NIETZSCHE, HOJE
Estávamos sentados enquanto ele tocava um órgão gigante, de vez em quando passando o dedo por uma ou outra tecla enquanto aquele som infernal MIDI atolava nossos ouvidos. Falava de drogas, dos nossos adolescentes perdidos na balada, da fé em Jesus, sorria aos clientes do restaurante, cantalorava músicas antigas. Ele tem respostas para tudo. Ele vive uma vida inquestionável.
Nietzsche foi o primeiro a ter coragem de enfrentar isso de frente: foi o primeiro a recusar a "moralina", combustível dos melhoradores da humanidade. Já enfrentei por aqui os limites da libertação nietzschiana e a necessidade de fixarmos um novo padrão de moralidade, baseados na transcendência do Outro, sem qualquer apoio metafísico ou teológico. Mas o discurso de Frederico teima em ser atual: os moralistas continuam na linha de frente.
Eles nos governam. Eles -- "essas pessoas da sala de jantar". Enquanto sentia vontade de rir pelo ridículo do nosso tocador de órgão, sentia também um profundo mal-estar: seria cômico, se não fosse trágico.
Resta-nos cantar com Caetano:
Eles (Caetano Veloso/Gilberto Gil)Em volta da mesaLonge do quintalA vida começaNo ponto finalEles têm certezaDo bem e do malFalam com franquezaDo bem e do malCrêem na existência do bem e do malO florão da AméricaO bem e o malSó dizem o que dizemO bem e o malAlegres ou tristesSão todos felizes durante o NatalO bem e o malTêm medo da maçãA sombra do arvoredoO dia de amanhãEis que eles sabem o dia de amanhãEles sempre falam num dia de amanhãEles têm cuidado com o dia de amanhãEles cantam os hinos no dia de amanhãEles tomam bonde no dia de amanhãEles amam os filhos no dia de amanhãTomam táxi no dia de amanhãÉ que eles têm medo do dia de amanhãEles aconselham o dia de amanhãEles desde já querem ter guardadoTodo o seu passado no dia de amanhãNão preferem São Paulo, nem o Rio de JaneiroApenas tem medo de morrer sem dinheiroEles choram sábados pelo ano inteiroE há só um galo em cada galinheiroE mais vale aquele que acorda cedoE farinha pouca, meu pirão primeiroE na mesma boca senti o mesmo beijoE não há amor como o primeiro amorComo primeiro amorQue é puro e verdadeiroE não há segredoE a vida é assim mesmoE pior a emenda que o sonetoEstá sempre à esquerda a porta do banheiroE certa gente se conhece no cheiroEm volta da mesaLonge da maçãDurante o NatalEles guardam dinheiroO bem e o mal
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