Mox in the Sky with Diamonds

terça-feira, dezembro 06, 2005

LOS HERMANOS EM PORTO ALEGRE


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Cabras bons esses (fotinho de celular, tosca)

Ouvir o Los Hermanos ao vivo foi apocalíptico. Se um dia eu duvidei estar diante de uma das melhores bandas do mundo, agora a dúvida se dissipou. "4" ao vivo mostrou ser muito mais do que eu tinha visto. Mais que um disco de grande MPB, o disco na verdade é a fusão perfeita entre MPB e rock, algo que os Hermanos vinham aperfeiçoando há tempos, e agora atingem em ponto máximo. Isso não significa dizer que "4" é superior a "Ventura" ou "Bloco" [na verdade eu me abstenho de escolher o melhor deles], mas que ele é simplesmente o ponto perfeito da fórmula.

Primeiro ponto: Marcelo Camelo é superior a Rodrigo Amarante. Discretamente situado ao lado da bateria enquanto Rodrigo cantava suas ótimas canções, Camelo tem total noção de que, se não é o xodó, certamente dele são as melhores músicas da banda. Pode choramingar que não é isso que a doutrininha indie ensina, mas se tu fosse indie dificilmente perderia tempo lendo esse blog.

Segundo ponto: mas por que então Amarante é o preferido de mais da metade dos fãs? Resposta, só percebida ontem: porque ele nos lembra um cara que marcou nossa adolescência, um compositor ímpar na história do Brasil, um neopunk que se tornou romântico, um carinha que todos nós conhecemos e que se chamava Renato Russo. As músicas de Amarante, densas de romantismo, nostalgia e tristeza pungente, lembram muito o Legião da segunda fase. Essa simpatia é inconsciente. Algo que podes perceber na simplicidade prostrada de "O Vento", em um arranjo que eu diria mediano, mas compensado por uma interpretação fantástica do vocalista, ao seu estilo blasé.

Com Camelo, o furo é ainda mais embaixo. Suas composições parecem uma fusão entre a trinca dos melhores da MPB - Tom Jobim, Caetano Veloso e Chico Buarque - com um tempero roqueiro, conciliando o espírito poético da nossa música tradicional com a eletricidade do rock, em riffs discretos e harmônicos. Uma espécie de fusão de samba triste com Radiohead.

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Riffs. Coisa imperceptível em "4", mas notória ao vivo. Os Hermanos lascam, em uma música que não tinha dado muito atenção, "Pois é", um discreto riff que o Interpol e o Editors, especialmente o último, vêm tentando desde as suas estréias. Aquele clima oitocentista por baixo de uma melodia básica, brasileira, buarqueana. Mas com um ingrediente secreto e discreto presente em vários músicas dos Hermanos: um elemento radioheadiano escondido, subterrâneo, aquela guitarra rasgada que destrói a linearidade da música como se fosse uma britadeira. Duvida? Ouça então "Os Pássaros", "Condicional" e "É de lágrima". A primeira lembra o espaço sônico frio e sombrio de Kid A; as últimas carregam um riff que parece aquele solo de "Just", onde a guitarra entra "furando" a melodia, transformando a música em que um espaço multifacetado de rock puro.

Amarante é o nerd querido dos fãs, um bobão [no bom sentido] neoromântico; Camelo é a segurança do talento, da malandragem genial. Amarante é um roqueiro inspirado; Camelo é um gênio ímpar da música nacional. Essa dupla, que conjuga canções protoexperimentais com melodias semi-pops, tem tudo para explodir os limites das fronteiras nacionais, se o mundo um dia for justo. O Los Hermanos não é mais ouvido e idolatrado no Brasil pela burrice nacional, porque hoje não teríamos mais Chico, Caetano e Renato Russo. Temos o Chorão [o nome diz tudo].

Os Hermanos conservam a estrutura de poesia da MPB, cuja raiz bossanovista está nos versos de Vinícius, nas parcerias de Ipanema, no romantismo do brasileiro malandro, nas belas letras do Chico. Tudo isso, com rock, é o fruto do inesperado. De rock, tivemos as ainda atuais e presentes "Cara Estranho" e "O Vencedor", dois hinos sobre como cantar boas canções com guitarras em português [e nem tocaram a minha preferida - "Os Pássaros"]. Algo que os rivais do mainstream, como o Detonautas ou CPM-22, nunca irão conseguir.

Enfim, uma grande banda. Um híbrido. E viva a mestiçagem.




Trilha sonora do post: Los Hermanos, "Condicional".