco muda a toda hora os atores, mas a peça é a mesma. Os feios viram bonitos, os bonitos feios, e assim por diante, como se não existisse nada a não ser a roda girando enquanto a platéia, entorpecida pelo lixo discursivo das falas do narrador e dos atores, só consegue vaiar ou aplaudir. Platéia que vaia o lixo mas está com a roupa de baixo suja de cocô. Todos no mesmo barco. E vaiar, que adianta?
E então? É só para dizer que a luta contra a corrupção não é uma verdadeira bandeira de esquerda. A moralização da política, típica da extrema esquerda atual (como vem anotando o Idelber Avelar), é uma plataforma pífia e não ataca os dilemas fundamentais do nosso tempo. Apenas troca os palhaços de lugar. A discurso vestal-quaker que aperta os nós das gravatas dos moralistas é repetido por bocas que se consideram revolucionárias. Juntos, Heloísa Helena e Lasier Martins. Entoando o cântico da moralidade e da pureza. Do cidadão de bem.
Os campos políticos não se definem pela corrupção, mas pelas suas posições de base. A corrupção é apenas o que revela, certas vezes, como se constróem esses campos. As forças políticas (e midiáticas) reproduzem sua ideologia na adesão ao lado defesa/acusação diante da corrupção. Permanecem intactas, alheias ao fato. A moralista ZH se transforma em suspeitosa quando seu aliado é atacado. Tudo permanece a mesma coisa. Mas o silêncio da esquerda -- da corrente que deveria se ocupar do oprimido e do marginal -- tem efeitos reais. Enquanto o circo se desenrola, a vida nua definha. Ficamos discutindo a pauta dos engravatados enquanto o Outro morre na rua.
Já li alguma coisa escrita sobre corrupção na Alemanha, Inglaterra, EUA. São países com alto grau de corrupção, mas as nossas cabecinhas colonizadas acham que são uma maravilha. É que eles não são tão burros a ponto de associar "alemão = ladrão" se um político rouba. Nós é que nos atribuímos esse estereótipo. Blogs de "mídia crítica" se transformam em moralistinhas policialescos que, nas poucas vezes em que saem da piadinha e se propõem análise séria, mostram o ridículo de parecer Rogério Mendelski. O que discussão sobre a corrupção esconde é a própria corrupção da política - quando esta não se propõe mais a discutir a felicidade humana, mas apenas a sua própria decadência e deterioração. Essa discussão pequena e imanente é que a que a nossa mídia autômata propõe como pauta única. Porque, discutindo essas minúcias, não discutimos o que realmente importa: o mundo cai e se desfigura sobre a nossa cabeça sem que possamos reagir. Os palhaços agradecem.

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