Por que NÃO o homem médio?
Não se pode negar que os "homens médios", os "normais", são maioria e, de certa forma, carregam o peso da história. Por que então NÃO ao homem médio?
Não seria agradável se nós simplesmente deixássemos de lado nossas angústias existenciais e passassemos a adotar um ritmo de vida baseado em uma rotina incessante, do bom pai de família? E se, por acaso, nos fosse oferecida, com isso, a fórmula da felicidade?
O filme "A Vida em Preto-e-Branco" é um grande exemplo da felicidade do homem médio. É um filme subestimado, pois foi um dos melhores da década passada. Ali, temos uma família perfeita, em completa sintonia na sua vida descolorida. Por que não?
A maioria quer ser normal. Procura, nos outros, um ponto ideal, um projeto fixo, algo que possa perseguir como parâmetro e, finalmente, sentar comodamente sobre a poltrona dos que alcançaram a conforto da "felicidade".
No entanto, uma observação mais detida da humanidade nos leva a caminho totalmente diverso. As pessoas interessantes, aquelas que despertam o interesse alheio, que são ídolos, modelos, jamais procuraram a normalidade. Como o "colorido" do filme -- o risco, o perigo, a dificuldade, o erótico, tudo isso parece delicioso e apreciável. Nossos parentes e amigos totalitários nos impõem um modelo de vida baseado na rotina, no projeto, na felicidade e no conforto. E, no entanto, nunca houve alguém efetivamente interessante que seguisse esse modelo.
Nossa educação, a moral submersa no agrupamento social dominante (prefiro falar isso que "sociedade"), nos OBRIGA, MASSACRA, IMPÕE sermos comuns, medíocres, reproduções do mesmo. Escola, família, carreira. O homem da tradição, família e propriedade. Esses, que ressoam aos montes. Esses, que formam as massas ordinárias. Os moralistas que jogam pedras nos diferentes. Os que julgam sumariamente. Aqueles que mantém as mesmas crenças do passado. Os que falam do "necessário". Que reproduzem e se reproduzem. Um massa, cheia de contradições. Os Zé-Ninguéns de Reich. Prontos para chamar o diferente de problema. Donos da verdade. Cheios de razão. Puros, puritanos, rígidos, disciplinados. O que não bebe, não fuma, não extravaza, não usa drogas, não transa, não aprecia a arte que desconstrói, não gosta da mudança, não aceita o diferente, não quebra regras, não tolera, não goza, não critica, não contesta. Um corpo disciplinado até os ossos. Corpo sufocado pela repressão. Corpo que, recalcado, quer se vingar no Outro.
Esse "normal": o "último homem" de Nietzsche. Aquele que quer sua felicidade num mundo moral, onde todos são felizes. Adormecido na narcose do seu próprio mundo. Quem pode ser mais drogado que o próprio homem médio? Que é essa felicidade senão uma droga?
É necessário não ser normal para perceber o quando é hedionda a normalidade. O quanto rasteira, supérflua, falsa, cínica, hipócrita. É preciso transbordar fronteiras sem medo para perceber a sujeira desse mundo. E, aqui meu último argumento: esse mundo pertence aos "homens médios" (Nietzsche diria, falando da mesma coisa: aos fracos). Portanto, se vivemos imersos na putrefação, isso é produto dessa raça dominante, daqueles que pensar deter a verdade e querem ver excluída toda forma de diferença. Um mundo de repressão, hipocrisia e injustiça.
Meu último argumento contra o homem médio é esse: o mundo.
Libertarismo
Começo a rever algumas coisas, entre elas a subestimação das revoluções do Século XX. As revoluções de 68 - sexual e racial - podem ter uma dimensão muito mais importante que, por exemplo, a Socialista de 1917.
Creio que o grande eixo de uma mudança na nossa forma de pensar passa, necessariamente, por uma nova forma de enxergar o corpo e o erótico, que é o que verdadeiramente rompe com o domínio do homem médio. De todas as coisas humanas, o sexo é aquela que passa mais terrivelmente escondido, recolhido nos cantos da nossa cultura, escondido por um manto de hipocrisia do medíocre que, sem falar nada, admira a bunda feminina, filmada em close, na televisão.
É preciso ser mais explícito quanto a isso. É preciso usar mais o sexo como instância emancipatória desse poder terrível e difuso. Esse poder que é, ao mesmo tempo, Foucault (disciplinar, adestrador), Deleuze (aberto, contínuo) e Baudrillard (hiper-real, simulação). Esse Poder que está no discurso ao nosso lado -- olhe bem para o seu lado daqui a pouco, e verá um homem médio. Logo ali.
Trilha sonora do post: Mercury Rev, "Opus 40".
Não se pode negar que os "homens médios", os "normais", são maioria e, de certa forma, carregam o peso da história. Por que então NÃO ao homem médio?
Não seria agradável se nós simplesmente deixássemos de lado nossas angústias existenciais e passassemos a adotar um ritmo de vida baseado em uma rotina incessante, do bom pai de família? E se, por acaso, nos fosse oferecida, com isso, a fórmula da felicidade?
O filme "A Vida em Preto-e-Branco" é um grande exemplo da felicidade do homem médio. É um filme subestimado, pois foi um dos melhores da década passada. Ali, temos uma família perfeita, em completa sintonia na sua vida descolorida. Por que não?
A maioria quer ser normal. Procura, nos outros, um ponto ideal, um projeto fixo, algo que possa perseguir como parâmetro e, finalmente, sentar comodamente sobre a poltrona dos que alcançaram a conforto da "felicidade".
No entanto, uma observação mais detida da humanidade nos leva a caminho totalmente diverso. As pessoas interessantes, aquelas que despertam o interesse alheio, que são ídolos, modelos, jamais procuraram a normalidade. Como o "colorido" do filme -- o risco, o perigo, a dificuldade, o erótico, tudo isso parece delicioso e apreciável. Nossos parentes e amigos totalitários nos impõem um modelo de vida baseado na rotina, no projeto, na felicidade e no conforto. E, no entanto, nunca houve alguém efetivamente interessante que seguisse esse modelo.
Nossa educação, a moral submersa no agrupamento social dominante (prefiro falar isso que "sociedade"), nos OBRIGA, MASSACRA, IMPÕE sermos comuns, medíocres, reproduções do mesmo. Escola, família, carreira. O homem da tradição, família e propriedade. Esses, que ressoam aos montes. Esses, que formam as massas ordinárias. Os moralistas que jogam pedras nos diferentes. Os que julgam sumariamente. Aqueles que mantém as mesmas crenças do passado. Os que falam do "necessário". Que reproduzem e se reproduzem. Um massa, cheia de contradições. Os Zé-Ninguéns de Reich. Prontos para chamar o diferente de problema. Donos da verdade. Cheios de razão. Puros, puritanos, rígidos, disciplinados. O que não bebe, não fuma, não extravaza, não usa drogas, não transa, não aprecia a arte que desconstrói, não gosta da mudança, não aceita o diferente, não quebra regras, não tolera, não goza, não critica, não contesta. Um corpo disciplinado até os ossos. Corpo sufocado pela repressão. Corpo que, recalcado, quer se vingar no Outro.
Esse "normal": o "último homem" de Nietzsche. Aquele que quer sua felicidade num mundo moral, onde todos são felizes. Adormecido na narcose do seu próprio mundo. Quem pode ser mais drogado que o próprio homem médio? Que é essa felicidade senão uma droga?
É necessário não ser normal para perceber o quando é hedionda a normalidade. O quanto rasteira, supérflua, falsa, cínica, hipócrita. É preciso transbordar fronteiras sem medo para perceber a sujeira desse mundo. E, aqui meu último argumento: esse mundo pertence aos "homens médios" (Nietzsche diria, falando da mesma coisa: aos fracos). Portanto, se vivemos imersos na putrefação, isso é produto dessa raça dominante, daqueles que pensar deter a verdade e querem ver excluída toda forma de diferença. Um mundo de repressão, hipocrisia e injustiça.
Meu último argumento contra o homem médio é esse: o mundo.
Libertarismo
Começo a rever algumas coisas, entre elas a subestimação das revoluções do Século XX. As revoluções de 68 - sexual e racial - podem ter uma dimensão muito mais importante que, por exemplo, a Socialista de 1917.
Creio que o grande eixo de uma mudança na nossa forma de pensar passa, necessariamente, por uma nova forma de enxergar o corpo e o erótico, que é o que verdadeiramente rompe com o domínio do homem médio. De todas as coisas humanas, o sexo é aquela que passa mais terrivelmente escondido, recolhido nos cantos da nossa cultura, escondido por um manto de hipocrisia do medíocre que, sem falar nada, admira a bunda feminina, filmada em close, na televisão.
É preciso ser mais explícito quanto a isso. É preciso usar mais o sexo como instância emancipatória desse poder terrível e difuso. Esse poder que é, ao mesmo tempo, Foucault (disciplinar, adestrador), Deleuze (aberto, contínuo) e Baudrillard (hiper-real, simulação). Esse Poder que está no discurso ao nosso lado -- olhe bem para o seu lado daqui a pouco, e verá um homem médio. Logo ali.
Trilha sonora do post: Mercury Rev, "Opus 40".