EASY BABY
AS COISAS são bem mais simples do que parecem. A procura de fórmulas, o abuso dos estereótipos, a procura de identidades que não são nossas, o afogamento no desespero do cotidiano sem sentido, a angústia do passar do tempo, as ideologias espúrias que penetram em inocentes revistas de comportamento, os "especialistas", o imperativo categórico sadiano -- todo esse imbróglio de pornografia, serialização, doping e estupidez só faz as coisas se tornarem mais confusas.
Os sobreviventes de 68 se tornaram pessoas paranóicas, repletas de um vazio cujo preenchimento nunca se dará, porque ele não se dá por fórmulas. O mundo das representações polui de tal forma que a "performance" é a única coisa que se preocupar. Nos transformamos em puras imagens, feitas de um frágil cristal, prontas para se afogarem no abismo do desespero e cinismo a qualquer momento. O espetáculo entra em nós mesmos.
Até mesmo as coisas mais simples - a experimentação do sexo, por exemplo - se tornaram coisas complexas. Nós (homens) temos coisas para aprender, mas não por meio de uma chantagem "Masters e Johnson" de mulheres super-fálicas que querem nos comer. Desculpem, enfiem esse negócio em outra pessoa. Nós queremos o sexo para gozar, gozar junto, mas gozar, não para rezar uma cartilha de "como enlouquecer" a parceira. Joguem as cartilhas no lixo; suas profanações são artificiais e vazias. Não queremos ser "avaliados"; queremos transar e pronto, porra. Nem todos queremos algemas, nem todos achamos essas porcarias artificiais excitantes. Não aceitamos que nossa vida sexual seja tratada como "vida sexual", essa que os especialistas falam (pautada, agendada, regrada): esta nada mais que a representação performática do que o processo da vida real do sexo é.
Foucault era mesmo genial: Sade é só um moralistinha que não nos interessa.
Fico pensando nisso quando leio Longe Demais e Chata de Galochas escrevendo sobre a mesma coisa: o profano não é mais profano, foi apropriado pelos dispositivos. Essa visão formulaica de sexo e relacionamento impede a VIDA REAL de correr. A religião dos nossos dias absorve sua profanação, como se fosse um buraco negro. O sexo hoje - sexo dos orgasmos planejados, dos atletas sexuais, da pornografia, dos corpos malhados, do "ponto G" e do "Kama Sutra", da velha feia que ensina na tevê como se enfia um vibrador no cu, do narciso que só faz em frente ao espelho, da frígida que culpa o parceiro por não conseguir gozar, do inseguro que só faz o procedimento "padrão" tal como aprendeu nos filmes da Silvia Saint, do ejaculador precoce - todo esse sexo pertence ao dispositivo que Foucault descobriu nos anos 70. É a mesma síndrome da incapacidade do relacionamento autêntico, da fixação na "performance" que anula a própria singularidade do Outro, é o mesmo domínio-padrão do sexo papai-e-mamãe-durante-o-casamento com sinal invertido.
Que fique de lição: não existe "vida sexual". Existe a vida e pronto; sexo é bom e está dentro dela.