Mox in the Sky with Diamonds

terça-feira, setembro 04, 2007

ELES ESTÃO À ESPREITA



As declarações ácidas do Ministro Nelson Jobim, na cerimônia de lançamento do primeiro ato concreto de memória da Ditadura, deram vazão a uma reação do Alto Comando Militar. Os militares reafirmaram que o Exército é ainda "o mesmo de Caxias" e que a interpretação da história depende do ponto de vista.
Ora, que a interpretação da história dependa do ponto de vista é algo que qualquer um não-ingênuo -- que abandonou uma pretensa "objetividade" --, concorda. O próprio selecionar os fatos enquanto "históricos" já não é pura objetividade, mas narração e mito. Mas isso está longe de significar que os fatos não tenham ocorrido [afirmar isso é solipsismo ou esquizofrenia], nem que as interpretações não possam ser colocadas na berlinda para discussão. Ninguém pode ser "relativista" no sentido forte do termo: todo mundo tem um ponto de vista, do qual sai sua fala. É no nível intersubjetivo, dialogal, que vamos confrontar esses pontos de vistas.
É o que se pretende com a recuperação da memória do regime da Ditadura. Confrontar as nossas interpretações -- não a partir do "ponto de vista de lugar nenhum" -- mas nosso, enquanto democratas liberais, em relação aos atos do Exército daquele período. O silêncio sobre os fatos apenas reflete que os milicos se protegem de críticas, porque realmente não têm argumentos bons para sustentar a Ditadura. Vamos debater se estávamos diante de uma "ameaça comunista", se a quebra institucional se justificava, ou se, como vejo, estávamos diante de mais uma tomada de poder de uma elite por meios sangrentos, tendo-se cometido vários crimes contra a humanidade e imperado a burrice militar, da hierarquia e disciplina.
O que me preocupa é a insubordinação dos militares ao poder civil, ainda hoje. Mantendo um incrível poder [dos quais, venho dizendo há tempos, a existência de Brigadas Militares é o maior exemplo], o Exército nega-se a aceitar o regime democrático e o Estado de Direito, questionando todos aqueles que falam o óbvio: estivemos diante de inúmeros crimes durante o regime ditatorial, e dizer isso não é "revanchismo", pois essa é uma nomenclatura de quem MANTÉM a divisão entre "nós" [militares, direita] e "eles" [esquerda, subversivos].
Que o Exército afirme ser o "mesmo de Caxias" é sintoma de que persiste enquanto poder golpista, como foi em toda história da república, desde a nossa falsa proclamação que veio de cima para baixo. É um poder que se vê autônomo e mantém o perigo de um levante com base nos seus próprios [e questionáveis] princípios. Preocupante, porque eles estão aí, ao nosso redor, nos vigiando.
Cuidado, portanto, Ministro Jobim [de quem a postura tucana já começou a render maus frutos: a indicação de Direito para o STF é uma; mas que, como tucano, também se coloca fortemente contra o regime de 64], quando quer colocar o Exército nas ruas. Pode ser o começo de uma história que já conhecemos.