Mox in the Sky with Diamonds

segunda-feira, setembro 21, 2009

A BELEZA DO PÓS-ROCK

NÃO GOSTO DE ESCREVER sobre mim. Não gosto, em geral. Geralmente me arrependo do que escrevi. Além disso, desde que criei meu primeiro blog - acho que em 2003 - sempre o fiz com a proposta de escrever nada sobre mim ou minha vida. Vez que outra deixo resvalar algo. Hoje, confesso que uma das coisas que mais me importunam na vida é meu temperamento depressivo. Em determinados momentos - mesmo sem causa aparente - sinto uma sensação de esmagadora impotência que me conduz a uma espécie de desespero existencial, jogando-me na apatia absoluta. Sentindo um peso mastodôntico sobre mim, sequer consigo me mover diante de tanta opressão. Não sei exatamente lidar com isso; a sensação é tão intensa que me vejo pronto a concordar com Sileno e sua verdade. E às vezes dura alguns meses, apesar de, diante de todo mundo, na maioria das vezes eu parecer estar totalmente normal. Esse algo profundo dilacera meu interior de uma forma que não sei bem explicar; é difícil me conter e não ter a "esperança" de simplesmente desaparecer: ou, dito melhor, jamais ter existido. Esse temperamento melancólico -- meu elo com a bílis negra - me deixa em paz por muitos momentos, mas volta e meia reaparece.
A vantagem desse meu temperamento é que consigo apreciar a forma sublime de bandas como o Explosions in the Sky. Já escrevi sobre eles por aqui, traçando sua genealogia que os coloca na posição de uma banda progressiva num mundo que não tolera virtuosismo, quase como o punk tivesse se tornado um épico.
Meu álbum favorito dos Explosions in the Sky é "The earth is not a cold dead place" (2003). É como se fosse uma sinfonia de guitarras tecida por um indivíduo perdido em alto-mar. A sensação de melancolia é arrasadora e, ao mesmo tempo, sublime. A capacidade de traduzir emoções sem o recurso vocal - em um puro balé de guitarras - é de uma vivacidade abissal. Se me permitem, comento algumas canções:

"First breath after coma" é, como diz o título, a perfeita expressão da tranqüilidade nula do coma, da ausência de qualquer pressão, do vazio expresso por um sutil dedilhado que vai ganhando força aos poucos, com paciência e esmero, traduzindo eficazmente a partir de certo instante a sensação mágica da entrada do luz, do "acordar" para o mundo, com seu som ensurdecedor, sua alteridade traumática, sua plenitude sufocante. Do simples palpitar do coração, entre os aparelhos do hospital, até a avassaladora sensação de estar diante da vida novamente. É como partir de um ponto em que nada há para a explosiva e tumultuada realidade, sair da paz da ausência de vida para o estouro dionisíaco do instante.



"Six days at the bottom of the ocean" é uma longa e doce viagem no mundo da solidão absoluta, na melancolia gélida do alto-mar, da aventura de estar vivendo em meio ao azul da Terra e longe de qualquer resquício do humano. Num ponto longínquo do alto-mar, o observador vislumbra a totalidade como um sereno, impassível e infinito plano frio, sentindo-se como uma pequena partícula que tem apenas pequeninos flashs de esperança, para em seguida o fogo apagar-se diante do vento inclemente que repõe a solidão e a tristeza. Será que é por isso que os anglo-saxônicos chamam triste de "blue"?



E "Memorial"? Não é uma espécie de versão musical da imagem que vislumbra o anjo de Klee que Benjamin descreve nos teses sobre o conceito de história? Não é tão melancólica quanto a catástrofe que se repete constantemente, escrita e suavizada do seu vermelho de sangue em um azul triste e frio, quase tão opaco quanto o cinza? Um memorial que traduz anos e anos de tragédia para, em um só momento, explodir grandiloquente, sinalando algo como uma guerra ou revolução, ou será que é o instante da redenção? Não sei exatamente. Nas suas idas-e-vindas que fecham no mesmo lugar, como o eterno retorno do mesmo, tão espantosas quanto angustiantes são as triturações que por certas vezes as guitarras produzem. O certo é que o pequeno suspiro da violência (divina?) traduz algo dissonante, diferente, dentro da tristeza que corrói o ouvinte. Onde mora o perigo mora também a salvação.




Marcadores: