Mox in the Sky with Diamonds

segunda-feira, fevereiro 18, 2008

CONTINUA A POLÊMICA DOS ADOLESCENTES PESQUISADOS

Leio no blog Notícias da Corte, que tem ótimos artigos, mais uma manifestação sobre a pesquisa a ser realizada na PUCRS em adolescentes infratores, visando a identificar raízes neurológicas para os delitos.
Como a coluna do Hélio Schwartzman, que referi por aqui esses dias, é bem articulada e não simplifica o tema. No entanto, permanece presa no paradigma etiológico.
É preciso ver que aqueles que discorreram sobre o crime, até a década de 60, percorreram diversos caminhos em torno da pergunta: "o que torna o criminoso um criminoso?" Ou, em outros termos: qual é a causa do delito?
Percorreu-se, dali em diante, variados caminhos, que passaram por causas antropológicas [à moda da antropologia do século XIX, por todos, Cesare Lombroso], sociologia, psicologia, psicanálise, economia, biologia, etc. Até se descobrir o óbvio: o crime é um fenômeno multifatorial, ou seja, inúmeras "causas" determinam o delito. É a resposta-limite que se pode chegar diante da pergunta.
O que mudou realmente, diante do caráter supérfluo da pergunta, foi efetivamente o paradigma de investigação: quer dizer, depois do labelling approach, que inicia na década de 60 com obras de gente como Howard Becker, Erwin Goffman e Harold Garfinkel, a pergunta pela "causa" do delito passa a ser superficial, porque se descobre que o delito é praticado pela maioria das pessoas, mas punidos são apenas alguns. Não é possível, assim, atrelar natureza ["causa"] a um fenômeno social contingente, como a punição. Descobre-se que o criminoso é uma figura comum [como escrevi aqui, basta pensar em abortos, sonegação fiscal, violência familiar, receptação], e que a figura "pesquisada" por toda criminologia etiológica [que David Garland chama, com propriedade, de "The Lombrosian Project"] é, na realidade, o criminalizado, aquele que, por questão de estereótipos e decisões burocrático/sociais, caiu nas malhas do sistema penal.
O problema não está, portanto, em quais são as causas do delito. Não dá para estabelecer a disputa entre "causas biológicas" contra "causas sociais". Essa é uma disputa dentro do paradigma etiológico. É como fazer pesquisas na física com base na física aristotélica. Não se trata de contrapor causas, tornando a disputa ideológica, mas de um recuo de paradigma, o que é gravíssimo de um ponto de vista epistemológico.
Assim, para quem já deu o giro epistemológico, olhar para a pesquisa, desde o ponto de vista do paradigma da reação social, significa, em outros termos, analisar o estudo como uma contribuição para a estigmatização dos adolescentes pesquisados.
Por isso, ela esbarra em imperativos éticos -- entre eles o principal de todos: a não-violência em relação ao Outro, ao diferente.

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