Mox in the Sky with Diamonds

quarta-feira, maio 20, 2009

POR QUE A EDUCAÇÃO NÃO FUNCIONA? (PARTE II)

VOLTO AO ASSUNTO. Você se lembra qual é a diferença entre angiospermas e gimnospermas? Sabe realizar um cálculo estequiométrico? Você saberia dizer a fórmula da quantidade de movimento? E algo da história contemporânea do Brasil, saberia me contar? Você conhece Dalton Trevisan? E a diferença entre a metafísica de Platão e a de Aristóteles, saberia me dizer qual é?
Bem, me parece que o terceiro problema, aliado aos baixos salários dos professores e à ética ultrapassada da sala de aula, é a opção curricular propriamente dita. O MEC parece querer mudar algo nesse sentido, mas aparentemente está atirando para todos os lados. A formação que tive no ensino médio foi tristemente técnica. Quer dizer: um punhado de informações sem conexões entre si, decoradas para preencher uma prova de marcar X. Os militares e a elite não têm interesse em uma formação humanista crítica e acabaram fortalecendo um ensino excessivamente apegado a detalhes, baseado na memorização e fortemente disciplinar. É verdade que a memorização, por exemplo, é necessária sob alguns aspectos. E também que o vestibular é melhor que nada; pelo menos faz alguma seleção. Porém é possível aprimorar infinitamente o sistema. Da forma como está colocado, é apenas uma máquina de fazer dinheiro para cursinhos pré-vestibular que formam autômatos repetindo fórmulas imbecis em forma de uma decoreba inútil. E pior: elitiza ao extremo as universidades. O que um garoto pobre da periferia, cheio de problemas em casa, sofrendo pressão racista e privação do bens que (na nossa sociedade de consumo) importam, pode querer com essa decoreba inútil? De que lhe adianta um saber completamente desconectado da vida? Ele vai abandonar o colégio e partir para outros meios. A elitilização vem da impossibilidade de pagar o cursinho idiota e, na outra mão, da inutilidade geral do conhecimento adquirido.
O MEC propôs algumas medidas interessantes, embora pareçam mais ou menos casuístas. Em todo caso, melhor que nada. Reintroduziu sociologia e filosofia no ensino médio, dividiu a grade curricular em quatro grandes áreas e propôs o ENEM como forma de seleção no lugar do vestibular. São medidas que, se bem implementadas, podem dar resultados bons. Se o professor de filosofia for igualzinho ao de química, no entanto, não vai adiantar muito. Se os professores não souberem conectar os saberes com a vida, a educação não pega. É preciso seduzir o aluno para o conteúdo. Da forma como estava, as escolas de ensino crítico acabam punidas porque seus alunos não sabem qual é o x correto na prova. A Veja adorava. Para ela (e para José Serra), o problema do ensino no Brasil é que o professor perde muito tempo falando de Paulo Freire e pouco fala de matemática e português. Isso não é só bobagem; é mentira. O que eles gostariam é de formar autômatos incapazes de questionar as estruturas sociais injustas que existem no Brasil e prontos para disputar a única coisa que importa: dinheiro.
Por fim: é preciso que o ensino, além de transdisciplinar, tenha o foco também no corpo. É preciso valorizar a educação física a partir de esportes, jogos, lazer. A escola deve ser também um espaço para catarse e sublimação dos adolescentes. Eles têm muita energia para descarregar e o esporte são espaço certo para isso. Parcerias com clubes de futebol e outros esportes poderiam ser frutíferas. Esportes e artes são possibilidades abertas para o Brasil. Por que, por exemplo, não mostrar a história da música para os pobres da favela que adoram hip hop? Talvez eles descubram coisas que nunca imaginaram -- por exemplo, que o rock é de origem negra. Que o jazz é algo sem limites. Pergunte a um aluno metido a "fodão" se ele consegue imitar o Jimmi Hendrix em "Purple Haze".
Mas temos que parar de falar em "inclusão social". Precisamos falar simplesmente de justiça. "Inclusão social" parece uma benevolência, um favor que "a sociedade" presta. Nada disso é verdade. Eles estão capturados fora, portanto "incluídos na sua exclusão", de forma que o que estamos fazendo é simplesmente aquilo que deve ser feito. Para usar a expressão de Bauman, precisamos parar de "desperdiçar vidas". Esse papo de inclusão é de um pietismo assustador. E nossos pobres não querem pietismo. Eles querem justiça. Eles são nietzschianos, muitas vezes ressentidos. Não suportam a compaixão e todo esse papo cristão. Precisamos também ser nietzschianos com eles. Sair da posição do "careta" ou do "carola" e falar a sua língua, entender seu mundo e oferecer aquilo que eles não vislumbram e a escola só mata: esperança.

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