Mox in the Sky with Diamonds

domingo, outubro 23, 2005

As pessoas que valem a pena
Já disse que sou, ao mesmo tempo, um libertário e um libertino. De um lado, procuro buscar formas e soluções para problemas como a pobreza, a desigualdade, a miséria. De outro, procuro abdicar de conceitos morais intolerantes, que façam juízos de valor fortes sobre a conduta das pessoas, como se tivéssemos autoridade moral para julgar. Porque, como libertário, vejo a injustiça e não me conformo com ela. Como libertino, vejo a hipocrisia e a intolerância e as repudio. São as duas coisas que, desde a adolescência, sempre me atormentaram. De um lado, o cínico indiferente com a injustiça, egoísta, ganancioso, incapaz de se solidarizar. De outro, o puritano intolerante, pronto pra censurar aquele que viola padrões, pronto pra "apontar o dedo" a quem é diferente dele.

Por isso, na minha cabeça só esses dois tipos de pessoas valem a pena. Aqueles que, como o Tio Sylas, Angelina Jolie, Bono Vox, Mandela ou o "Jardineiro Fiel", vão atrás dos seus ideais, rompem barreiras e lutam diretamente contra a injustiça, e aqueles que, rompendo padrões, reconfiguram nossos limites morais, idéia que pra mim encontra alta ressonância em figuras como James Dean, Chaplin, Liam Gallagher, John Lennon, Oscar Wilde, Soninha, Luana Piovani. Pessoas que vão diretamente contra a injustiça e pessoas que denunciam a hipocrisia, o puritanismo. Em termos pragmáticos: pessoas que lutam contra o sofrimento humano. Sofrimento de quem nasceu desigual e de quem quer ser diferente.

Orgias Romanas - Por que não?
Temos a tendência a pensar a história humana como uma flecha que percorre um caminho até chegar a nós mesmos. Uma tendência, p.ex., amplamente advogada pelo marxismo. A história parece um fluxo "consciente", e não contingente. A nós, pós-modernos ateus, não faz qualquer sentido pensar que existe algo na "história" que aponte para nós. Porque, simplesmente, não existe uma "história" enquanto tal. O que existe é uma sucessão de eventos contingentes, que descrevemos segundo a nossa perspectiva.
A pergunta então veio à tona: por que descrevemos o direito romano, e não as orgias? Sob que ângulo o legado romano está no seu direito, e não nos grandes eventos, em que as mulheres dos senadores eram obrigadas a fazer os súditos felizes, como vimos em Caligula? Apenas queremos descrever dessa forma. Não há nenhuma progressão histórica fora da nossa cabeça moderna, escolhemos direito em vez de orgias porque somos burgueses puritanos, mas nada, nada mesmo, torna o direito romano mais interessante que as orgias. Não mesmo.

Como não vai caber tudo, publicado apenas três das resenhas prometidas. As outras vêm no próximo.


Paul Mccartney - "Chaos and Creation in the Backyard" (2005)

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Paul é um carinha especial na vida de quase todos nós, que gostamos de música. Todos atravessamos fases e, em todas elas, fomos contemplados com alguma canção beatle. É o cara que fez TUDO AQUILO.
Por isso tudo se autoriza ao mestre Paul. Até coisas palhíssimas, sem nexo, como "Certain Softness" (que bosta é essa? bolero?). Paul ficou velho, e algumas músicas parecem escritas para o pessoal que ficou velho junto com ele e, com isso, passou a gostar de músicas sem testículos.
Claramente o cara, hoje, compõe o que quer e para fãs. Entretanto, dá para reconhecer em vários momentos a segurança, sutileza, tranqüilidade com que Paul destila elegância britânica, mostrando-se mestre em melodias, com seus refrões pops e contagiantes. Apenas Paul pode compor uma música com o título "English Tea" e parecer, para nós, a fina nata do rock'n'roll. Meu destaque no disco são "Fine Line", com uma boa melodia pop, e "Jenny Wren", que me lembrou "Blackbird". E, engraçado, a música "Anyway" tem as notas exatamente iguais a "People get ready", parceria Rod Stewart/Jeff Beck. E, na faixa escondida, um bom e inesperado experimentalismo, destoante do conjunto.

Franz Ferdinand, "You could have it so much better... with Franz Ferdinand" (2005).


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Tu pode até achar que os caras são hypados, bichas ou copiões. Mas ninguém pode negar que o Franz faz aquilo que quer BEM: misturas riffs crus com batidas descontínuas e dançantes. O disco é cheio de "Take me outs", oscilações entre levadas roqueiras com robotismo pronto pra pista.
Como disse o Scream&Yell, é o próprio disco da geração "zap". Nenhuma melodia se mantém parada, há uma alternância de ritmos e riffs, em compasso que faz sacolejar. Isso ninguém tira deles. "Do you want to", "The Fallen" e outras já nasceram pra vencer - e vender (o que, convenha-se, não tem nada de errado). As novidades são a balada "Fade Together" e a beatle "Eleonor Put your Boots On" , que ganham certo contorno "cool" com o sotaque scottish que permeia o som das figuras. Recomendo ouvir na noite, pra animar a festa, com um bom Johnny Walker ao lado pra se entorpecer.
O FF foi aprovado no seu segundo trabalho.

Elbow, "Leaders of the Free World" (2005).


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Eu não posso negar que o Elbow é uma banda talentosa. Os caras são os verdadeiros herdeiros do rock progressivo, ou, simplesmente, do rock de talento. Eu já disse - e repito - que, não sei por quê, mas os caras me lembram imensamente o Emerson, Lake & Palmer, talvez até pela voz do cara. Por tudo isso, receberam uma cacetada de boas críticas em seu terceiro disco.
A seu favor, ainda, que definitivamente não se enquadram no "new acoustic", rótulo que nivela bandas boas (Coldplay), médias (Travis, Keane, Thirteen Senses), ruins (Doves, Athlete) e medíocres (Starsailor). Não. Não é isso.
Não dá pra negar que "Leaders of the free world", por exemplo, é uma música excelente. Bem arranjada, compacta, até empolgante. Esse pessoal tem a manha. Já tinham acertado a mão, por exemplo, com "Fallen Angels", no disco anterior.
Entretanto, pra mim o que sobra no Elbow falta, por exemplo, no Libertines, e vice-versa. Enquanto o primeiro tem apuro técnico, arranjos excelentes, criatividade sonora, o segundo tem o calor do rock, o improviso, a contestação. Falta, no Elbow, uma certa "atitude" rock'n'roll, uma idéia contestatória, iconoclasta. Tudo é muito frio, planejado, perfeito demais. Tu poderia dizer que são contraditórios. Não creio. Basta ouvir Pink Floyd ou Radiohead pra te convencer disso.



Trilha sonora do post: The Verve, "Weeping Willow".