Mox in the Sky with Diamonds

sábado, agosto 11, 2007


The National - sensacional

VELUDO PARA OS OUVIDOS

Não consigo parar de escutar o maravilhoso álbum do The National, "Boxer" (2007). Quando resenhei, há pouco tempo, "Boxer" por aqui sofria apenas o impacto inicial de algumas audições. Ao longo do tempo, ele vem ganhando mais e mais força, tomando-me em um ímpeto viciante de não conseguir parar de escutá-lo. É, provavelmente, o mais delicioso álbum do ano.

A simplicidade de "Boxer" esconde, inicialmente, essa beleza que vai se revelando aos poucos, sutil e eficaz. Aos poucos, as canções crescem na sua melancolia intensa e honestidade. Se poucas audições já são suficientes para apaixonar-se por "Mistaken from strangers", single poderoso, e "Fake Empire", a magnífica abertura, em pouco tempo "Apartment story" e "Racing like a pro" vão tomando a mesma força. E, daí por diante, todas as músicas, cantadas pela voz grave e aveludada de Matt Berninger [barítono] -- transpirando sinceridade -- vão se tornando mais e mais agradáveis. Um álbum típico de uma banda de Nova York: denso, escuro, sombrio. Imagine-se num pequeno boteco escuro, numa madrugada que vai se estendendo, em meio à fumaça de cigarro, alguns drinks e levado por um piano que faz sucederem-se belas canções.

O The National, defitivamente, venceu-me.

THE CORAL

O The Coral é uma das melhores bandas surgidas pós-2000 no Reino Unido. Respirando fora do circuito NME [apesar de, um dia, ter sido aposta do semanário], dos rockzinhos exaustivamente repetitivos [leia-se, The Enemy, The Rakes, The Cribs, etc.] e do revival oitentista [Editors, British Sea Power, The Departure, etc.], a banda lançou dois álbuns absolutamente CERTEIROS: "The Coral" (2002) e "Magic and Medicine" (2003). O primeiro mergulha nem um universo de spaghetti western, psicodelia sessentista e ritmo quebrado, praticamente jazzístico. O segundo traz uma ambiência bucólica, igualmente psicodélico mas um pouco mais contido e com os pés mais próximos do country e do folk. Com um grande apetite por lançamentos, têm ainda mais dois álbuns: Nightfreak and the sons of becker (2004), na realidade um conjunto de b-sides, e The Invisible Invasion (2005). Esses dois últimos são bem menos certeiros que os primeiros, que possuíam altíssima carga artística e inovadora, embora não possam ser considerados fracos.

Poucas ouvidas em "Roots and Echoes" (2007) causaram-me a impressão de que o The Coral tenta retorno ao estilo dos dois primeiros grandes álbuns, incorporando novamente violões e abusando da psicodelia. Muito a meu gosto. Mas demos tempo ao tempo: preciso me familiarizar ainda mais com o disco.

HEGEMONIA E PODER

A Direita não é feita apenas de débeis mentais. Apesar de ter um recheio de idiotas [os militares são, sem dúvida, o paradigma], há também alguns pensadores de respeito que poderiam ser chamados de conservadores.

Um personagem típico é aquele que é, na realidade, um liberal conservador, francamente etnocêntrico e irônico. É o caso do colunista João Pereira Coutinho, português que escreve para a Folha. É um jornalista de refino intelectual e grande apuro de idéias, embora nitidamente conservador.

Recentemente, João Pereira Coutinho escreveu um artigo dizendo: "não conheço homossexuais". Segundo ele, assim como ninguém é etiquetado de "heterossexual", também ninguém pode se cobrir da identidade "homossexual". Segundo ele, tudo isso deveria ser irrelevante para a discussão das questões, como era irrelevante que os imperadores romanos tenham mantido relações homossexuais.

Esse discurso, típico de uma direita mais refinada, não me incomoda tanto quanto a direita tosca. Mas esconde um fato importante: a existência do poder na sociedade. Coutinho não leva a sério pensadores como Foucault e Derrida [contra quem, inclusive, já escreveu]. Ele pensa que todos esses pensadores que vêem relações de poder e hegemonia na sociedade são espécies de proto-marxistas, tendo por marxismo a tendência de ver interesse "burguês" por baixo de tudo.

Como eu já escrevi por aqui, é necessário admitirmos que vivemos a hegemonia do homem, do branco, do heterossexual, do rico, etc. Há hegemonias na sociedade. Um homossexual, por isso, quando se coloca na posição dessa identidade, está se situando como alguém marginal que busca ser reconhecido. O mesmo vale para negros, mulheres, pobres, etc. A estratégia argumentativa da direita é "neutralizar" a discussão, colocando-a quase que em termos jurídicos de igualdade. Como o ideal é que não tivéssemos essa cisão, o marginal vê-se em posição invertida e, com isso, é visto como alguém que pratica uma discriminação invertida [o caso dos negros é o mais comum nessa acusação].

Para que os argumentos -- aparentemente razoáveis -- dessa posição sejam desmascarados é preciso dizer aquilo que eu falei aqui há um tempo, do "pensamento com chão" de Martin Heidegger. É preciso pensar o homossexual "aqui embaixo", não lá no terreno metafísico em que as pessoas são iguais. No nosso mundo, não são. Por isso, não é o mesmo dizer que um branco reivindicando cotas seja o mesmo que um negro. A discussão está longe desse juridicismo enganador.


Trilha sonora do post: The Coral, "Music at night".