PODER ECONÔMICO E DEMOCRACIA
PRESIDENTES DAS MAIORES potências do mundo se reuniram no G-20 para debater o que fazer em relação à "crise econômica". Todos receavam a reação do "mercado" às suas declarações e decisões e trataram de, ao final, realizar os desejos desse infantil-perverso que, em pouco tempo, já respondeu (subiram as bolsas). Ao mesmo tempo, a Polícia Federal deflagra investigação de gigantesco caixa 2 de empresa em relação a todos os partidos políticos, envolvendo, inclusive, a poderosa FIESP.
O que isso tudo nos diz?
Parece relativamente óbvio que o poder econômico mina a democracia. O Estado atualmente é refém do mercado. Mesmo o político mais poderoso do planeta, Barack Obama, não consegue implementar sua plataforma sem o aval do mercado. Mas o que é o "mercado"? Será algo invisível e neutro, como quer o pessoal do "Fórum da Liberdade"? Defitivamente não. O "mercado" nada mais é do que um conjunto de ultra-ricos que tem o poder de desestabilizar qualquer governo. Capazes de transformar algo muito claro -- a quebradeira de fundos podres que EVIDENTEMENTE iriam quebrar, e eram negócios de risco -- em "crise", impessoal, neutra, universal. Quando os mais ricos quebram, é preciso socorrê-los, do contrário seu poder é tão grande que podem destruir todo resto da pirâmide social.
É por essas e outras que os marxistas jamais acreditaram na democracia. Seu método materialista os levava a constatar que é o poder econômico, e não o político, que nos governa. Eu não chegaria a tanto. No entanto, me espanta a proximidade do materialismo e da faticidade.
O problema capital da filosofia política de tradição liberal do século XXI deve ser, necessariamente, como pode a democracia se afirmar sobre o mercado. Não estou falando de propostas mais ousadas, como as de Agamben ou Badiou. Mas, dentro da perspetiva de gente como Rawls, Habermas, Honneth, Taylor, Dworkin -- dentro desse quadro "reformista" da democracia -- é a tarefa fundamental pensar como pode a democracia não ser refém do mercado. Porque, se poucos são os ricos, e se eles têm o poder que têm, o poder democrático está comprometido. A democracia rigorosa, que dá a legitimidade ao seu representante pelo voto, perde esse caráter quando há uma bolsa de valores que pode -- sem a maioria - desestabilizar um representante legítimo. É uma lástima ver Obama, que foi eleito grandiosamente enfrentando o discurso conservador, refém do sistema financeiro -- dos humores da criança-perversa.
"Crise"? É uma nomenclatura bastante discutível. Os defensores do que estava aí dizem que os países "se aproveitaram" desse ciclo de crescimento e por isso é melhor não procurar culpados. Sonegam o fato de que esse modelo produziu também desemprego, pobreza e desigualdade em níveis escandalosos. Que tende a bipartir o mundo em vencedores e perdedores. Que, se o mundo "cresceu" (e houve avanços sociais), tudo poderia ser muito mais. A pergunta que esses economistas têm que responder é: "o que fazer com os perdedores?". Porque eles só pensam nos que vencem. Os que perdem eles delegam para nós, criminólogos.
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