Mox in the Sky with Diamonds

quinta-feira, outubro 09, 2008

POBRES EDUCADORES

A ASCENSÃO DO NEOLIBERALISMO na década de 80 nos países anglo-saxônicos do Atlântico Norte acabou criando mostrengos anexos à teologia do mercado que certamente levariam Adorno e outros frankfurtianos a dizer: "eu disse, eis a 'sociedade administrada'!". Um desses monstrengos é o que chamaria de atuarialismo, que poderia ser definido como a redução de problemas complexos a estatísticas e cálculos custo/benefício. Esse bicho estendeu-se da Criminologia à Educação, passando por várias áreas em entre elas.
Antes de tudo, deixo claro que nada tenho contra levantamentos estatísticos nem técnicas de gestão. Acho, aliás, que falta isso em muitas áreas -- sem dúvida a segurança pública é a mais urgente. O problema é que esse raciocínio "atuarial" acaba engolindo todo problema e lhe dando uma solução "cosmética", que não penetra na sua complexidade, muitas vezes transformando a realidade em um delírio (metafísico) que reduz tudo a números e percentuais.
Quando leio que a Secretaria da Educação de São Paulo - claramente identificada com a "educação atuarial" que orienta também o "especialista" da Veja sobre o tema - começa a contabilizar os 10 minutos de intervalo como tempo para correção de provas e elaboração de aulas, sinceramente, me dá vontade de chutar as paredes. Não é possível que o tempo de o professor fazer xixi, comer algo, beber água ou café e descansar a voz (como bem alertou o Cristovam Buarque) seja computado dessa forma. É ridículo. É o que acontece quando entregamos para burocratas a "gestão" da educação. Eles só olham para os números e a "gestão" melhor do tempo, sem se dar conta das necessidades humanas de cada um. Tudo isso é ridículo demais.
A prioridade hoje em dia deve ser investir no professor, no educador. O professor precisa começar a ter auto-estima alta, a ser importante socialmente, a ser reconhecido. Para isso, precisa, para abrirmos a discussão, ganhar mais. Não tem meio termo, consertos provisórios, sem mudar isso. Com os salários atuais os profissionais mais qualificados deslocam-se para áreas mais bem remuneradas e ficam apenas os mais fracos e os engajados na educação. É preciso tornar a profissão atrativa. É preciso dar o recado aos educadores: vocês são importantes para nós. Isso só se faz dando boas condições de trabalho: aumento de salário, valorização das horas-extras (preparação de aulas, correção de provas), ambiente adequado. Não adianta os bombardear com cursos de "motivação"; a motivação só ocorre se houver um suporte adequado, senão é dopping. O professor precisa de dinheiro para ir ao cinema, ao teatro, comprar livros e revistas e vestir-se dignamente.
A elite brasileira hipócrita aposta tudo na educação no discurso, criticando programas de transferência de renda, mas não move uma palha para consertar o desastre que vivemos na remuneração dos professores. Há até os burocratas da educação atuarial querendo mostrar que a questão nada tem a ver com salário. Para eles, a educação nada tem a ver com pessoas, e sim com números. Pura "alucinação", porém geralmente mal-intencionada. O primeiro passo para não mais usarmos a expressão "pobres educadores" é não deixar os educadores pobres.
Prosseguirei sobre o tema da educação (meu trabalho, por sinal) em outros posts.

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