Mox in the Sky with Diamonds

sábado, setembro 19, 2009

RS NO FUNDO DO POÇO




A TAL "SEMANA FARROUPILHA" nos dá chance de ver um fato tão escancarado que sua negação desesperada é puro sintoma da sua verdade: o afundamento abissal da imagem tradicional do Rio Grande do Sul.
Há pouco tempo atrás, os EUA mergulharam profundamente em um processo de declínio que envolveu, entre outras coisas, políticas baseadas no fanatismo religioso e uso de estratégias totalitárias na violência pública (tortura, campos de concentração, invasões de países, etc.). Foi um processo longo e gradativo iniciado por Ronald Reagan que possibilitou a ascensão do neoconservadorismo na sociedade, jogando a cultura liberal norte-americana no lixo. O que começara com a estratégia do grande encarceramento, do recuo do Welfare State e avanço do Estado Penal, da conjunção de fatores que abrangeram a "disciplina dos pobres" (o "pensamento" Manhattan) e o populismo penal - tolerando até esquizofrênicas teses de que é melhor, para distribuir os impostos, reduzir para os ricos do que ceder aos pobres ou de que a história teria chegado ao "fim" -, deságua numa melancólica "Guerra ao Terror", sem alvo claro, sem princípios, sendo ela própria terror, com práticas que colidem com valores compartilhados por grande parte da sociedade norte-americana. É como se fosse um gradual processo de radicalização à direita que começa tímida e vai até o limite. Foi justamente esse processo que possibilitou a eleição de um liberal clássico como Obama, diante de um ambiente saturado de conservadorismo que chegou ao seu limite e transbordou.
Parece que o RS vive processo semelhante. A sectarização do debate público que inicia no Governo Britto e recrudesce no Governo Olívio parece ter atingido o ponto máximo. A fúria antipetista - que está ancestralmente arraigada ao anticomunismo simpático à ditadura militar -- consolida seu ambiente no Estado até sufocar a esquerda e impossibilitar o crescimento dos seus eleitores. (O PT gaúcho, por óbvio, não é inocente nesse processo: que o digam erros crassos como a filiação de Dilma Rouseff e Sereno Chaise durante o Governo sem restituição dos cargos ao PDT, perdendo o aliado estratégico que possibilitou a eleição e possibilitaria o Governo.) O processo -- que conta com o auxílio do jornalismo marrom que povoa as páginas do Grupo RBS -- gradualmente vai tomando o tecido social com um manto de ódio e conservadorismo até desembocar no seu produto derradeiro: o Governo Yeda Crusius.
Ao contrário do discurso da mídia oficial, que teima em pintar as coisas como um conflito entre sectários, trata-se da gradual hegemonia de um discurso tipicamente ideológico cujo único mote é o ódio ao petismo (descendente do "comunismo"). Se a tese da mídia marrom estivesse correta, o processo deveria ter suavizado com o "pacificador" Germano Rigotto, o que não aconteceu, uma vez que o resultado da eleição de 2006 é um segundo turno em que o principal objetivo é ver o PT fora, depositando-se "voto útil" em Yeda (o que gerou o efeito colateral da sua eleição). O sectarismo antipetista, no episódio que chamei por aqui de "morte da política no RS", acreditou que poderia derrotar esmagadoramente o terço cativo da esquerda que é o piso do PT, levando dois candidatos da direita para o segundo turno. Ou seja: trata-se de um momento de auge -- em que o moralista gaúcho invoca o "mensalão" e a "companheirada" de Lula -- para esmagar o adversário da esquerda. Por um erro de cálculo, o candidato Germano Rigotto acaba não passando para o segundo turno e isso resulta na eleição de Yeda Crusius.
Esse processo de radical antipetismo encontra agora, tal como o neoconservadorismo de George W. Bush, seu momento de exacerbação e, por isso, declínio em face do transbordamento. O Governo Yeda Crusius leva a cabo políticas visivelmente fascistas que envolvem arbitrariedade policial explícita, repressão violenta a greves, movimentos sociais e até a passeatas tipicamente políticas contra seu governo. Ao mesmo tempo, afunda na lama junto com parte da elite política do RS que comandou o Estado nos últimos 15 anos, usando estratégias vergonhosas e espúrias a olho nu (por exemplo, ter como "capitães" na Assembléia um deputado com a função de relator da CPI que afirma a única missão de impedir seu acontecimento; ou outro cuja única estratégia é gritar e intimidar seus adversários, como, aliás, é típico dos fascistas em todos os lugadores). A própria Governadora está visivelmente envolvida e só piora a cada dia sua situação. Suas intervenções são sempre lamentáveis e não raro indicam -- tal como ocorria com Bush -- perturbação psíquica.
O desespero tem levado o jornalismo marrom do Grupo RBS a usar táticas diversionistas (tão engraçadas - e trágicas - quanto as de Flávio Obino sua Presidência do Grêmio) ou estigmatizadoras (acusando a oposição de "radicalismo" ou "politização"; ou os manifestantes de "vândalos" ou "sindicalistas") em um nível a tal ponto ridículo que mesmo aqueles ingênuos que não percebiam as mentiras e desvios agora vêem claramente. Semelhante a Bush nos EUA e a manipulação midiática pornográfica na Guerra ao Iraque, as coisas aqui -- com a ajuda da Internet -- vão se tornando tão transparentes que, mesmo tentando desesperadamente, a mídia marrom não consegue mais segurar o rojão.
Esse RS - chafurdando na lama -- agora comemora suas festas típicas com a sensação de completa desmoralização; os "cidadãos de bem" mostram suas faces de canalhas e picaretas que, enquanto pregavam suas ideologias sujas, apropriavam-se do dinheiro dos cofres públicos. Toda mitologia em torno da "honestidade do gaúcho" ou do "aqui é diferente" caiu no riso. A Semana Farroupilha é a semana de um Estado em frangalhos, desmoralizado por um processo de crescimento do pensamento fascista e autoritário que redundou no pior Governo dos últimos tempos, comparável apenas aos irmãos do Norte. Certamente o copo do antipetismo que tolerava tudo que não fosse PT transborda quando mostra sua pior face. Tudo indica que a próxima eleição - para desespero do jornalismo marrom - será o momento de inversão na qual, como aconteceu nos EUA, avizinha-se uma mudança de rumos.

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