Mox in the Sky with Diamonds

quinta-feira, agosto 03, 2006

Dois bons filmes

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Não me lembro de ter chorado muitas vezes em filmes. Em toda minha vida, devo ter chorado duas, três vezes talvez. Mas "Dançando no Escuro", protomusical estrelado por Björk e dirigido pelo fantástico Lars von Trier, me fez derramar lágrimas.
Von Trier é o diretor mais trágico do cinema atual. É um dos poucos que têm coragem de dimensionar uma tragédia, esboçar a dor e, aos poucos, ir afundando-a no espectador, como se fosse um punhal. A decadência da personagem principal, afundada em mal-entendidos e profundamente injustiçada, é nos colocada num fluxo semelhante ao que ele viria a aproveitar posteriormente, com Grace em Dogville: uma deterioração constante e inacreditável, que se nega, todo momento, a ser interrompida. Não há anestésico, suavização, embelezamento: é a crueza do acontecer maligno que, sem hesitação, vai nos perfurando.
Terminei o filme, sinceramente, destruído.
"Dançando no Escuro" ("Dancer in the dark", Dir. Lars Von Trier, França, 2000).

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Todas as boas razões filosóficas e antropológicas estão a favor do relativismo. O reconhecimento da diferença moral, a coerência interna das crenças e a incapacidade de ocuparmos a posição de "olho de Deus" nos indica o caminho do reconhecimento e respeito. Mas, enquanto isso, vítimas agonizam e ignoramos os seus gritos.
"Hotel Ruanda" é uma breve reflexão sobre um genocídio autorizado, uma negativa do Ocidente de intervir diante de uma chacina étnica que fez o extermínio de crianças, mulheres, homens, tudo indiscriminadamente. Facões do ódio, que rasgavam em pedaços as vítimas, esfaceladas diante do silêncio da ONU.
Sou favorável a uma espécie de relativismo moderado, problematizado. Essa questão é que sempre me atordoou, nesses tempos, poderíamos dizer, pós-modernos...: "até onde vai o respeito à diferença de não respeitar a diferença?". Uma reflexão politicamente comprometida não compactua, pelo menos não sem argumentação, com o relativismo de certa antropologia descomprometida com o sofrimento humano.
"Hotel Ruanda" ("Hotel Rwanda", Dir. Terry George, EUA/Itália/África do Sul, 2000).