RADIOHEAD, IN RAINBOWS (2007) (VEREDITO)
Publicado em www.plugitin.com.br.
“In Rainbows” veio rodeado de imensa expectativa até seu lançamento, em 10 de outubro. Não apenas por se tratar do novo álbum do Radiohead — algo que, em si mesmo, já desperta os holofotes — mas pelo fato de banda ter resolvido lançá-lo de forma independente, liberando o download de arquivos mp3 pelo preço que o internauta quisesse pagar.
Independentemente do resultado do álbum, que abordarei logo em seguida, minha pergunta é: por que razão, apesar de estarmos todos contra a indústria musical [creio que a maioria dos leitores desse site baixa mp3, pois a maioria dos álbuns que eu, pelo menos, resenho, são importados e custam uma fortuna] e todo lobby poderosíssimo que alimenta a satanização do download como “pirataria”, tendemos a interpretar a primeira e mais importante reação contra a indústria como algo marqueteiro? Por que a iniciativa do Radiohead é tida como marketing, e não uma ação política direta? Será que o Radiohead não simplesmente AGIU, em vez de ficar cinicamente ao lado do sistema?
Me deixa preocupado quando tudo aquilo que artistas fazem como gestos políticos é interpretado como marketing. É proibido ser engajado? É proibido tentar ajudar às pessoas? Será que Thom Yorke, apesar de indignado com a situação do meio ambiente [como, acreditem, outras pessoas estão], não pode protestar? Deve ele ficar quieto cantando “Creep”, como Noel Gallagher sugeriu? A que ponto de estupidez chegamos, a ponto de o certo se tornar errado e o errado certo? É IMPOSSÍVEL existir uma ação autêntica, tudo é marketing e falsidade?
Mas vamos ao disco, que é o que importa.
“In Rainbows”, no plano geral, é um apanhado da totalidade da obra do Radiohead [mais precisamente: da obra pós-The Bends]. O Radiohead parece ter aberto mão de um conceito integral de álbum, como parecia girar seu eixo desde Ok Computer (1997) — em Kid A (2000) e Amnesiac (2001) temos o inumano, o mundo robótico; Hail to the thief é um disco político (2003) — e criar variações, texturas das suas múltiplas mundanças ao longo da carreira. Está mais ou menos como um “Abbey Road” (1969), variado e múltiplo, para os Beatles.
O disco começa com “15 steps”, um loop sonoro e os beats que animaram The Eraser (2006), trabalho solo de Thom Yorke. Parece “The Clock”, mas dentro de alguns segundos entram guitarra e baixo, e temos uma canção embalada que faz lembrar Amnesiac, pela sua textura e batida. Com um ritmo todo quebrado, lembra também “Idioteque”, do Kid A [que é a “Eletioneering” do Kid A, está mais para Amnesiac, assim como “Eletioneering” está mais para The Bends que Ok Computer]. Os beats, apesar disso, soam perfeitamente assimiláveis, e guitarra e baixo são doces ao longo de todo tema, que termina com gritos de crianças em uníssono.
O disco começa com “15 steps”, um loop sonoro e os beats que animaram The Eraser (2006), trabalho solo de Thom Yorke. Parece “The Clock”, mas dentro de alguns segundos entram guitarra e baixo, e temos uma canção embalada que faz lembrar Amnesiac, pela sua textura e batida. Com um ritmo todo quebrado, lembra também “Idioteque”, do Kid A [que é a “Eletioneering” do Kid A, está mais para Amnesiac, assim como “Eletioneering” está mais para The Bends que Ok Computer]. Os beats, apesar disso, soam perfeitamente assimiláveis, e guitarra e baixo são doces ao longo de todo tema, que termina com gritos de crianças em uníssono.
E então estamos em “Bodysnachers”. Se “15 steps” é leve, “Bodysnachers” começa com um riff stoner rock, bem ao estilo Queens of the Stone Age, e a voz de Yorke entra desordenada, fora do prumo, livre e quase desesperada. O som é rock’n'roll puro, embaladão, mais ainda que “2+2=5″, a canção que deixou as viúvas de The Bends (1995) cheias de lágrimas nos olhos, depois de 03 anos de experimentação eletrônica [entre 2000 e 2003]. É o mais perto de The Bends que o Radiohead quer chegar, depois dos caminhos percorridos. Quase rock de pista. Quantas guitarras no final se cruzam? O finalzinho é pra quem sente saudades dos solos de Johnny Greenwood desde “Just”. Uma fúria só; puta rock lo-fi.
Mas vejam só: de The Bends, pulamos em “Nude” para Kid A. Aqui sim, Kid A. Ambiência estranha, robótica, sinistra, como aquele planeta escuro e gélido que está no encarte do álbum. Suave, doce, lembra um pouco “How to disappear completely”, a melhor música do Radiohead para eles próprios, ou “Motion picture (soundtrack)”, do mesmo álbum. Aquelas climatizações, aquele vocal sereno, mas em tonalidades mais leves que no angustiante Kid A. No final, coros tristes como aqueles presentes no Hail to the Thief vêm acrescentar mais melancolia, mais uma prova do agregado de perspectivas que vai se somando na carreira da banda. Um sintetizador, ao final, nos derruba.
E então entra uma bateriazinha. “Weird fisches/Arpeggi” é, novamente, The Bends no seu início. Guitarras comportadas se cruzam com um baixo discreto, e a voz de Thom entra levemente, suavemente, sem estardalhaço preenchendo os espaços vagos. Aos poucos, camadas e mais camadas começam a ser acrescentadas, começam a aparecer vozes ao fundo e, subitamente, somos interrompidos, como que por aquela barra do nome, justamente quando Yorke repete “Weird fisches”, para entrarmos em uma ambiência de terror, uivos, barulhinhos, algo entre Kid A e Hail to the thief, como em “Where I end and you begins”. A música cresce como uma “There There”.
Depois da velocidade, a calmaria, com um violino que deixa entrar, sutilmente como um elefante, um sintetizador animalesco. A batida é próxima ao trip hop, “All I need” é simplesmente genial. É sofrida, perfeita [you’re all I need/ you’re all I need -… just want to share your life]. Sininhos, ruídos de ruas movimentadas e o caralho estão por baixo dessa batida espetacular, que faz lembrar grandes momentos do Massive Attack e do próprio Radiohead, repleta de pratos ao final em uma explosão catártica que faz Thom Yorke gritar esmagado pelo instrumental.
E agora sim, a calmaria prometida. “Faust arp” é paz serena, é “Fake Plastic Trees”, “High and dry”, só que não com violões britpops baseados em lá, e sim belos violinos perfeitamente encaixados em violões dedilhados e na voz que vai guiando a melodia suave e sem atropelos.
“Reckoner” entra, a seguir, com bateria eletrônica e uma guitarra suave. Parece uma percussão, ritmo frenético. Yorke entra perfeitamente, no seu melhor momento em falsete. No início, lembra Hail to the thief e Com Lag (2004), especialmente as versões remixadas. Mas é bem, muito mais, melódica. A parte vocal e dos intrumentos convencionais é quase pop. É um tema que no início passa meio despercebido, mas aos poucos vai ganhando força a ponto de talvez ser a melhor do álbum. Os corais de “We suck young blood” estão lá, os caras viraram vampiros. Percebam: vampiros, não mais robôs. O Radiohead aqui usa todos os recursos eletrônicos em um arranjo totalmente orgânico, pop, belíssimo, recheado de laptops e violinos — o clássico e o moderno convivendo em perfeita harmonia. Parece que, nesse momento, fica claro que foi preciso primeiro radicalizar para encontrar o ponto de harmonia exata.
“House of Cards” é igualmente bela. A voz de Yorke começa vindo do ALÉM, celestial como seriam vozes de anjos, reverberando com um eco que dá um toque de “dream pop” para a canção. Gemidos meio doentios, “I don’t wanna be your friend, I just wanna be your lover”. Lembra do Ok Computer, um álbum clássico, talvez o único, em que não consta uma só vez a palavra LOVE? É o Radiohead pousando na Terra novamente, realimentado com sua viagem por outros planetas gélidos. Falando em reverberar, a banda abusa do reverb nas guitarras aqui, lembrando até a divindade de alguns sons do Slowdive. Um atmosfera onírica e agradabilíssima. Faz até o ótimo Blonde Redhead soar ingênuo e pobre.
Faixa 9, temos “Jigsaw falling into place”, um rockão novamente, espécie de misto entre The Bends e Hail to the thief. Os vocais vampirescos de HTTT estão lá, mas menos hostis e exóticos, mais acessíveis e permeáveis, dá pra bater o pé e talvez até dançar com essa. As guitarras estão comportadas, levam tranqüilamente a melodia até entrarem sintetizadores discretos ao final. Imagine um The Bends com um banho de Hail to the thief.
Ao final, “Videotape” não é “Motion picture (soundtrack)” nem “The Tourist”. Um piano carregado e angustiante, denso e repetitivo, acompanha a voz de Thom, terminando com loop que abriu o álbum agora o fecha. Uma espécie de canção de ninar claustrofóbica, algo em comum com um Mercury Rev da vida, mas que não consegue não ter a assinatura totalmente pessoal do Radiohead.
“In Rainbows”, embora não inove em um sentido de criar novas sonoridades totalmente diferentes — como Ok Computer ou Kid A — tem um grande poder de síntese, que dá origem a algo novo: um amálgama dos melhores momentos do Radiohead, sonoridades antigas cobertas com novos caminhos descobertos, combinações dos imensos caminhos percorridos durante a carreira da banda. É um disco, embora não conceitual, muito mais focado que Hail to the thief, aderindo a texturas mais suaves. Indica uma banda que sabe que é e faz jus ao título de melhor em atividade. Na penúria da música britânica atual, nos coloca a sonhar.
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Faixa 9, temos “Jigsaw falling into place”, um rockão novamente, espécie de misto entre The Bends e Hail to the thief. Os vocais vampirescos de HTTT estão lá, mas menos hostis e exóticos, mais acessíveis e permeáveis, dá pra bater o pé e talvez até dançar com essa. As guitarras estão comportadas, levam tranqüilamente a melodia até entrarem sintetizadores discretos ao final. Imagine um The Bends com um banho de Hail to the thief.
Ao final, “Videotape” não é “Motion picture (soundtrack)” nem “The Tourist”. Um piano carregado e angustiante, denso e repetitivo, acompanha a voz de Thom, terminando com loop que abriu o álbum agora o fecha. Uma espécie de canção de ninar claustrofóbica, algo em comum com um Mercury Rev da vida, mas que não consegue não ter a assinatura totalmente pessoal do Radiohead.
“In Rainbows”, embora não inove em um sentido de criar novas sonoridades totalmente diferentes — como Ok Computer ou Kid A — tem um grande poder de síntese, que dá origem a algo novo: um amálgama dos melhores momentos do Radiohead, sonoridades antigas cobertas com novos caminhos descobertos, combinações dos imensos caminhos percorridos durante a carreira da banda. É um disco, embora não conceitual, muito mais focado que Hail to the thief, aderindo a texturas mais suaves. Indica uma banda que sabe que é e faz jus ao título de melhor em atividade. Na penúria da música britânica atual, nos coloca a sonhar.
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DURMAM COM OS ANJOS.
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Nota: 10.